domingo, 11 de setembro de 2011

A (falta de) alternativa de António José Seguro

António José Seguro vive num mundo em que não existe o programa da Troika, num mundo em que Portugal não está a passar por um período de implementação de um programa de desalavancagem da sua economia, num mundo em que não houve anos e anos de atrasos nas reformas estruturais. Pelo menos, é isso que retiro desta sua intervenção.

António José Seguro exige uma estratégia pública para o crescimento económico, e aponta o caminho: linhas de crédito comercial e seguros de crédito, QREN, exportações e AICEP (de onde o PS foi buscar Basílio Horta para as suas bancadas parlamentares). Critica ainda o Governo pelo seu ênfase na austeridade, dizendo que o ênfase deve estar, isso sim, no crescimento económico (leia-se, crescimento do PIB, imagino eu).

Este género de retórica demonstra que o actual Secretário Geral do PS ou não percebeu o que se passa em Portugal, ou então finge muito bem. Portugal passa neste momento por um processo de reestruturação da sua economia e do seu Estado para evitar a insolvência. Adiámos até não poder mais as reformas estruturais que agora temos de fazer, e das quais António José Seguro não tem falado, mas agora não dá para adiar mais.

De facto, teria sido razoável fazer as reformas estruturais em período de crescimento económico. Mas em período de crescimento económico, ninguém sente a necessidade de se mexer. Há recursos para distribuir por várias empresas privadas de construção civil, entre outras, e também para distribuir por um sector público cada vez maior, pelo que ninguém liga à necessidade de resolver problemas estruturais.

Claro que, com isso, o crescimento potencial português se foi tornando cada vez mais miserável, tal como o crescimento efectivo. Mas como havia crédito barato, ninguém ligou nenhuma. O que interessava era encorajar as pessoas a endividarem-se, o que interessa era o Estado acumular défices e dívida pública, o que interessava era gastar recursos que não se tinha. Amanhã, um amanhã que nunca viria, pensar-se-ia nas consequências.

As consequências foram as conhecidas. O Estado português foi resgatado pela UE e pelo FMI, e adoptou um programa de reformas estruturais cujo objectivo é aumentar o potencial de crescimento da economia portuguesa, tornando-a mais flexível e eficiente. Em vez de acumularmos dívida ao estrangeiro, queremos agora atrair investimento directo estrangeiro, por exemplo. Queremos aumentar a competitividade da economia portuguesa expondo as empresas aqui instaladas a mais concorrência, também.

Para atingirmos estes objectivos, e outros, temos de fazer reformas estruturais, e essas reformas incluem acabar com o fomento do endividamento insustentável característico do anterior modelo de desenvolvimento da economia portuguesa. Este ajustamento para uma economia menos endividada não é compatível com as propostas de António José Seguro, que passam, essencialmente, por incentivar o endividamento, e por tornar o Estado português garante de uma quantidade razoável de dívida privada.

As reformas incluem também acabar com a política de défices sucessivos e da acumulação insustentável de dívida pública. O Estado português ter as contas públicas em ordem é, também, importante para o crescimento económico. O custo de oportunidade do desperdício a que têm sido votados os recursos públicos tem sido imenso. É fundamental canalizar esses recursos para actividades bem mais produtivas que sucessivas gerações de rotundas, de auto-estradas desnecessárias, de serviços públicos desnecessários. Para que isso aconteça, os recursos têm de ser libertados pelo Estado.

Em vez de andar a falar de linhas de crédito, António José Seguro devia estar a apresentar as propostas do PS para a reestruturação do Estado, o que incluiria propostas para cada uma das áreas em que o Estado se encontra neste momento presente. Devia ainda apresentar um documento de estratégia orçamental alternativo. E devia também ler o programa de Governo, para fazer críticas mais concretas e mais interessantes.

Há muito a dizer sobre o programa do Governo. Mas a conversa da «austeridade a mais» não significa nada. E se o PS quer ser uma Oposição a sério, tem de ir bem mais além do que propor o modelo de desenvolvimento cavaquista-guterrista-socrático que agora se encontra em colapso. É que esse já foi tentado, e nós sabemos o que acontece no fim.

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