O Primeiro-Ministro anunciou o óbvio: Portugal vai empobrecer, de forma relativa, como consequência da crise. O Líder da Oposição decidiu criticar o Primeiro-Ministro.
O Governo apresentou na sua proposta de Orçamento para 2012 um corte volumoso em salários de funcionários públicos e em pensões. O Líder da Oposição, mais uma vez, decidiu criticar os cortes, aproveitando a deixa do Presidente da República, que lhes chamou um «imposto».
Eu gostaria de falar do empobrecimento gerado pelo «imposto», bastante regressivo (leia-se, que afecta com particular gravidade os mais pobres), que o Líder da Oposição defende ser a «solução» da crise: a inflação.
Aumentos da inflação geram diminuição de poder de compra. Penalizam quem trabalha e quem poupa porque desvalorizam o dinheiro que essas pessoas recebem. Em particular, penaliza especialmente os mais pobres que trabalham e que poupam, dado que são estes que têm menos dinheiro logo à partida.
Quem beneficia com a inflação? Quem tem dívidas: porque o valor da sua dívida, mantendo-se nominalmente o mesmo, em termos reais baixou. Particularmente, beneficia da inflação quem deve e não quer verdadeiramente pagar a sua dívida.
Os EUA têm sido mestres nesta política de inflacionar o dólar para pagar a sua dívida e esse tipo de actuação tem sido tolerado porque o dólar é a moeda de reserva mundial por excelência. Mas a China, grande credor dos EUA, já tornou claro que não vê este comportamento com bons olhos, e os níveis de dívida americanos explodiram de tal maneira que os EUA vão mesmo ser forçados a fazer reformas estruturais.
Até nos EUA, portanto, esta «solução» já não funciona muito bem, mas António José Seguro quer importá-la para a área do euro. Isto apesar da dita «solução» não resolver problema estrutural nenhum da economia portuguesa (ou europeia), retirar um incentivo para aumentar o nível produtividade da nossa economia que neste momento existe e que já tem dado frutos e tem subjacente a lógica de Portugal como um país de salários baixos e empresas de baixo valor acrescentado que ainda torna a economia portuguesa pouco competitiva.
Pior ainda é a forma como António José Seguro defende as suas políticas inflacionistas de «imprimir dinheiro»: diz que são «boas para Portugal». Além das políticas não serem «boas para Portugal», o pendor nacionalista deste tipo de argumentação não devia ter lugar no debate sobre uma moeda que não é só portuguesa. Em nada ajuda o euro que líderes políticos andem a tratá-lo como brinquedo no jogo político nacional, tal como em nada ajuda a construção europeia que problemas europeus sejam tratados sob o prisma da competição nacionalista.
Em resumo, António José Seguro propõe que a saída da crise se faça através da perda de poder de compra de quem trabalha e de quem poupa e através de uma medida que iria ter um impacto particularmente negativo junto dos mais pobres que trabalhem e que poupem. Depois vem criticar o Governo por falar abertamente no empobrecimento do país. E apenas pode fazê-lo de forma tão leviana porque o nível de iliteracia económica em Portugal é tal que ninguém o confronta com isto.