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quarta-feira, 8 de maio de 2013

O Futuro está a Oriente!

Com a devida vénia ao Instituto Diplomático, onde li, que na Sociedade Histórica da Independência de Portugal, haveria uma Conferência sobre as Relações Luso-Chineses, pelo Professor da Universidade de Stanford, Ming K. Chan (que não conhecia).
Aprendi algumas coisas novas, mas do que gostei mais, foi da visão refrescante da passagem dos Portugueses e a nossa relação quincentenária com a China.

PS: A Paixão com que o  Professor Chan falou do nosso vinho verde foi um saudável tónico.

sexta-feira, 15 de junho de 2012

Ideologia, Legitimidade e o Regime


Uma das questões que mais se ouve aquando de qualquer discussão sobre a China contemporânea é a da natureza do regime. Será comunismo ou capitalismo, capitalismo de estado, socialismo, socialismo com características chinesas e por aí fora. Os rótulos são incontáveis e provavelmente irrelevantes. A questão essencial a meu ver está ligada aos mecanismos de sustentação e reforço da legitimidade do regime.
Segundo os ditames do Marxismo-Leninismo, a prática Marxista na Rússia às mãos de Lenine e uma das bases ideológicas do Partido Comunista Chinês (PCC), a revolução é liderada por um partido de vanguarda num regime de ditadura do proletariado. O estado recorre a instrumentos como a abolição da propriedade privada dos meios de produção e uma economia planificada. Estes elementos estão ainda, de uma forma ou de outra, presentes no ordenamento político chinês. O partido de vanguarda é o PCC, cuja legitimidade na liderança da revolução ainda em curso não está sujeita a qualquer espécie de escrutínio. A abolição da propriedade privada dos meios de produção, não sendo total, expressa-se nos vários conglomerados nas mãos do estado, especialmente em sectores considerados estratégicos. As julgar pelos valores nesta peça, as dez maiores empresas chinesas em termos de receita são todas estatais ou estão sob controlo maioritário estatal e as 20 maiores empresas estatais corresponderão a cerca de 50% do PIB chinês. Por último, os planos quinquenais são a principal expressão da economia planificada, que apesar de não estar sujeita a uma microgestão soviética, mantém um fio condutor, como as já mencionadas empresas estatais e por exemplo os enormes programas de obras públicas e o estabelecimento de estalões tecnológicos para a computação ou telecomunicações.
Para além desta apreciação superficial convém analisar também qual a moldura ideológica a que o partido recorre para justificar a sua acção. Aqui teremos de distinguir entre dois tipo de ideologia, a prática e a fundamental, essencialmente os meios e os fins. Um dos desafios aos quais os estados do antigo bloco de leste não conseguiram responder foi o da modernização, com todos os seus efeitos secundários indesejados. Isto porque aqueles regimes foram incapazes de compatibilizar os seus objectivos finais, a utopia comunista, com a realidade concreta da modernização. Pelo contrário, a elite Chinesa, sem nunca abdicar do seu objectivo final, estabeleceu a modernização e o seu corolário, o desenvolvimento económico, como apenas um passo no caminho para o comunismo. Assim, aquilo que ditou pelo menos em parte o fim do comunismo no leste europeu, tornou-se agora um enorme reforço da aceitação por parte da população chinesa da permanência no poder por parte do PCC. Só o partido pode liderar este processo de modernização e desenvolvimento que a manter-se aos ritmos actuais manterá os líderes chineses firmemente no poder. Trata-se contudo de uma espada de dois gumes, pois no dia em que a economia crescer menos e não forem criadas as dezenas de milhões de postos de trabalho anuais necessários para absorver uma enorme população rural em migração para os centros urbanos, a posição do partido tornar-se-à extremamente precária. De facto a economia chinesa nos últimos anos não tem crescido a ritmos tão altos (mas ainda fantásticos para os nossos miseráveis padrões) e é possível que a estratégia de simples acumulação de capital já não esteja a funcionar, mas isso é uma história para outra altura.

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Uma História Partilhada

(Parte 1 de 4 de um artigo que introduz alguns pontos importantes sobre a relação entre a China e o Japão.)

