"Deve haver um dia em que a sociedade, como os indivíduos, chegue à maioridade." - Alexandre Herculano
sábado, 16 de julho de 2011
Comunicação Social e Sabedoria Convencional
Uma forma pela qual a informação que se transformará em sabedoria convencional se dissemina é a comunicação social. Certa ideia, já ideia feita para certos opinion makers, é todos os dias apresentada às pessoas como verdadeira. Para a comentar são chamadas pessoas (consideradas «autoridades») que já concordam com essa ideia.
Para analisar a ideia, são também chamadas pessoas que concordem com ela. As perguntas que são feitas a esses «peritos», que por vezes são não são peritos naquilo que estão a falar (o exemplo máximo é o Prof Marcelo Rebelo de Sousa, que quase é apresentado como perito em tudo), são fáceis de responder e raramente põem em causa a ideia que está em análise. Aliás, por vezes até são formas de a reforçar.
A ideia começa então a propagar-se rapidamente. Televisão e jornais dão-lhe eco. A análise é muitas vezes empacotada de forma a ser servida em cinco minutos que nada aprofundam a questão. E a ideia entra no inconsciente colectivo, tornando-se conhecimento convencional, uma ideia feita irrefutável, credenciada pelas «autoridades» chamadas a comentá-la. (Basta ver o que tem acontecido relativamente à Moody's.)
Já aqui falei da importância do debate público em democracia. Esse debate deve ser vivo. Devem confrontar-se os vários pontos de vista. Os argumentos de ambos os lados devem ser analisados e escrutinados. Deve haver mais do que ecos constantes de ideias feitas consideradas impossíveis de refutar, associadas a um culto da autoridade que nada ajuda o debate.
A comunicação social tem impacto fundamental na formação das opiniões das pessoas. Deve funcionar como catalisador de um debate público vigoroso. Não pode servir apenas para criar, e disseminar, sabedoria convencional.
quinta-feira, 3 de março de 2011
Sabedoria convencional
O termo sabedoria convencional (conventional wisdom) foi disseminado no vocabulário americano a partir do ano de 58 pelo eminente economista John Kenneth Galbraith, após a publicação do livro mais vendido de sempre na área da economia, The Affluent Society. A sabedoria convencional corresponde àquelas ideias feitas, presentes no senso comum da generalidade da sociedade, que são tidas como verdades inquestionáveis. Frequentemente penetram o suficiente nas crenças comuns para que quem as tente contestar passe por insano.
Possivelmente o caso maior de sabedoria convencional falsa na história do homem foi a criação do homem por Deus. Nem o primeiro grande defensor da liberdade da era moderna, John Locke, escapava a esta ideia feita nas sua argumentação:
“Além de não poder prejudicar ninguém, cada um é obrigado a conservar a sua vida. Porquê? Porque o homem é a obra de Deus. E a obra deve durar o tempo que o grande obreiro desejar.”
Com o tempo, a persistência dos desafiadores das ideias feitas, e o aumento das capacidades intelectuais dos indivíduos, a sabedoria convencional tenderá a estar menos centrada em verdades falsas. Mas elas continuam entre nós.
Esta semana fui com alguns colegas deste blog assistir ao Prós e Contras da RTP sobre a situação actual dos jovens em Portugal. Algumas das ideias feitas que ainda estão presentes entre nós tornaram-se ali evidentes:
- Dar garantias ao trabalhador garante que não há desemprego, e dá mais segurança à generalidade dos trabalhadores
- O Estado é o principal responsável pelo bom desenvolvimento da economia
- O Estado pode criar empregos
- Ter um curso superior é uma garantia de emprego e de uma vida boa
São crenças ainda bastante próprias da sociedade portuguesa, por comparação a outros países desenvolvidos, e certamente decorrentes do nosso contexto histórico do século XX. No entanto, o simples facto de terem sido temas ali discutidos, e as ideias contestadas por alguns dos oradores, indicia que – apesar do cepticismo manifestado por uma parte da assistência – são ideias feitas em decadência na nossa sociedade do século XXI.