quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Hollande, o Lunatico

'I can announce here that above €1 million (per year), the tax rate should be 75 percent, because it's not possible to have that level of income," said Hollande, who added that he did not accept "excessive wealth."'

Leis, Reformas Legislativas e Confusão

Temos muitas leis. Leis que se acumulam e que vão sendo alteradas pouco depois de entrarem em vigor. Leis escritas com sofreguidão mas não necessariamente com grande técnica. Leis que se sucedem no tempo e vão ter de ser aplicadas, uma a uma, por entupidos tribunais.

Em Portugal, parece que pensamos que os problemas se resolvem por decreto. E os decretos-leis também se sucedem, não apenas as leis. E também eles são alterados muito provavelmente poucos anos depois de entrarem em vigor. Se for preciso, são alterados de novo pouco tempo depois. Finalmente, são revogados e substituídos - já aconteceu, até, termos normas revogadas sem nunca verdadeiramente entrarem em vigor - e tudo começa de novo.

A primeira coisa a fazer quando nos encontramos perante um problema não pode ser pensar que o problema se resolve com uma nova lei. É preciso ver até que ponto o problema não será resolúvel de outra forma. E é preciso que mesmo pessoas fora do Estado pensem em tentar resolver problemas que encontrem, organizando-se para esse propósito, em vez de esperarem que o Estado ou outra entidade pública resolva o problema (ou organizarem-se apenas para tentar que o Estado ou uma entidade pública o faça).

No caso de chegarmos à conclusão de que é mesmo preciso uma lei, então devemos ver porque é que a lei actual (caso exista) não está a funcionar. Mas isso implica estudo, implica falar com muita gente e ouvir o que essas pessoas têm a dizer, e esse processo deve ser o mais transparente e sujeito a escrutínio possível. As propostas e os projectos de lei devem então ser debatidos de forma exaustiva e substantiva, de forma a procurar-se um texto legal de qualidade.

Sendo aprovada a nova lei ou o novo decreto-lei, importa, salvo em casos de erros particularmente gravosos, dar tempo ao tempo. Importa deixar o novo diploma respirar, ser usado, e ver como evolui a sua aplicação em casos concretos durante um período de tempo razoável. É preciso dar tempo para que os vários agentes que vão aplicar essa nova lei se habituem à mesma e «aprendam» a utilizá-la. Quanto menos alterações nesse período de tempo, melhor, dado que alterações terão o efeito de alargar o período de tempo de consolidação do diploma e da sua aplicação, causando maior incerteza.

Criar leis onde elas não são necessárias causa um sufoco legislativo. Mudar leis continuamente torna esse sufoco mais penoso. É importante que nós tenhamos as leis necessárias, e não mais, e que essas leis sejam tecnicamente bem feitas e tenham tempo para consolidar a sua aplicação. Caso contrário, as leis, longe assegurarem certeza, vão servir para causar confusão.

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Troika, Gasparês e Populismo Inseguro

Foi há poucos minutos que acabou a conferência de imprensa do Ministro das Finanças a explicar que passámos na terceira avaliação da Troika.
Tudo bem, estamos a cumprir as exigências para como protectorado bem comportado continuarmos a pagar salários. Ainda não se apuraram as causas de como chegámos à bancarrota parcial.
Mas há duas coisas que preocupam em especial:
1.ª Alguém tem uma gramática para emprestar ao Senhor Ministro, é que eu não consigo perceber o que ele diz...
2.ª Como é que o (ir)responsável líder da Oposição faz as declarações que faz, quando o Laboratório de Ideias que criou agora vai apresentar em 2015 ideias para 2024???

Com a devida vénia ao delito de opinião aqui.

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Reforma Agrária por Ministra do CDS?

Surgiram nos últimos dias noticias sobre uma possível redistribuição das terras-sem-dono.
Sendo eu natural de uma zona rural com minifúndio, esta noticia causa-me perplexidade.
A Lei das Sesmarias de El-Rei D. Fernando foi um fracasso há quase 700 anos, como hoje esta o será.
Seria mais interrssante criar canais de distribuição e afrouxar o duopólio na Grande Distribuição em Portugal, do que medidas de engenharia social que mexem, com um dos mais sagrados direitos do Homem, que é a Propriedade.


domingo, 26 de fevereiro de 2012

Narrativas Políticas

Nós gostamos de histórias. Gostamos de narrativas, de perceber o que se passou, o que se passa e o que se passará a seguir como estando linearmente ligados por um fio condutor claro e inteligível. O mundo é assim simplificado e tornado mais facilmente compreensível.

Cada partido tem o seu discurso mediático, e o discurso mediático de cada partido tenta contar uma história. Essa história vai justificar e legitimar as suas propostas, e vai servir para apelar aos votos e à aceitação das ideias que se procuram transmitir.

A construção de uma narrativa mediática, de saber enquadrar aquilo que se diz devidamente, é algo de perfeitamente legítimo. Tentar torná-la atractiva também é expectável quando se tenta vencer um debate. Os problemas começam quando estas narrativas se transformam em algo de simplista, de caricatural ou assentam em descaracterizações da posição contrária.

Também problemático é quando estas narrativas assentam em dados manipulados ou claramente falsos. Quando se refugiam na dificuldade de interpretação de dados complexos para tentar transmitir uma visão claramente distorcida daquilo que se passa. Quando apresentam apenas os dados que interessam à visão que se pretende transmitir, e não aqueles que não interessam.

É um dever ético importante para a participação no debate público em democracia procurar intervir de forma justa nos debates. Ninguém é perfeito, toda a gente comete erros, mas pelo menos tentar - porque, geralmente, quem tenta, vai conseguir fazê-lo a maior parte das vezes.

É um dever importante da comunicação social numa democracia liberal o de escrutinar as narrativas políticas que são apresentadas de forma crítica e isenta, quaisquer que elas sejam. Isso significa uma preparação e um trabalho de pesquisa bastante exaustivos em relação a dados objectivos, bem como um domínio razoável das posições concorrentes nos vários debates políticos.  

Apenas com essa preparação poderão as narrativas mediáticas ser desmontadas e avaliadas criticamente. Da mesma forma que uma boa preparação prévia significa uma maior capacidade de construir uma narrativa de qualidade, que não assenta apenas em estilo, mas também em substância.

Claro que os jogos de política pura e os «casos mediáticos» não vão ser eliminados do dia-à-dia de uma democracia liberal. Mas quanto mais forte seja a preparação dos agentes políticos e da comunicação social, melhor, a meu ver, a qualidade da democracia. Quanto menos vazias forem as narrativas que nos tentam «vender» e quanto mais forte for o escrutínio a que estas se encontram sujeitas, melhor para todos nós.

A vontade do criador

Telmo Correia está contra a adopção por casais homossexuais porque tal iria "contra a vontade do criador". Acho que nem Telmo Correia acredita no que diz.

Telmo Correia, se deseja seriamente seguir na política a vontade do Senhor, recomendamos seriamente que fale com o ministro Paulo Macedo sobre os procedimentos do Serviço Nacional de Saude em relação a certas doenças, que claramente contrariam o Levítico. Por exemplo, gastamos dinheiro dos contribuintes em medicamentos profanos, quando claramente a "vontade do criador" implica que o orçamento reserve verbas a para aves sacrificiais. O problema, que aos olhos de Telmo deverá ser muito grave é o seguinte: se um paciente for a um hospital português padecendo de, para dar o exemplo, lepra, ele será tratado por um médico que aplicará fármacos e outros produtos, claramente muito pouco recomendados pelo nosso amigo lá em cima. Pois a "vontade do criador" é que nestes casos o médico seja substituído por um sacerdote, que tendo imolado uma ave derramando sangue para um vaso com água, afogue outra ave nessa mesma mistura, depois salpicando com o dito liquido sobre o paciente para o purificar, entre outros procedimentos (Lv. 14, 5-7). E assim se salvará o SNS.