A civilização chinesa desenvolveu-se na planície do norte da China ao longo do Rio Amarelo e no séc. XVI a.C. encontramos já um modo de vida introspectivo e confiante que se expandiu lentamente pelas regiões e reinos circundantes. A perspectiva chinesa coloca-se no centro do mundo e mantém uma noção de superioridade relativamente aos povos vizinhos. Foi nesta sociedade agrária que nasceu o confucionismo, uma filosofia que estabelecia uma estrutura hierárquica rígida sem possibilidades de mobilidade social ao mesmo tempo que legitimava e reforçava as dinastias reinantes tanto na China como nos domínios do leste asiático onde esta tinha influência.

Foi durante o domínio dos Han que se consolidaram as principais características das relações da China com os seus vizinhos. O imperador chinês, o filho dos céus, era assim não só o governante dos chineses, mas de toda a humanidade. A sua capital representava o centro da civilização sendo que quanto maior a distância deste centro maior a barbárie. Foram estas noções que dominaram a visão chinesa do mundo até ao fim do reinado da Dinastia Qing no princípio do séc. XX.

O golpe de estado dos Taika no ano 645 da nossa era é geralmente visto como o inicio de uma adopção consciente dos valores, sistemas e tecnologias chinesas por parte dos japoneses, coincidindo com a centralização do poder no estado de Yamato e a emergência de uma nobreza que se entrincheirava nos círculos de poder. Simultaneamente, o Budismo ganhava cada vez mais adeptos no arquipélago depois das suas variantes chinesas terem sido importadas por via da península coreana.

Esta fé com origem no subcontinente indiano havia sido introduzida à China por volta do séc. III a.C, tendo sofrido varias transformações durante este processo de assimilação e adoptando assim características e práticas chinesas. Chegado o séc. VI, o Budismo estava já profundamente enraizado tanto no reino do meio como na Coreia, tendo-se tornado num poderoso instrumento político nas mãos da dinastia T'ang.

A sua assimilação por parte dos habitantes das ilhas que hoje constituem o Japão moderno não decorreu de forma inteiramente pacífica já que os clãs que dominavam a região derivavam a sua legitimidade das seitas animistas locais sendo que esta nova e subversiva religião tinha o potencial para minar a sua base de poder ao substituir-se ao animismo no panorama religioso local. O assunto ficou contudo mais ou menos resolvido quando o clã Soga, budista, derrotou o seu principal adversário, os Mononobe.

A partir do séc. IX os japoneses deram inicio a um processo de distanciamento da China ao concentrarem-se nas suas próprias divisões internas. A duas tentativas, sem sucesso, de invasão por parte da dinastia mongol que conquistara a China, os Yuan, contribuiu ainda mais para o reforço da convicção japonesa de que o seu isolamento perante o exterior era o melhor caminho a seguir. Mais tarde, um édito dos Ming a proibir todo o comércio directo entre a China e o Japão destruiu todo o contacto oficial entre as duas civilizações. Durante quatrocentos anos estes dois povos passariam a lidar um com o outro exclusivamente por meio de intermediários como os Portugueses, os Espanhóis e sobretudo os Holandeses.


sexta-feira, 15 de julho de 2011

Os mercados não acalmam (V)

A Moody's colocou os EUA sob «vigilância negativa». A Standard & Poor's também o fez. (Ver, por exemplo, aqui e aqui.) E não o fizeram por a Moody's ter recebido lixo nos seus escritórios em Paris ou por «hackers» terem deitado abaixo o «site» da Moody's. Fizeram-no por causa das lutas no Congresso americano relativamente ao «debt ceiling». O «tecto de dívida» é a quantidade máxima que o Governo americano pode pedir emprestada, definida por lei). Há um risco de que não se passe uma nova lei a tempo, e isso aumenta o risco de incumprimento.

Continuarão, claro, as acusações de tratamento favorável aos EUA, apesar destes avisos da Moody's e da Standard & Poor's. E a colocação dos EUA sob «vigilância negativa» por parte de duas agências de «rating», por sinal americanas, será menosprezada por aqueles que insistam em visões anti-americanistas da crise das dívidas soberanas. Decerto encontrarão racionalizações para incluir mais este «facto» na sua narrativa de «guerra económica» entre os EUA e a Europa e na qual a China, ao que parece, é uma aliada europeia.

Afinal, a agência de «rating» chinesa Dagong Global Credit Ratings Co. cortou recentemente o «rating» da dívida dos EUA. Ora, a China investiu fortemente em dívida dos EUA, estando agora, naturalmente, preocupada em ter retorno do seu investimento. Vê com grande apreensão as lutas no Congresso relativamente ao «debt ceiling», e também não deve gostar particularmente da ideia de lhe pagarem com dinheiro inflacionado.

