Eu não me canso de Portugal, porque sempre que me canso vou embora para outro Portugal.
São dois países aqui no mesmo sítio, com culturas diferentes e arrisco-me até a dizer com línguas diferentes.
O primeiro é feito por pessoas completamente loucas que só falam em montar empresas e negócios, sendo que muitos deles não têm sequer dinheiro para o fazer. Mas têm ideias, uma vontade inabalável e falam imenso sobre a importância do Networking, do Entrepreneurship e outros termos em inglês.
Discutem se o futuro de Portugal passa por um modelo semelhante ao de Sillicon Valley ou ao de Londres. Querem conhecer o Mundo para trazer ideias e levar a nossa cultura aos 5 continentes.
Eu falo com estes loucos e dizem-me que em Portugal não há crise, mas sim um conjunto de oportunidades e vão lá fora dizer que Portugal é fantástico e atraem e criam em Portugal acontecimentos espetaculares com o melhor que há no mundo.
Estas pessoas reúnem-se em eventos para construir sonhos megalómanos e colocar o país no lugar que lhe é devido: no centro do Mundo. Olhe-se para o mapa-mundo e veja-se.
Este nível de inovação, insanidade e entusiasmo a roçar o infantil só tem uma explicação. Estes portugueses descendem directamente dos navegadores de outros tempos.
E quando eu me farto deste espírito positivo, de acreditar que podemos fazer algo de extra-ordinário viro-me para o outro Portugal.
Neste outro Portugal só há desgraça. Quando um português vai trabalhar para o estrangeiro é uma catástrofe. Quando um estrangeiro vem trabalhar para Portugal, é uma invasão. E quando levantamos à janela uma bandeira nacional estamos a ser fascistas.
Os grandes problemas são o apoio que uma empresa dá na reabilitação de uma estação e do nome em inglês que lá é colocado. O divertimento é enviar lixo pelo correio a uma empresa que disse mal de nós.
Jamais chamaria a estas pessoas de Velhos do Restelo, porque na sua maioria são jovens, que eu vejo nesta atitude que apenas seria considerada aceitável a alguém abatido pela idade.
Mas por vezes sabe bem, lamentarmo-nos da vida, culpar os políticos dos nossos problemas e ir para o rossio fazer terapia de grupo e achincalhar aqueles que trabalham em duras condições para nos proteger.
E neste segundo Portugal, fala-se e critica-se muito o provincialismo nacional, a nossa mesquinhez e inferioridade. Percebo que o façam pois vejo muito disso quando estou nesta realidade.
É por isso que gosto de passar mais tempo na outra cultura portuguesa.
Sem comentários:
Enviar um comentário