Claro que Telmo Correia sabe a "vontade do criador" é um talking point. O problema é que o Senhor quis que Heloísa Apolónia parecesse sensata nesta discussão. Deus move-se deveras por caminhos misteriosos.

sábado, 25 de fevereiro de 2012

A Oposição e as Reformas Estruturais

Infelizmente para o país, o principal partido da Oposição é neste momento liderado por um político que faz política para a televisão e que não vai além de construir uma narrativa que ele pensa lhe garantirá mais votos. Todos os políticos o farão, mas António José Seguro entrega-se a esta tarefa com tal tenacidade que é difícil não chegar à conclusão que ele não vai para além disso: de retórica.

A história que António José Seguro quer contar aos portugueses para que estes lhes dêem votos é simples, como convém:


Este discurso primário, que vai sendo repetido exaustivamente em intervalos regulares (o que substitui uma argumentação minimamente substantiva), ignora por completo um aspecto do Memorando da Troika de que muito se fala e pouco ainda se viu de concreto (embora este ano as coisas possam mudar a este respeito): as reformas estruturais.

O programa da Troika tem a componente de finanças públicas (ou seja, pôr as finanças públicas em ordem) e tem a componente das reformas estruturais. Já tivemos a nova lei das rendas e vamos ter reformas laborais. Vamos ter uma nova lei da concorrência (a proposta já está a ser debatida). Temos um programa de privatizações em curso.

Mas não é nesses temas que se encontra o ênfase do PS. Nesses temas, como no Orçamento, o PS limita-se a esperar pelo Governo e a apresentar propostas de alteração. E isto, tal como era insuficiente em relação ao Orçamento, continua a ser insuficiente agora. E com isto, a narrativa chave do PS limita-se aos dois pontos listados acima, que ainda por cima representam uma simplificação absurda daquilo que tem sido a actuação do Governo até agora (concorde-se ou não se concorde com ela). Além de tratar o crescimento económico como algo que se consegue carregando num botão ou usando uma qualquer varinha mágica.

Mais: a narrativa do PS tem sido meramente acompanhada por umas quantas propostas desconjuntadas sobre os temas em debate que bem demonstram a falta de substância do nosso maior partido da Oposição. Pior ainda, tendem a demonstrar que se mantém precisamente a mesma atitude que nos levou ao descalabro financeiro actual. E que não me têm parecido muito diferentes daquilo que o Governo tem proposto para os mesmos temas.

O resultado é que a pressão para fazer as reformas estruturais bem feitas vem essencialmente de fora e não de dentro. Do BE e do PCP-PEV não se espera que pressionem o Governo para fazer reformas estruturais. Do PS, no entanto, é isso mesmo que se espera. Até porque foi um Governo PS que negociou e assinou o Memorando original, e o cerne das medidas negociadas continua lá.

Infelizmente para o país, António José Seguro está muito preocupado em criar uma narrativa em que ele é o bom da fita e o Governo é o mau da fita, e não em, de facto, participar em debates substantivos relevantes sobre as reformas estruturais que se avizinham e para as quais já existem propostas.

Adopção por casais homossexuais

Não passou o projecto de lei que permitiria a casais homossexuais adoptar. 

Devia ter passado.

Ainda há quem viva num mundo em que a «família tradicional», uma pequena família idealizada, deve ser a única reconhecida como legítima. Que o Estado deve continuar a desconfiar de relações homossexuais no que toca a deixar casais homossexuais criar e educar crianças. Quem pense que a sua noção de família não só é a única legítima, como todas as outras devem ser tratadas com desprezo.

Já temos o casamento entre pessoas do mesmo sexo, devíamos ter também a adopção por pessoas do mesmo sexo. Os casais homossexuais não são, simplesmente por o serem, menos dotados que os casais heterossexuais no que toca à educação de uma criança. E não devem ser afastados de consideração simplesmente por serem homossexuais.

Vivemos numa sociedade plural e é tempo de o Estado deixar de tentar impor as regras morais de alguns sobre a comunidade inteira, sob o manto da moralidade pública e da protecção de crianças. Porque ainda estou para perceber porque é que é tão terrivelmente perigoso deixar uma criança a ser cuidada por dois homens ou duas mulheres que a amem verdadeiramente e que tratem dela com o devido zelo e carinho.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Mais 1150 Burrocratas Álvaro?

Parece que 1000 técnicos do IEFP vão passar a ser designados gestores de carreira. Vide aqui
150 hoje dirigentes, também passarão ao cargo de gestor de carreira. 
Além do simples facto do IEFP, ser uma instituição totalmente desfasada da realidade, do nosso mundo laboral, não seria mais importante, mudar mentalidades e não apenas a semântica?

Pior o objectivo de querer aumentar em 50% as colocações, num contexto económico como o nosso é um objectivo curioso. 

Como sempre, como a mudança da realidade é dificil opta-se pela cosmética. 

Espera mais de um estrangeirado anglo-saxónico Álvaro...




Libertem o Johnny Cash!

Um cheirinho de liberdade,cantado pelo senhor Cash!

 

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Lógica, Razão, Ciência e YouTube

O YouTube tem vídeos de todos os géneros e feitios. Parte desses vídeos incluem vídeos sobre Ciência, Religião, Lógica ou Ciência. E eu encontrei, há em tempos, alguns canais bastante interessantes sobre estes temas.

Decidi partilhar aqui dois (incluindo exemplos de vídeos).

TheraminTrees



QualiaSoup

Diz que é uma espécie de conflito de interesses!

Algo se passa quando sobre o mesmo assunto, no mesmo jornal, sobre a mesma questão se lêem duas noticias completamente diferentes.

Será que o expresso, se enganou, ou o enganaram o expresso aqui?

Estou ansioso pelos próximos capitulos...

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Diz que é uma espécie de Conflito de Interesses!

Não sou jurista, mas há certas coisas que me fazem confusão. 

Isto, é um exemplo. 

Não pondo em questão a idoneidade da pessoa, pergunto se não deveriam existir mais regras, sobre a mobilidade entre o sector público e o sector privado. 

Um magistrado ir trabalhar para um banco privado , por razões económicas assumidas e manter o direito de retorno à sua anterior função causa-me confusão. 
Mas isto sou eu que sou um moço do campo... 

domingo, 19 de fevereiro de 2012

Os puros e a democracia

Há quem se considere mais puro que os outros que o rodeiam. Em política, isto costuma acontecer em relação a ideologias. Há quem se considere mais «puro» ideologicamente que outras pessoas. E essa noção de «pureza» costuma vir acompanhada de uma bela dose de dogmatismo e da noção de que na pureza ideológica que é professada se encontra uma verdade absoluta.

Considero-me liberal democrata e federalista. Considero que as ideias que defendo tenderão a trazer, sendo concretizadas, vários benefícios. Mas não me considero possuidor de uma verdade absoluta, nem considero que as posições políticas que eu tenho são objectivas. Porque não são: são subjectivas, tal como todas as posições ideológicas.

Aliás, essa é uma razão que me leva a defender uma democracia liberal: porque considero que é o sistema mais bem equipado para lidar, de forma pacífica, com a diversidade e pluralidade de opiniões que existem, muitas vezes conflituantes, numa sociedade plural. Isto implica aceitar que nem sempre as minhas ideias serão aquelas a ser operacionalizadas, mas saber que o poderão ser no futuro, dependendo das circunstâncias de cada momento.

Prezo a capacidade de compromisso e o pragmatismo, duas qualidades importantes num sistema democrático, principalmente com um sistema eleitoral proporcional. Essa capacidade de compromisso promove a estabilidade, baseado num debate público constante através do qual se encontram pontes entre posições que poderiam parecer díspares. E serão as políticas resultantes desse debate que serão implementadas.