Nada de mais natural até aqui. E quem quiser contratar a agência de «rating» chinesa, pode certamente fazê-lo. Mas tudo o que se passa aqui é que os investidores que mais investiram em dívida americana são também aqueles que se encontram mais expostos a qualquer problema com o retorno dessa dívida. Não significa que a China tenha passado a ser uma «aliada» da Europa numa «guerra económica» com os EUA que, verdadeiramente, não existe.

O que existe é uma crise de dívida soberana que tem repercussões na Europa, nos EUA, e na própria China. Isto porque o sistema financeiro é global, e há uma interligação entre todos estes países. O que significa que é no interesse de todos eles manter o sistema financeiro estável. E isto implica que é no interesse de todos que não haja colapsos na Europa, nos EUA e na própria China. Porque esses colapsos teriam repercussões extremamente negativas a nível global, levando a consequências sociais explosivas.

Espicaçar sentimentos anti-americanos, anti-europeus ou anti-chineses de forma massiva, espevitando sentimentos de medo, não ajuda em nada a resolver a crise das dívidas soberanas. Procurar bodes expiatórios para erros internos não nos ajuda a resolver esses erros. Tentar continuar a viver uma ilusão de riqueza não torna essa riqueza real, não nos põe de novo a crescer, e não nos livra do peso terrível da dívida em excesso que se foi acumulando.

Longe de qualquer sentimento de regozijo, preocupa-me bastante que o Congresso americano não se entenda quanto à passagem do «debt ceiling». Da mesma forma que me preocupa que na Europa não nos consigamos unir e responder de forma clara e concertada ao problema. Ou que já haja preocupações relativamente à dívida pública chinesa.

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Agências de Rating (III) - Moody's is moody - Parte 2

Há duas questões de conflitos de interesses particularmente relevantes no que toca às agências de «rating»:
  • Os detentores do capital da agência de «rating» serem, eles próprios, investidores interessados nas avaliações que a agência faz;
  • As agências de «rating» serem pagas pelas empresas que avaliam, e não pelos potenciais investidores (que não detenham capital da agência de «rating»).
Claro que, em geral, um investidor é livre de seguir, ou não, os critérios de avaliação de risco de crédito das agências de «rating». O que pode ajudar o mercado a lidar com estes conflitos de interesses, porque se uma agência de «rating» tiver uma reputação de ser tendenciosa, e de ter uma metodologia de avaliação pouco fidedigna, os investidores terão menos interesse em seguir os pareceres que esta emita.

A questão é que há investidores institucionais que usam, por questões estatutárias, e mesmo legais, os «ratings» de certas agências, não tendo critérios próprios de avaliação de risco de crédito. Isto significa que esses investidores institucionais, bastante importantes, por sinal, têm assim menos liberdade de escolha no que toca a como reagir aos «ratings» das agências de «rating» a que se encontram vinculados: têm de os seguir e acabou-se. 

É isto que confere um efeito sistémico relevante aos «ratings» que são emitidos, o facto de haver investidores institucionais, incluindo investidores públicos, que são forçados a seguir os «ratings». Caso estes investidores não tivessem este género de limitações, o impacto sistémico das avaliações seria menor. Mas seria importante que elas fossem substituídas, caso o sejam, por critérios técnicos válidos, e não critérios puramente políticos. Porque ignorar risco de crédito por questões políticas é um jogo muito perigoso.

O BCE vai dispensar as opiniões das agências de «rating» sobre a dívida portuguesa. A questão aqui está em saber porque é que o fez. Pessoalmente, acho que o BCE pode perfeitamente ter critérios próprios para avaliar a dívida. Mas esses critérios devem ser critérios técnicos de qualidade. O BCE não pode ignorar risco de crédito por questões políticas, dado que isso põe em causa o próprio BCE e, portanto, o próprio euro.

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Há que abordar a questão do oligopólio de agências de «rating» que existe. Seria importante que fosse quebrado, e que existisse mais concorrência no sector. Para que isto aconteça, devem diminuir as barreiras de entrada ao mercado que simplesmente protegem as agências de «rating» actuais.

Isto assunto está impreterivelmente ligado com a regulação das agências de «rating» e, especificamente, sobre o tipo de regulação pública que deve incidir sobre essas agências. Seria possível criar regras de conduta segundo as quais as agências deveriam tornar claras as metodologias que utilizam para aferir o risco de crédito, da mesma forma que, por exemplo, alguém que faz uma sondagem ou um estudo científico deve tornar clara a metodologia que utilizou.

