A estrutura complexa e confusa da União Europeia é frequentemente objecto de críticas. É considerada pouco transparente, pouco intuitiva e muito afastada dos cidadãos. Finalmente, a UE é sistematicamente acusada de ter um défice de legitimidade democrática.
Todos estes problemas estão interligados e, a meu ver, têm uma causa comum: a soberania nacional. A estrutura é complexa, confusa, pouco intuitiva e pouco transparente porque no seu ADN permanece uma preocupação com a defesa da soberania nacional dos Estados Membros.
É a soberania nacional que justifica regras de maioria qualificada bizantinas. É a soberania nacional que justifica a existência do Conselho Europeu. É a soberania nacional que justifica a existência de um mecanismo de controlo da aplicação do princípio da subsidiariedade que envolve os parlamentos nacionais.
A constante preocupação em salvaguardar a posição dos Estados Membros enquanto tal na estrutura da União Europeia torna-a, portanto, mais complexa. Torna também mais difícil tomar decisões enquanto União Europeia em questões fundamentais, como seja a resolução da crise das dívidas soberanas.
A União Europeia continuar a ser pensada como um conjunto de Estados, remetendo a cidadania europeia para segundo plano, dificulta a emergência de verdadeiros debates públicos a nível europeu, envolvendo directamente os cidadãos, enquanto cidadãos europeus, e a sociedade civil europeia em geral.
Os problemas europeus são sistematicamente caracterizados como competições entre os diversos Estados-Membros e as negociações como braços de ferro. O nacionalismo é louvado e promovido: os «outros» são diferentes de nós, querem fazer-nos mal, querem dominar-nos e nós não podemos deixar.
No debate político, as pessoas são enjauladas em «nações», corporizadas num «Estado-Nação», e perdem a sua identidade individual. O conceito de «Estado-Nação», assente numa «soberania nacional», que existe para defender um «interesse nacional», tornou-se tão enraizado que é difícil fazer-lhe frente.
Neste momento de crise, a União Europeia está a ser posta à prova, incluindo a sua estrutura institucional. Os soberanistas defendem que o problema é integração a mais e não têm tido resposta suficiente de federalistas que digam, preto no branco, que não. Que o problema é integração a menos.
A falta de integração política leva a que seja mais difícil tomar decisões porque o sistema encoraja a cooperação, mas não o suficiente. Problemas europeus são «nacionalizados» e tratados como se fossem problemas de cada Estado Membro, quando na realidade o que se passa num Estado-Membro afecta todos os outros.
A falta de integração política leva à existência de uma estrutura complexa que, se para algumas áreas já consegue dar resposta, para áreas fundamentais ainda não o consegue fazer. Simplificar o sistema torná-lo-ia mais capaz de lidar com problemas complexos e delicados e também mais compreensível para os cidadãos.
Tornando o sistema mais compreensível, seria mais fácil aos cidadãos exercer o seu direito de escrutínio. Da mesma forma que financiar a UE primordialmente através de impostos europeus tornaria mais fácil aos cidadãos aperceberem-se quer do custo da UE, e pedir contas, quer do facto de estarem a contribuir directamente para o funcionamento da mesma com o seu dinheiro.
Um sistema federal deveria assentar primordialmente, na minha opinião, nos cidadãos europeus e nos seus representantes do Parlamento Europeu, bem como na sociedade civil europeia. A União Europeia não estaria assente numa «nação» mas sim em «cidadãos», cada qual com as suas preferências e ideias.
O «Estado-Nação», mito com raízes oitocentistas que ainda hoje nos persegue, tem de ser posto em causa. Os ideais proteccionistas e nacionalistas que lhe estão assentes servem para fomentar conflitos, não para os resolver. Servem também para categorizar indivíduos e reduzi-los a meras manifestações de um certo colectivo.
A União Europeia deve servir para ultrapassar este modelo de organização social. Bem sei que existe o risco de emergir um nacionalismo europeu para substituir os nacionalismos dos Estados Membros, provavelmente caracterizado por um anti-americanismo primário. É preciso, também, resistir a que isso aconteça.
A evolução da União Europeia para uma federação que garantisse liberdade de circulação de pessoas, bens, capital, serviços e tecnologia, que respeitasse o princípio da subsidiariedade e assente num corpo de cidadãos encarados enquanto tal, seria uma solução estrutural para os problemas que nos assolam. Cada passo nesse sentido é importante. Combater o nacionalismo típico das crises, por sua vez, é urgente.
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