Claro que esse tipo de políticas nunca vai agradar aos «puros», dado que por definição vão ser políticas de compromisso. E esses puros vão criticá-las violentamente por esse prisma, classificando de traidores quem quer que as aplique, porque as verdades absolutas em que acreditam não são postas em causa por aquilo que vai acontecendo, em tempo real, à sua volta.

As críticas dos «puros» vão testar as ideias de compromisso que vão emergindo. São parte do debate público no qual assenta a democracia. E podem até deitar deitar abaixo essas ideias de compromisso, se ao longo do tempo se tornarem convincentes o suficiente para persuadir o conjunto suficiente de pessoas para que estas políticas possam ser implementadas. Para que o regime se mantenha democrático, no entanto, isso não pode implicar que a possibilidade de implementar políticas diferentes seja pura e simplesmente banida.

Pessoalmente, declarações de maior «pureza» ideológica em nada me impressionam. Se essas pessoas se querem considerar mais «puras» que outras, que se considerem. Não é por isso eu as considero mais convincentes. Nem isso, nem o seu dogmatismo. O facto de eles definirem o seu pensamento como a «verdadeira» encarnação de uma certa ideologia é lá com eles, e a sua enorme preocupação com catalogarem as pessoas com as quais não concordam (e usarem essa catalogação quase como um argumento) também.

A Política em democracia não é feita de verdades absolutas. Sê-lo-á noutros sistemas. Mas não num sistema democrático.

Editado: E já agora, eu não considero os «puros» mais puros que qualquer outra pessoa, e não vejo a suposta «pureza» ideológica como algo que eleve aos píncaros quem quer que seja.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Kitchen Nightmares e Gestão

No programa de televisão Kitchen Nightmares (versão americana; versão britânica), o Chef Gordon Ramsay visita um restaurante em sérias dificuldades financeiras e tem uma semana para o colocar no trilho do sucesso. A versão americana do programa foca-se mais nas questões pessoais e é bem mais sensacionalista que a versão britânica, mas o «modus operandi» de Ramsay é fundamentalmente igual em ambas.

Assim, Gordon Ramsay vai analisar a organização interna do restaurante, o que inclui:
  • analisar a qualidade da comida que é servida (em particular, a relação qualidade-preço), bem como do serviço de mesas que é prestado;
  • analisar as relações pessoais entre os donos, os empregados de mesa, os cozinheiros e toda a gente que trabalhe no restaurante;
  • analisar a estrutura do restaurante em termos de hierarquia de colaboradores;
  • analisar como funciona a cozinha, como funciona o serviço à mesa, e como se coordenam estes dois momentos;
  • analisar as condições sanitárias do restaurante, em particular da cozinha e das câmaras frigoríficas;
  • analisar a decoração do restaurante;
  • analisar como é feita a gestão de inventário do restaurante.
Geralmente, encontra diversas falhas, que vão desde péssimo ambiente de trabalho causado por más relações pessoais e/ou falta de liderança por parte dos donos do restaurante, má gestão da cozinha ou do serviço à mesa, incluindo falta de coordenação entre os dois; má gestão do inventário, decoração antiquada, comida de má qualidade (geralmente, comida congela e aquecida), até a ineficiente gestão de inventário ou um menu demasiado grande para ser cozinhado de forma eficiente, etc. Isto para não falar de cozinhas sujas e de comida a apodrecer nas câmaras frigoríficas.

Gordon Ramsay analisa ainda a situação externa, ou seja, o contexto no qual aquele restaurante se insere. Se estiver perante um restaurante mexicano, vai, por exemplo, ver quantos outros restaurantes mexicanos existem na mesma área geográfica. Depois desta análise, Ramsay vai procurar algo que diferencie aquele restaurante dos outros - p.ex. mesmo havendo muitos restaurantes espanhóis, aquele poderia ser o único num raio geográfico alargado especializado em «tapas».

Ramsay recolhe informação junto da população local e junto do «staff» do restaurante, bem como das suas observações pessoais e de outras pessoas que eventualmente poderá convidar para o ajudar, para perceber quais os problemas que enfrenta o restaurante. Com base nessa informação, introduz alterações, que incluem geralmente mudar a organização interna do restaurante e a sua decoração, e que podem chegar a uma mudança de nome. Vai também publicitar o restaurante com base no factor diferenciador que elegeu como apropriado para atrair clientes.

Em geral, o que Ramsay tenta fazer ver aos donos dos restaurantes em apuros é que têm de ser eficientes: têm de minimizar os custos e maximizar as receitas, apostando num nível elevado de relação qualidade/preço. Também em geral, muitos dos restaurantes acabam por não aguentar, dado que se encontravam já num ponto de não-retorno. Outros melhoram a sua situação, tipicamente aqueles que seguiram os conselhos de Ramsay e apostaram em maximizar a qualidade e minimizar os custos.

Como disse acima, a versão americana do programa é muito mais espalhafatosa que a versão britânica. E acaba por ser esta última a versão mais interessante. Todos os programas seguem o mesmo modelo e ao fim de algum tempo já se sabe o que vai acontecer. No entanto, principalmente quando se assiste à versão britânica, vai-se aprendendo com o programa. Cada episódio é uma aula de gestão, com aplicações que podem ir além da própria gestão de um restaurante.

Acabei por ir paulatinamente vendo penso que quase todos os episódios, americanos ou britânicos, e acabei por aprender com a série, bem sistematizar algumas ideias na minha cabeça sobre estes temas (como se pode ver). Não que eu queira abrir um restaurante. Mas é sempre bom aprender alguma coisa.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

4000 militares

Parece que o Ministro da Defesa anunciou um reforço de 4000 militares. Porque o Governo quer renovar as Forças Armadas enquanto poupa em desperdícios e gorduras, ao mesmo tempo que dota as nossas forças armadas, supostamente, de maior capacidade operacional.

Esta notícia surge no contexto de contestações que associações de militares têm feito ao Ministro e parece-me que esta parece ser uma resposta do Ministro às críticas que lhe estão a ser feitas.

Pessoalmente, a meu ver, as nossas Forças Armadas são um custo com o qual podíamos bem não viver. Penso que devíamos ter Forças Armadas europeias. Com isto, pouparíamos dinheiro e teríamos Forças Armadas que teriam, muito provavelmente, capacidade operacional a sério.

Contratar 4000 militares nestes tempos de corte e de austeridade é, de qualquer forma, um erro, assumindo que o Governo vai mesmo fazer o que a notícia diz. É um erro porque o dinheiro gasto nestas contratações seria mais bem gasto em praticamente quase tudo o que se possa pensar.

E não basta falar de «gorduras e desperdícios». Isso é conversa vazia de conteúdo. Mesmo não se avançando para Forças Armadas federais, e sendo preciso um plano de redução de custos para as Forças Armadas (se existe, desconheço-o, mas duvido que exista), a solução europeia continua em cima da mesa.

O Reino Unido e a França cooperam activamente na área nuclear e com isso poupam imenso dinheiro. Não poderíamos nós cooperar com Espanha ou com outros países com o mesmo desígnio? No quadro da União Europeia, isto não é apenas possível, é também desejável do ponto de vista do estreitamento de relações entre os Estados Membros numa área tradicionalmente vista como um dos epicentros da soberania.

Em vez de anunciar este tipo de medidas naquilo que parece uma resposta a uma carta de uma associação militar (curioso conceito que coloca em causa as hierarquias, mas enfim), acompanhadas de conversas sobre gorduras e desperdícios, o Ministro da Defesa serviria melhor o país se fizesse um plano de contenção de custos a sério para as Forças Armadas. Será isso pedir muito do Ministro?