Seria também possível criar regras relativas a conflitos de interesses, embora me pareça que havendo mais agências no mercado, os investidores teriam capacidade para ter em conta o potencial conflito de interesses ao decidirem se seguem, ou não, a avaliação de certa agência. Mas podia-se acabar, de forma mais alargada, com consequências legais automáticas de certa tomada de posição por parte de um agência de «rating» para certos investidores institucionais. Deve haver livre apreciação por parte dos investidores das avaliações a que têm acesso.

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Não penso que uma agência de «rating» 'europeia' seja solução para o que quer que seja. O que nós precisamos não é de uma agência que seja tendenciosa a favor da Europa. Os «ratings» dessa agência seriam para ignorar, precisamente porque ela não avaliaria «rating» de um ponto de vista técnico relevante, tendo uma preocupação política proteccionista por trás das suas avaliações.

O que nós precisamos é de um mercado de «rating» a funcionar devidamente. Um mercado com variedade de escolha, e em que os investidores possam escolher se usam, ou não, os «ratings» das agências quando fazem os seus investimentos.

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O João Cardiga diz, a dada altura, num texto aqui neste blogue, que Portugal só precisaria de uma segunda tranche de ajuda internacional se não cumprisse o acordo com a Troika. Mas isso não é necessariamente assim. Há o risco de, mesmo cumprindo o Acordo, Portugal necessitar de ajuda, e esse risco não pode ser ignorado simplesmente por se considerar que é mais provável o cumprimento do Acordo levar a que o risco de ser necessária uma segunda tranche diminua.

Em segundo lugar, refere que as condições institucionais formais em Portugal melhoraram, algo que a própria Moody's refere no relatório. O problema é que, como eu já referi noutros textos, as condições formais valem muito pouco sem acções concretas. E relativamente a acções concretas, tivemos muito poucas. Isto deve ser conjugado quer com o baixíssimo nível de credibilidade que Portugal tem neste momento e, infelizmente, com um nível menor de credibilidade da própria UE e do FMI por causa quer do que tem acontecido na Grécia, quer pela forma como as decisões têm sido tomadas em geral.

Entretanto, enquanto nós temos muito poucas medidas estruturais tomadas, e a nossa credibilidade e da UE/FMI está em baixa, o nosso nível de dívida pública permanece extremamente elevado (acima de 90% do PIB), e o tempo passa. O tempo passa e aproxima-se o tempo de pagar a dívida. E para pagar a dívida temos de tomar medidas concretas, porque só assim teremos condições para pagar a dívida. Só que essas medidas concretas são extremamente complicadas de tomar, tanto que não as conseguimos tomar, apesar de sucessivas promessas, desde há dez anos (para já não falar de antes disso).

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Os Estados Unidos, apesar das guerras políticas actuais sobre o «debt ceiling», não só continuam a ter o dólar, e este continua a ser a moeda de reserva por excelência a nível global, como também têm um «track record» nos últimos cem anos completamente diferente do «track record» europeu. E mesmo assim, os próprios EUA já tiveram avisos por parte, por exemplo, da Standard & Poor's em relação ao seu «rating».

Claro que eu sei que prever o futuro com base no passado é um problema, mas as reputações criam-se com base em acção passada. São difíceis de criar, mas basta um erro para as arrasar. Os Estados Unidos posicionam-se neste momento, com as suas guerras sobre o «debt ceiling», para cometer esse erro, mas muita gente o considera improvável. Se o cometerem, no entanto, vamos ter uma crise bastante profunda. E a reputação dos EUA, e o seu «rating», vão, usando um eufemismo, sofrer com isso.

Entretanto, a China tem grande interesse em que os EUA não entrem em «default», dados os seus avultados investimentos em dívida americana. Não é por acaso que há uns anos falou de transformar os «special drawing rights» do FMI numa moeda de reserva global. E não me parece por acaso que agora a agência de «rating» chinesa ande a pressionar os EUA para que haja entendimento no Congresso sobre o «debt ceiling».

Esperemos que essa pressão seja bem sucedida a breve trecho, e que o problema com o «debt ceiling» nos EUA seja resolvido.

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Miguel Duarte, no Speaker's Corner, dá a sua opinião sobre a seguinte pergunta: «Merecem as obrigações da dívida portuguesa um Ba2?»