Uma das
questões que mais se ouve aquando de qualquer discussão sobre a
China contemporânea é a da natureza do regime. Será comunismo ou
capitalismo, capitalismo de estado, socialismo, socialismo com
características chinesas e por aí fora. Os rótulos são
incontáveis e provavelmente irrelevantes. A questão essencial a meu
ver está ligada aos mecanismos de sustentação e reforço da
legitimidade do regime.
Segundo os
ditames do Marxismo-Leninismo, a prática Marxista na Rússia às
mãos de Lenine e uma das bases ideológicas do Partido Comunista
Chinês (PCC), a revolução é liderada por um partido de vanguarda
num regime de ditadura do proletariado. O estado recorre a
instrumentos como a abolição da propriedade privada dos meios de
produção e uma economia planificada. Estes elementos estão ainda,
de uma forma ou de outra, presentes no ordenamento político chinês.
O partido de vanguarda é o PCC, cuja legitimidade na liderança da
revolução ainda em curso não está sujeita a qualquer espécie de
escrutínio. A abolição da propriedade privada dos meios de
produção, não sendo total, expressa-se nos vários conglomerados
nas mãos do estado, especialmente em sectores considerados
estratégicos. As julgar pelos valores nesta peça, as dez maiores
empresas chinesas em termos de receita são todas estatais ou estão sob
controlo maioritário estatal e as 20 maiores empresas estatais
corresponderão a cerca de 50% do PIB chinês. Por último, os planos
quinquenais são a principal expressão da economia planificada, que
apesar de não estar sujeita a uma microgestão soviética, mantém
um fio condutor, como as já mencionadas empresas estatais e por
exemplo os enormes programas de obras públicas e o estabelecimento
de estalões tecnológicos para a computação ou telecomunicações.
Para além
desta apreciação superficial convém analisar também qual a
moldura ideológica a que o partido recorre para justificar a sua
acção. Aqui teremos de distinguir entre dois tipo de ideologia, a
prática e a fundamental, essencialmente os meios e os fins. Um dos
desafios aos quais os estados do antigo bloco de leste não
conseguiram responder foi o da modernização, com todos os seus
efeitos secundários indesejados. Isto porque aqueles regimes foram
incapazes de compatibilizar os seus objectivos finais, a utopia
comunista, com a realidade concreta da modernização. Pelo
contrário, a elite Chinesa, sem nunca abdicar do seu objectivo
final, estabeleceu a modernização e o seu corolário, o
desenvolvimento económico, como apenas um passo no caminho para o
comunismo. Assim, aquilo que ditou pelo menos em parte o fim do
comunismo no leste europeu, tornou-se agora um enorme reforço da
aceitação por parte da população chinesa da permanência no poder
por parte do PCC. Só o partido pode liderar este processo de
modernização e desenvolvimento que a manter-se aos ritmos actuais
manterá os líderes chineses firmemente no poder. Trata-se contudo
de uma espada de dois gumes, pois no dia em que a economia crescer
menos e não forem criadas as dezenas de milhões de postos de
trabalho anuais necessários para absorver uma enorme população
rural em migração para os centros urbanos, a posição do partido
tornar-se-à extremamente precária. De facto a economia chinesa nos
últimos anos não tem crescido a ritmos tão altos (mas ainda
fantásticos para os nossos miseráveis padrões) e é possível que
a estratégia de simples acumulação de capital já não esteja a
funcionar, mas isso é uma história para outra altura.
O Professor Heitor Romana do ISCSP, tem uma tese sobre a sede do poder na China muito interessante.
ResponderEliminarO Leninismo Empresarial arrisco a dizer que é praticado de forma informal noutras partes do Mundo, mas apenas com a parte má. Os sauditas por exemplo com muito dinheiro também não têm nem de perto nem de longe o mesmo impacto e resultados.
Abraço