Esperemos para ver. (Sentados, naturalmente.)

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

O Arménio, a TAP e a Daniela Ruah!


Meus Caros,
não me interressam quantos foram, ou discutir sombras de fotografias, interessa o que Arménio Carlos, disse.
Ou melhor até não interessa.
Porque as pessoas ouvindo o que ele disse, o que insinuou e o que omitiu teriam outra visão das coisas.
Infelizmente estamos na segunda década do século XXI, com uma visão do sindicalismo dos anos 70 do século passado.
Veja-se o que se passou no plenário dos trabalhadores da TAP, há umas semanas, quando um jovem perguntou, para o que é que serviam aos trabalhadores tantos sindicatos que nem se unem entre eles e um "sindicalista" lhe tentou arrancar o microfone, foi vaiado e no final ainda foi tirar de esforço como um burgesso.
Depois isto são mentiras reaccionárias, certo?
Mas o que é verdade é que eu como precário os sindicatos não me querem lá, é só prós efectivos...
Esqueçamos o meu ressabiamento e fiquem com um video da Daniela Ruah, no Late Show da CBS.

Moços da CGTP, se esta rapariga fosse a falar em lugar do Arménio ninguém discutia os 300000...

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Ideologia e Constituição

Uma ideologia é um conjunto de ideias sobre como deve ser organizada uma comunidade. Uma constituição é um conjunto de normas que regula a organização de uma comunidade. Pelo que, a meu ver, uma constituição pressupõe opções ideológicas, dado que, apesar da sua natureza jurídica, tem uma componente política inerente.

A nossa constituição não é excepção. O simples facto de ser uma constituição escrita resulta de uma escolha política. O facto de prever um Estado de Direito, de ser republicana, de ser democrática, tudo isto são escolhas políticas. Como são escolhas políticas, e ideológicas, todos os artigos relativos à organização económica.

Já aqui disse que todos temos ideologia. Reitero essa posição. E acrescento que o corolário é que o facto de incluir um limite ao défice e à dívida na constituição ser uma escolha política e ter subjacente uma componente ideológica não é argumento nem a favor nem contra a inclusão. Porque todas as normas constantes da constituição resultam de escolhas do mesmo género.

Continuo a pensar que o ataque às ideologias é perigoso e que quem se apresenta como neutral num contexto político está pura e simplesmente a esconder, ou não se apercebe, das opções ideológicas por trás daquilo que defende. Um debate esclarecedor sobre os temas não nega as ideologias, antes torna claras quais é que elas são, quais os seus pressupostos, de forma a que esteja tudo em pratos limpos.

Devo confessar também que acho particularmente absurdo que alguma Esquerda use a bandeira da «opção ideológica» para dizer que não se pode pôr um limite de défice e de dívida na constituição. É que não vejo a Esquerda erguer-se e dizer que a promoção de minifúndios é uma opção ideológica que não deve estar na constituição. Imagino porquê.

É preciso que os debates constitucionais em Portugal deixem de apresentar um lado como isento e neutral e o outro como cheio de preconceitos ideológicos. Todos os lados da discussão têm uma ideologia subjacente às suas propostas e isso não tem nada de mal. É parte de viver em democracia ter debates ideológicos. O pensamento único, esse, é para outros tipos de regimes.

domingo, 12 de fevereiro de 2012

Catroga, a Troika e a EDP

Nas minhas andanças blogosférias, encontrei no delito de opinião uma questão sobre Catroga e as suas últimas declarações.
A base é esta noticia do Público.

Comentei e enquanto não aparece, partilho com os meus con-bloggers a minha estupefacção com a falta de bom senso deste senhor.
Quem negociou em nome do PSD o programa de ajustamento com a Troika, depois de aceitar o convite da EDP, fica sem autoridade moral para depois atirar com opiniões sobre a actualidade.

sábado, 11 de fevereiro de 2012

De referência?

Como é que os jornais ou as televisões querem sobreviver enquanto fornecedores de informação se não são de confiança? O maior capital que um meio de comunicação social tem é a confiança que o público deposita nele. Principalmente o seu público alvo.

Quanto mais o público alvo de certo meio de comunicação social tiver a sensação que tem de ver para crer, já que o meio de comunicação social não é de confiança, maiores são os riscos para este. Quer o risco de se descaracterizar, quer o risco de desaparecer.

De se descaracterizar porque poderá começar a procurar outros públicos. De desaparecer porque pode não conseguir fazê-lo ou porque nem sequer poderá ter a hipótese de tentar. Sendo que é mais fácil perder a credibilidade do que ganhá-la.

Os grandes jornais que queiram ser jornais de referência, em particular, deviam considerar estas questões com particular acuidade. Sob pena de, jogando o jogo dos tablóides, deixem de ser de referência. E, com isso, corram o risco de definhar e desaparecer.

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Como nao sao assim tantos

E boa ideia divulgar os que aparecem, ate porque parecem ter qualidade.

"Imigracao e Sinistralidade Laboral", Catarina Reis Oliveira e Claudia Pires, Observatorio da Imigracao, ACIDI

A "crítica" do Portugal em declínio ou a desinformação

Os media têm um papel fundamental na sanidade de uma democracia, como tem o tipo de exigência que as pessoas colocam nos media.

O Luís Teles Morais acabou aqui de falar de como eles prestam frequentemente um serviço péssimo à informação das pessoas. Queria acrescentar outro exemplo.

Quase todos os dias em que abro sites de jornais vejo títulos bombásticos sobre declarações de políticos. Já aprendi a lição em não acreditar nas mensagens – bombásticas mas irreais – que “jornalistas” tencionam passar para chamar a atenção dos leitores. Quando vejo um desses títulos que me intrigam, tento procurar na net o vídeo ou gravação dessa declaração. Em 90% das vezes, ou o tom da declaração é distorcido porque é retirada do contexto, ou o conteúdo do título é simplemente falso.

O exemplo de hoje fez correr “tinta” de jornais online e bloguers, e saliva de comentadores de televisão e rádio. Algumas passagens:

Título do Público: “Líder do Parlamento Europeu junta-se a Merkel nas críticas a Portugal”

Ainda o Público: “O presidente do Parlamento Europeu, o alemão Martin Schulz, criticou o facto de Portugal estar a pedir investimentos angolanos, considerando que, assim, “o futuro de Portugal é o declínio””

Paulo Rangel (deputado europeu do PSD): “Vou fazer um pedido formal de esclarecimento” (citação do Público)

Blog Ladrões de Bicicletas: “No seu entendimento, Portugal (e a Europa) só poderá esperar "o declínio", se não "compreender" que só haverá futuro "no quadro da União Europeia"”

Mira Amaral na TVI24: “O que esse senhor disse é um disparate” (citação de memória) [os outros dois comentadores do programa estão totalmente de acordo. José Miguel Júdice avançava mesmo que o comentário devia estar relacionado com jogos políticos lá na Alemanha]

O líder do Parlamento Europeu Martin Shulz, que se exprimia num debate televisivo, não só NÃO criticou Portugal, nem o facto de Passos Coelho ter ido a Angola pedir investimento em Portugal, como NÃO relacionou o declínio de Portugal como causa desse facto. Vejam o vídeo.

Ele limitou-se a apresentar um exemplo do declínio europeu e de como (segundo ele) a Europa se deve unir. De facto, que melhor exemplo do declínio que o caso de um país que era até há pouco tempo colonizador de um outro país sub-desenvolvido, estar agora a precisar de pedir “ajuda” a esse país outrora colonizado! E que melhor argumento para defender o desenvolvimento do projeto Europeu como resposta a este declínio, tal como fez de seguida Martin Schulz?

