Quando vi o anúncio da Maria do Rosário Mattos & Associados, ri-me. Ri-me por vários motivos. Os principais: achei piada ao anúncio e achei piada ao contraste que o anúncio fazia com a ideia-tipo da advocacia propagada em Portugal. Mas sabia também o que poderia acontecer. Sabia que a Ordem dos Advogados poderia bem receber participações sobre aquele anúncio. E sabia que o único riso que isso justificaria seria o riso nervoso de quem não sabe bem como reagir a uma situação absurda.
Como era expectável, a Ordem abriu um inquérito. Houve gente ofendida com o anúncio que considera que, como ficou ofendida, aquelas advogadas devem ser punidas. Devem ser punidas porque, apesar do anúncio se referir a elas, e apenas a elas, e à sua sociedade de advogados, o anúncio é uma afronta a todos os advogados do país. Porque o anúncio deixa algumas pessoas desconfortáveis. Porque o anúncio não segue o padrão cinzento que algumas pessoas consideram como o único possível para advogados. Porque a corporação se sobrepõe à possibilidade de haver diferenças, e porque o incómodo de alguns se sobrepõe à liberdade de quem quer ser diferente.
Só que o problema aqui não é o anúncio - é uma questão de gosto a apreciação que se faz do anúncio, e quem o vir decidirá livremente se vai ou não contratar a sociedade de advogados tendo em conta aquilo que viu.
Não, o problema aqui não é o anúncio. O problema aqui é a abertura do inquérito e uma eventual punição.
A Maria do Rosário Mattos & Associados deve ter direito a promover-se como quiser, a ter a estratégia comercial que quiser, dentro das regras gerais sobre o tema. Aquele anúncio não coloca em causa a dignidade de qualquer profissão. E o pensamento corporativo que acha que um anúncio de uma sociedade de advogados específica coloca em causa todas as outras sociedades de advogados e, em particular, as advogadas portuguesas, é parte dos nossos problemas. Numa sociedade plural, há que saber conviver com a liberdade de pensamento, de expressão, com o direito à diferença e com o facto de, muitas vezes, termos de ver coisas de que não gostamos e que até consideramos ofensivas. A ideia de que as advogadas em causa devem ser punidas por fazer aquele anúncio é incompatível com a ideia de uma sociedade livre e plural, com o problema acrescido de, enquanto se causa escândalo sobre este não-problema, não se discutem e resolvem verdadeiros problemas relativos à advocacia portuguesa.
Artigo 89.º do Estatuto da Ordem dos Advogados. É por causa disso que foi aberto o inquérito. Não se trata de nenhum escândalo mas a OA não podia ignorar isto. Logo se verá qual o resultado.
ResponderEliminar"Art.º 89.
ResponderEliminarDever geral de urbanidade
No exercício da profissão deve o advogado proceder com urbanidade, nomeadamente para com os outros advogados, magistrados, funcionários das secretarias, peritos, intérpretes, testemunhas e outros intervenientes nos processos. "
Não percebo em que é que o referido video revela falta de urbanidade...
Não acredito que tais comentários acima tenham vindo de mentes treinadas a ter a real dimensão do direito de livre expressão do pensamento, bem como o que seja o significado do termo urbanidade, o qual denota civilidade, cortesia, afabilidade. Com tantos graves problemas em todas as esferas da nossa sociedade, atacar pessoas criativas e inteligentes, é um infeliz retrocesso.
ResponderEliminarLeu bem o EOA?
ResponderEliminarAlém disso, conteúdos persuasivos, de auto-engrandecimento, de comparação, entre outros, devem ser eliminados. Entendeu?
Não sei se a OA emitiu parecer, mas a meu ver, o vídeo é ridículo e colide com o EOA.