Após os falsos ecos das declarações do líder do PE, que incluíram declarações indignadas de deputados portugueses de variados partidos (dos com responsabilidades), teve o gabinete daquele que fazer uma declaração a reafirmar o que ele tinha querido dizer:

“o Presidente Schulz estava apenas a usar o facto de o primeiro-ministro Passos Coelho estar a pedir investimento a um país africano (Angola) como um exemplo de que a Europa irá enfraquecer-se a si própria se não actuarmos em conjunto e mostrarmos solidariedade.”

Esta declaração não impediu que à noite os jornalistas e comentadores de várias televisões se entretessem a comentar (e a indignar-se com) o caso.

E assim se fez a estória do dia, e se aumentaram mais um pouco os ressentimentos do povo para com os alemães, hoje ironicamente com um que até estava a defender solidariedade para connosco...

Previsibilidades

Em Portugal, há coisas muito previsíveis. Ouvem-se declarações e sabe-se com quase absoluta certeza o que vai acontecer a seguir.

Temos eternamente as mesmas discussões nos mesmos planos inclinados. Quanto mais triviais, maior o fervor. Quanto menos triviais, maior a trivialização do assunto no debate público de massas.

Sabemos quais as ideias proscritas. Conseguimos adivinhar as distorções e a forma como certas ideias vão ser apresentadas fora do contexto. Temos a certeza que os comentadores de sempre vão dizer o mesmo de sempre.

No meio de toda esta previsibilidade, os debates fundamentais não existem ou reduzem-se a meios selectos. A política é transformada num folhetim cor de rosa na qual todos os políticos profissionais são bandidos, cujas vítimas são os outros cidadãos.

Entre entrevistas não preparadas a debates igualmente não preparados vamos encontrando pouca gente disposta a discutir ideias e não trocar insultos. Gente disposta a sacrificar a previsibilidade estéril do vazio pela efeverscência vigorosa do choque de ideias.

A previsibilidade ultrapassada do nosso debate público é parte de um ciclo vicioso de estagnação e declínio. Não sendo possível a perfeição, é perfeitamente possível melhorar. E um começo seria que um fortalecimento do jornalismo isento e de qualidade.

É previsível que não aconteça. É até provável. Mas se acontecesse o imprevisto, todos nós só teríamos a ganhar com isso.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

A Super Bowl, a Ford e as Liberdades

Há poucos dias foi a Super Bowl, a final que discute o titulo de Campeão desse desporto que é o futebol americano. Esse râguebi, de tipos acolchoados de espuma e capacete.

Ao intervalo da transmissão televisiva, passam anúncios inovadores que são do melhor do Mundo.

Em período de pré-campanha o anúncio abaixo, da Chrysler, teve interpretações de que estariam a fazer um frete, ao Governo Obama.

Colocam-se algumas questões:

A Liberdade criativa terá estado sujeita à relação entre o Governo e empresa resgatada?

A Ford, que não precisou de ajuda, como a Chrysler e a General Motors, sofreu concorrência desleal, visto que os seus concorrentes americanos deviam ter falido?





Deixo a interpretação ao critério de cada um, mas que 2 minutos de anúncio não são para qualquer empresa isso é indesmentível.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Liberaes Musicaes - Arcade Fire

Arcade Fire Live! Rebellion (lies) on Letterman



A Rebelião de um Liberal, rima com Evolução

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

LIBERAES MUSICAES - MARTA HUGON

Porque a malta aqui do Cousas Liberaes, pode ser muita coisa, na sua heterodoxia Liberal, ortodoxia democrática, europeismo flamejante, xiismo federalista de alguns, e alauitas confederais até, mas de uma coisa não nos podem acusar, que é obviamente fundamentalismo musical.
Usando da Liberdade aqui partilho, a que é para mim a melhor cantora Jazz Portuguesa, Marta Hugon.


segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Desestabilizadores automáticos (II)

Portanto, o inflamado título reduz-se a isto: o cortador de relva “motorista do Relvas” recebe, afinal, “o que equivale a 1300 euros líquidos”. Longe de mim querer defender qualquer espécie de gramado, mas o que é senão de má-fé pespegar um título como aquele à notícia?

Outro mau exemplo é o termo que a imprensa conseguiu fazer com que se banalizasse como a tradução geralmente aceite para junk – “lixo”. O significado que junk assume é normalmente bastante mais próximo da nossa “tralha”, algo que já não serve, sendo utilizado para designar “lixo” mais raramente.

Consultando o dicionário Inglês/Português da Porto Editora observamos que antes de “lixo”, aparecem os termos “1. tralha; 2. Ferro-velho, artigos em segunda mão, velharias de pouco valor”. A entrada remete até para a definição “económica”: “junk bond – obrigação de alto risco”. (Também consta o seguinte: “calão (droga) - cavalo”. Já agora, também não ficava mal nas parangonas «Portugal é o cavalo dos investidores»…)

Dir-me-ão, “bem, mas tralha não é muito melhor do que lixo. E isso não iliba as agências de rating de (inserir teoria, mais ou menos conspirativa, aqui)” Pois não, mas that’s not the point here. Compreendamos que o esquema segundo o qual os famosos “ratings da República” são atribuídos pretende, à partida, permitir a um investidor identificar de forma instantânea o risco associado a uma determinada obrigação (risk-free, o emitente é obrigado a reembolsar o seu portador no seu valor facial na data em que vence) – i.e. por oposição a acção. Daí haver uma gama de notações, abaixo de um certo nível, chamado “especulativo”, que são associadas a obrigações que o ratador considera não ser certo que possam ser reembolsadas totalmente na sua maturidade – e (isto pode ser rebuscado) das quais um investidor que pretenda manter a sua carteira risk-free se deve livrar (lembram-se da definição?).

A verdade é que a opção pelo lixo versus tralha ou eventualmente cavalo não foi arbitrária.
Faz parte das pequenas acções que contribuem, sim, para atear a fogueira da “caça as bruxas”, a das paixões patrioteiras (que contribuem, por sua vez, para um certo esbater do patriotismo, já para não falar do europeísmo). Se é verdade que esta pode ter associada uma “externalidade positiva” como válvula de escape para o stress acumulado, o que, dizem os entendidos, é fundamental neste tipo de momentos históricos “complicados”, constitui aquilo que é essencialmente uma enorme interferência no sinal entre a realidade e o seu entendimento pelas pessoas, o que, suponho, não será grandemente benéfico.

Podemos até presumir que se não fosse essa infeliz decisão, não teríamos tido a oportunidade de ouvir “senadores” tão inteligentes proferir declarações tão idiotas como “Mas quem são esses senhores para dizer que Portugal é um lixo? Lixo são V. Exas.!”.

É certo que como qualquer sector de actividade, também os media arcam com a sua quota-parte de “pontapés” da crise. E não será ninguém senão os da própria classe a ter real legitimidade para pregar sobre ética profissional por parte dos jornalistas na sua actividade, pelo menos em particular. But come on!

Aproveitar o Mercado Único

«Conheça a cidade alemã que quer contratar portugueses.» É este o título de uma notícia a ler do Diário Económico sobre a forma como uma cidade alemã procura tornar-se um local atractivo para onde pessoas qualificadas queiram ir trabalhar. (Até porque poderá haver interesse em ir trabalhar para lá, dada a situação portuguesa!)

Entretanto, Pedro Pita Barros escreve, também no Diário Económico: «(...) As políticas de emprego em Portugal não podem ser apenas pensadas para os desempregados portugueses. É muito mais interessante pensar em que políticas de emprego permitem atrair trabalhadores, empresários e empresas, de toda a União Europeia. E se formos capazes de definir ambientes de trabalho e regras de funcionamento do mercado de trabalho português que sejam apelativas globalmente, então também serão atractivas para os portugueses.»

E com muita razão o escreve. Não pode ser apenas aquela cidade alemã a perceber que se insere num mercado único e a tentar aproveitar as potencialidades do mercado único. Cá em Portugal também o deveremos fazer. Isso passa muito por uma alteração cultural no sentido de arriscar não ser mal visto e em que se retirem barreiras aos empreendedores.

As potencialidades do mercado único estão lá para quem as queira aproveitar. É preciso defendê-las neste contexto de crise, promover o seu fortalecimento (na minha opinião, através de uma verdadeira federação europeia) e aproveitá-las. De forma a que, no futuro, comecemos a ouvir falar de cidades portuguesas a atraírem alemães (ou franceses, ou neerlandeses, ou ingleses, etc.).

domingo, 5 de fevereiro de 2012

IV Seminário de História e Cultura Política: Liberalismo e Antiliberalismo

Divulga-se aqui este seminário dia 13 de Março na FLUL no anfiteatro III. A entrada é livre e quem quiser certificado do seminário paga 5€. As fichas de inscrição estão no Centro de História.


SEMINÁRIOS DO CENTRO DE HISTÓRIA
LIBERALISMO E ANTILIBERALISMO
História e Cultura Política –IV Seminário

14h00 –Sessão de Abertura


1º Painel, moderador: António Ventura(FLUL/CH)

14h15 –Bernardino Machado e o Liberalismo regenerador
Norberto Ferreira da Cunha (U. Minho e M. Bernardino Machado)

14h45 –José Luciano de Castro e o Liberalismo progressista
Manuel Cardoso Leal (FLUL)

15h15 –D. António da Costa e o Liberalismo católico
Ernesto Castro Leal (FLUL/CH)

15h45 –Debate e Pausa


2º Painel, moderador: Ernesto Castro Leal (FLUL/CH)

16h30 –José da Gama e Castro e o Tradicionalismo
José Esteves Pereira (FCSH-UNL/CHC)

17h00 –José Carlos Rates e o Comunismo
António Ventura (FLUL/CH)

17h30 –Francisco Rolão Preto e o Nacional-Sindicalismo
António Costa Pinto (ICS/UL)

18h00 –Debate e Pausa

18h30 –Lançamento do Livro «Monarquia e República»

19h00 –Sessão de Encerramento


A campanha eleitoral permanente

António José Seguro está em campanha eleitoral. Uma campanha eleitoral sem programa, é certo, mas em campanha eleitoral. Diz que se sente preparado para ser Primeiro Ministro em 2015 e vai encontrando grupos entre os quais lhe parece ser mais fácil captar votos, prometendo-lhes rios de mel e grande prosperidade com ele no poder. Complementa esse discurso de promessas fáceis com um discurso pífio de que o Governo tem «paixão pela austeridade» e com descaracterização das políticas apresentadas pelo Governo.

O Governo, por sua vez, diz que daqui a poucos anos teremos não apenas a luz ao fundo do túnel, estaremos já a sair do túnel. Apesar de muito pouco se ter visto ainda em relação a reformas estruturais, principalmente reformas no funcionamento do próprio Estado, vão-nos dizendo que a crise vai durar (curiosamente) até às próximas eleições. Claro que, quando a crise durar para além das eleições, dir-nos-ão que a culpa foi do contexto internacional (e, em parte, terá sido, mas não terá sido o contexto internacional que não terá permitido ao Governo avançar com uma reforma do poder local decente, por exemplo).

No actual estado de coisas, estar em modo de campanha eleitoral permanente, fazendo declarações públicas julgadas pela sua capacidade de garantir votos, é particularmente irresponsável. O debate público saudável é sempre fundamental para o bom funcionamento da democracia, mas numa situação de crise, é particularmente fundamental que não se ande em campanha eleitoral permanente. Infelizmente, no entanto, temos o principal partido da oposição sem programa e temos o Governo a querer que as pessoas pensem que vão ver resultados muito positivos a muito breve trecho.

Claro que, pelo menos, o Governo tem um programa, o que tem como vantagem que se pode discordar ou concordar com as opções que toma e com o enquadramento que faz. O PS, no entanto, não tem programa nenhum. O programa das eleições, que os deputados actuais foram eleitos para defender, foi esquecido no dia em que o PS perdeu as eleições. Pelo que o PS vai ao sabor do vento, mandando o barro à parede a ver se cola nos assuntos que tomem maior projecção mediática numa dada semana.

Já aqui o disse, mas torno a repetir. Não é função da Oposição ir a reboque da agenda mediática ou do Governo, ou da comunicação social, dizendo mal daquilo que o Governo faz. É função da Oposição ter um programa próprio alternativo e tentar implementá-lo, apresentando propostas concretas e coerentes para a resolução dos problemas do país. Isto inclui, por exemplo, apresentar pelo menos as linhas gerais de Orçamentos do Estado alternativos, em vez de propor meia dúzia de alterações ao Orçamento proposto pelo Governo.

Um estado de campanha eleitoral permanente em que o PS não tem programa apenas serve para fomentar os desestabilizadores automáticos de que o Luís aqui falou. O PS poderá, no curto prazo, ganhar fôlego eleitoral (mesmo isso parece ser dúbio, dada que o vazio é de tal forma aparente). Mas, no médio e no longo prazo, nenhum problema é resolvido com retórica. E se o PS alguma vez chegar ao Governo com António José Seguro como Primeiro Ministro, a retórica apenas servirá para os, e por arrasto nos, afundar.

sábado, 4 de fevereiro de 2012

Desestabilizadores automáticos (I)

A noção de estabilizador automático é um conceito do bê-à-bá da macroeconomia. Geralmente emprega-se fazendo referência a uma das funções que um estado desempenha numa economia: quando existe uma tendência de aumento do produto, esse acréscimo é suavizado de forma automática, pela subida dos impostos cobrados que o acompanha, uma vez que a receita fiscal é, simplificando, função do rendimento, do consumo, da produção. Já as transferências sociais (subsídios, pensões, etc.) tendem automaticamente a suavizar-se com esse aumento do rendimento da economia, uma vez que este é acompanhado por uma queda do desemprego, o que em conjunto com outros factores, faz reduzir quantitativamente a necessidade de prestações sociais. O raciocínio simétrico aplica-se em momentos de recessão.

O que isto significa é que a existência destes mecanismos permite que as flutuações económicas sejam mais suaves, não sofrendo variações momentâneas tão acentuadas, e contribuindo assim para a estabilidade da economia, ou seja, e da vida das pessoas em geral.

Permitindo-me voltar a um tema já amplamente debatido pelo João aqui, e rezando para que não perpasse um tom pachequista em demasia… Às vezes, fico com a sensação de que uma parte muito significativa da órbita dos mass media assume precisamente o papel contrário destes estabilizadores automáticos, no plano social. Isto é, uma, se quisermos, tendência depressiva num determinado momento do “espírito geral” de uma sociedade, é exacerbada pelos órgãos de comunicação, e (suponho eu, quando foi a última tendência optimista que vivemos?) vice-versa, constituindo um elemento de reforço e quase incitação.

E digo incitação, no seguinte sentido: nada contra que os camaradas exultem os seus companheiros a insurgirem-se contra, como dizia Henrique Raposo no outro dia, aquelas “figuras sinistras, anafadas, de cartola e fumando charuto” que são os “patrões”, contra “políticos” em geral, assumidos ou não, contra os “neo-liberais”, whatever that is, ou contra quem quiserem, munindo-se de todo o tipo de argumentos e acusações, fundadas ou não – aliás, se os factos forem maus, é torná-los piores - uma vez que o único critério aceitável para a sua validação é que exponham o Mal (maiúsculo, sempre maiúsculo, como “Agressão”, “Patronato”, “Senhores do Dinheiro”, etc.) que neles pulula. Nada contra. É o seu papel, voluntário e convicto. Essa incitação faz parte. Agora, quando este tom aparece em notícias, daquelas supostamente tão simples e neutras que podem aparecer órfãs de autor, ou assinadas com um simples “R.”, é outra loiça incitante.

Ontem, no Expresso online, vinha exactamente isto: em destaque na primeira página, um título sugestivo, “Motorista de Relvas recebe 73 mil euros”. Seguimos o link e descobrimos uma posta de 6 linhas, repescada de um outro periódico seu concorrente, o Correio da Manhã. “O motorista (…) tem um contrato que prevê o pagamento de 73 mil euros num prazo de três anos.”

Feriados, Carnaval e tal

O Governo propõe-se acabar com quatro feriados, dois civis e dois religiosos. Não é matéria que me apaixone. De qualquer forma, sempre me pareceu absurdo que estivéssemos presos à Igreja Católica na decisão que podemos fazer sobre quais os feriados a manter e quais os feriados a eliminar (diga-se que, na minha opinião, quanto mais depressa a República Portuguesa se livrar da Concordata, melhor).

Mais: se o Governo queria eliminar quatro feriados, podia ter facilmente eliminado quatro feriados religiosos. Vivemos num Estado laico e o Estado não tem nada de estar a promover dias santos de uma religião em particular. Quem seja católico e queira festejar feriados religiosos que tire férias nesses dias, como toda a gente com outra religião tem de fazer para os seus dias santos. (Penso ainda, aliás, que o Natal ou a Páscoa deveriam mudar de nome, para deixarem de fazer referência a uma religião em particular, mas não é propriamente algo que considere prioritário.)

Um debate sobre feriados deveria ter sido um debate alargado sobre quais os dias que nós queremos, enquanto comunidade, celebrar, bem como as razões que levam a essa celebração. Não deveria ter sido um debate apenas sobre quantos feriados cortar. Poderia ainda ter sido um debate sobre a razão de ser dos feriados e porque não devemos abolir, pura e simplesmente, os feriados, substituindo-os por dias de férias (ou porque é que isso não pode ser uma opção num contrato de trabalho).

Mas o debate promovido pelo Governo foi limitado a quais os quatro feriados a eliminar e o resultado dependeu daquilo que a Igreja Católica aceitou. Na prática, o debate mais profundo sobre os feriados e o seu significado não teve grande impacto mediático - nem sequer o facto de um Estado laico ser forçado a ir a reboque da Igreja de uma certa religião foi tema de grande análise mediática, pelo menos que eu tenha notado. Podíamos ter aproveitado para ligar este tema com o tema da existência de um casamento católico diferente do casamento religioso não-católico, por exemplo, quando, na minha opinião, a todas as religiões, bem como à ausência de crenças religiosas, deveria ser dado tratamento igual pelo Estado.

De qualquer forma, esta medida de corte de feriados e de eliminação de pontes é apenas mais uma pequena medida num oceano de grandes medidas. Muitas delas foram discutidas em sede de concertação social, na qual o Governo debate com corporações quais as medidas a tomar. Pergunto-me se não seria melhor discuti-las no Parlamento e, pelo menos, alargar o âmbito das entidades da sociedade civil consultadas no âmbito da concertação social. Mas também isto não foi discutido, porque em Portugal não se discutem estas coisas de forma mediática.

Aquilo que se discute, e em grande força, é o facto do Governo não ter dado tolerância de ponto para o Carnaval. Esta decisão teve honras de ser a primeira notícia no espaço noticioso da Antena 1 às 13 horas de hoje. Como sempre, a prioridade é dada a estas coisas. As questões substantivas, essas, são ou tratadas com superficialidade, ou pura e simplesmente esquecidas. Porque o que é absolutamente crítico para o país é que haja tolerância de ponto para funcionários públicos no Carnaval.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

MOTIVAR PARA A LIBERDADE!

Um video que me faz pensar, que não dou o devido valor à liberdade que tenho.


quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Dinamismo

Este artigo de Bruno Faria Lopes é bastante elucidativo relativamente às consequências práticas da célebre «política dos salários baixos»: resulta em emigração. Enquanto cá em Portugal não tivermos uma cultura empresarial dinâmica e apostada em investir na qualificação dos vários colaboradores da empresa, desafiando-os e apostando neles, não vamos a lado nenhum.

É preciso apostar nos colaboradores. É preciso investir nos colaboradores, sem ver a aposta na qualificação como deitar dinheiro fora, mas sim como uma forma de tornar a empresa como um todo mais produtiva e portanto mais capaz de gerar lucros. É preciso não apenas copiar as melhores práticas, mas tentar continuar a melhorá-las, e investir em inovação de forma constante.

É preciso encarar a empresa como uma comunidade em que todos são bem tratados e em que o mérito e o trabalho em equipa são valorizados, e não como algo rigidamente dividido entre «patrões» e «trabalhadores». É preciso encarar a empresa como uma comunidade em que se compreende que todos têm a ganhar se todos os membros dessa comunidade forem devidamente valorizados, remunerados e desafiados.

É preciso uma cultura de risco, em que as pessoas saem da sua zona de conforto e tentam criar novas coisas e, quando falham, tentam de novo até conseguirem. Uma cultura em que ter uma carreira variada não seja visto como algo de negativo à partida. É preciso que o auto-emprego seja uma verdadeira alternativa e que o desemprego seja uma oportunidade de mudar para melhor, e não um drama de difícil resolução.

O mercado do trabalho em Portugal tem de mudar como um todo. Flexibilizar a lei laboral é importante para que as coisas mudem, mas não é tudo. É preciso fomentar esta mudança de mentalidades, e isso apenas se consegue flexibilizando a economia como um todo, não criando entraves excessivos à criação de novas empresas (e portanto à sua entrada no mercado) e também promovendo a existência de concorrência entre as empresas.

Com essa mudança cultural, as pessoas passarão a encontrar em Portugal as oportunidades que hoje encontram no estrangeiro. Passaremos também a ter uma economia mais aberta e mais dinâmica, o que fomenta o desenvolvimento económico. Faltaria então que mudássemos o paradigma actual das grandes obras públicas levadas a cabo com critérios de rentabilidade muito dúbios (e que nos cobriram de dívidas) para um paradigma de manter a dívida pública sob controlo e usar o dinheiro público de forma sensata.

O programa da Troika inclui quer uma componente de finanças públicas como uma componente de reformas estruturais em diversos sectores. São essas reformas estruturais que nos visam devolver o dinamismo económico e o potencial de crescimento que neste momento não temos e que é fundamental levar a cabo para que, no futuro, estejamos a ler artigos em que se explicam os motivos que levam as empresas estrangeiras a investir em Portugal e a imigrantes qualificados quererem vir para Portugal.

O Procurador Público Europeu

Assistir-se-á, nos próximos tempos, a um debate, a nível europeu, que não interessará a muitos (é dúbio que sequer interesse a alguns), mas que poderá desempenhar, num futuro longínquo, um papel interessante na chamada “integração europeia”. O debate é sobre a criação de um Procurador Público Europeu e já decorre desde 1996, quando o então Presidente do Parlamento Europeu, o senhor Klaus Hänsch, lhe dedicou umas linhas. Não tardou até que um grupo de peritos delineasse aquela que é, a meu ver, uma das grandes contribuições académicas para a área do direito criminal europeu: o Corpus Juris. Não se justifica dissertar muito sobre o documento, ainda que o seu interesse seja elevado. Fiquemo-nos pelo básico: trata-se de um conjunto de princípios e regras de direito criminal substantivo e processual com o fito de proteger os interesses financeiros da (então) Comunidade Europeia. É neste documento que se encontra plasmada a primeira referência substancial à figura do Procurador Público Europeu. Depois disso, a Comissão Europeia, com o apoio do Parlamento Europeu, esforçou-se para enfiar isto em Nice. Correu mal: o Conselho não esteve pelos ajustes e não só não analisou a proposta de criação do – chamemos-lhe assim – PPE, como resolveu meter lá um híbrido que dá ainda hoje pelo nome de Eurojust, a agência responsável pela coordenação judicial civil e criminal a nível europeu. E assim se passaram quase 20 anos.

Sucede que o Tratado de Lisboa, a crise financeira e a constante fraude cometida sobre os interesses financeiros da União, deu na discussão sobre a possível implementação do PPE. Não vos maço com os diversos estudos que abordam a questão (também porque me falta francamente a paciência para enumerá-los), mas garanto que ainda são bastantes. E bem maçudos. Ora, qual é o interesse – e, mais importante, a necessidade – de ter um PPE? A resposta depende do nível de eurofilia (ou eurofobia) dos leitores. Dado o falhanço prático do reconhecimento mútuo, impõe-se descobrir o caminho a percorrer no âmbito do direito penal europeu. O desenvolvimento do Eurojust seria uma possibilidade (e a mais realista), mas só o PPE poderia, em teoria, contribuir para uma possível harmonização de certas disposições penais (relacionadas com fraude e laticínios, naturalmente) ao nível dos Estados Membros. Claro que esta harmonização demoraria muitíssimo, sendo questionável que ao PPE fossem atribuídas competências que de algum modo pusessem em causa a soberania dos Estados Membros neste sensível domínio. Daí a dicotomia: se o leitor amar fervorosamente a União, reconhecerá que, de facto, o PPE é o que de melhorzinho poderia surgir no âmbito da integração a nível de direito penal na UE. Porém, se o leitor for um adorador de Nigel Farage, seria dúbio – para não dizer insólito – que aceitasse tal medida. O PPE faz falta? Talvez. Daí o tal debate no futuro próximo. Estai atentos: pode ser que venha a interessar-vos.

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Soberania Orçamental e Antigermanismo

Tem-se feito um grande alarido em torno da proposta alemã de limitar de forma ainda mais alargada a soberania orçamental da Grécia, fazendo-se ecoar, um pouco por todo o lado, gritos que exigem a preservação da autonomia de todos os estados-membros no que diz respeito à condução da sua política económica e fiscal. Ao que parece, a soberania ainda é sinónima de dignidade nacional.

Estes gritos são, contudo, caricatos porque, em primeiro lugar, não acho que reste à Grécia grande autonomia para traçar objectivos e planos já que estes partem, grosso modo, das exigências europeias e do Fundo Monetário Internacional (e dos próprios mercados, é claro!); por último, não me parece correcto que qualquer país integrado numa união económica e monetária possa ter controlo absoluto sobre as suas políticas orçamentais, uma vez que estas influenciam invariavelmente os restantes.

A Grécia, na sua posição de forte vulnerabilidade, tem que considerar que a sua (in)disciplina orçamental influencia toda a Zona Euro (mesmo o núcleo forte – França, Áustria) e pode, irremediavelmente, condenar ao fracasso os esforços de ajustamento financeiro de outros países em dificuldades.

Este último facto é, para mim, suficiente para legitimar a proposta alemã que poderia, aliás, ter partido por iniciativa de qualquer outro membro da Zona Euro. Esta não deveria ter fortalecido o crescente sentimento antigermânico, mas antes ter sido recebida de mente aberta e discutida publicamente (há mesmo quem a rejeite por motivos populistas).

Alimentar sentimentos antigermânicos (que têm sido frequentemente infundados) não beneficia ninguém. Quer se goste, quer não se goste, a Alemanha sempre teve, tem e terá um papel importante na construção do projecto europeu. A Europa não é a Alemanha, mas perde muito sem ela: afinal esta é a maior economia do continente e das que melhor desempenho tem tido ao longo destes já largos anos de crise.

Sou da opinião de que ou a União Europeia aprofunda a integração económica/fiscal/política ou se afunda de vez, perdendo relevo na geopolítica mundial. Este aprofundamento implica que todos, sem excepção, abdiquem de parte da sua ‘soberania’.

A nossa Constituição agrícola

[Nota: Neste artigo não se fala da Política Agrícola Comum, mas posso desde já dizer que a minha opinião sobre a PAC é que devia desaparecer o mais rapidamente possível.]

A Constituição da República Portuguesa contém normas para todos os gostos, incluindo um vasto programa político, que por sua vez inclui normas relativas à política agrícola. Normas bastante concretas. Senão vejamos.

De acordo com a al. h) do art.º 81.º (que lista as treze «Incumbências prioritárias do Estado» no âmbito económico e social), é incumbência prioritária do Estado no âmbito económico e social «eliminar os latifúndios e reorganizar o minifúndio».

Os art.ºs 94.º («Eliminação dos latifúndios») e 95.º («Redimensionamento do minifúndio») densificam a norma em apreço:

«Artigo 94.º
Eliminação dos latifúndios

1. O redimensionamento das unidades de exploração agrícola que tenham dimensão excessiva do ponto de vista dos objectivos da política agrícola será regulado por lei, que deverá prever, em caso de expropriação, o direito do proprietário à correspondente indemnização e à reserva de área suficiente para a viabilidade e a racionalidade da sua própria exploração.
2. As terras expropriadas serão entregues a título de propriedade ou de posse, nos termos da lei, a pequenos agricultores, de preferência integrados em unidades de exploração familiar, a cooperativas de trabalhadores rurais ou de pequenos agricultores ou a outras formas de exploração por trabalhadores, sem prejuízo da estipulação de um período probatório da efectividade e da racionalidade da respectiva exploração antes da outorga da propriedade plena.


Artigo 95.º 
Redimensionamento do minifúndio 

Sem prejuízo do direito de propriedade, o Estado promoverá, nos termos da lei, o redimensionamento das unidades de exploração agrícola com dimensão inferior à adequada do ponto de vista dos objectivos da política agrícola, nomeadamente através de incentivos jurídicos, fiscais e creditícios à sua integração estrutural ou meramente económica, designadamente cooperativa, ou por recurso a medidas de emparcelamento.»

Estes três artigos não esgotam toda a matéria agrícola coberta pela nossa Constituição (ver art.ºs 93.º, 96.º, 97.º e 98.º), mas dão uma boa ideia do que se encontra aqui em causa: o fim das grandes explorações agrícolas e a promoção das pequenas e médias explorações agrícolas. Com base na noção, imagino eu, de que as explorações de grande dimensão eram uma forma de exploração do homem pelo homem e portanto não consentâneas com o novo regime que se queria instituir.

O resultado prático é que temos a Constituição a proibir o aproveitamento das economias de escala por parte de quem queira fazer exploração agrícola em Portugal. Temos ainda uma garantia constitucional de que os pequenos e médios agricultores recebem uma série de apoios estatais. (Tudo isto, claro está, tem de ser conjugado hoje em dia com o Direito da União Europeia.) E, finalmente, para nos livrarmos destas normas, que têm efeitos financeiros e económicos perniciosos, temos de levar a cabo uma revisão constitucional.

E, de facto, temos mesmo de levar a cabo uma revisão constitucional. Porque não é admissível que este tipo de temas estejam sujeitos a uma maioria tão elevada para que a política seja alterada. Porque não é admissível que estejam afastados do debate público pelo simples facto de que são de tal forma densificados na Constituição que os partidos não têm grande hipótese senão apresentar pequenas variações de uma mesma pauta já constitucionalmente prevista.

A nossa Constituição agrícola é um convite à ineficiência. Em nada ajudou a que a agricultura se desenvolvesse por cá. E deve ser alterada - que é como quem diz, deve ser suprimida.