Todos temos ideias sobre como a comunidade se deve organizar politicamente, sobre como deve ser distribuída a riqueza, sobre o que é a justiça. Todos temos preferências sobre estes temas que influenciam as nossas escolhas e que são a tradução de diferentes formas de avaliar a realidade que nos rodeia.
Há uma mediação entre o «ser» e o «deve ser». Essa intermediação vem da nossa avaliação e interpretação da realidade. Em suma, das nossas opiniões. E as opiniões são, por natureza, subjectivas, mesmo que fundamentadas com dados empíricos. As diferenças de opinião resultam em debates que têm por pano de fundo tentar convencer os outros de que a nossa avaliação da realidade e sobre o «dever ser» é melhor.
Desconfie de quem lhe disser que não tem ideologia, de quem lhe disser que tem opiniões «objectivas» e «factuais». No limite, opiniões «correctas». Estas não existem, muito menos em política. Podemos discutir quais os resultados das políticas do Governo, mas atacá-las por serem «ideológicas» é um ataque trivial. É que as alternativas às políticas do Governo têm também subjacente uma ideologia.
Os ataques à «ideologia» têm como resultado que os actores políticos vão ser incentivados a tentar obscurecer as suas opções ideológicas. As opções políticas vão ser apresentadas, por todos os lados, não como a melhor alternativa, mas como a única alternativa. E essa apresentação tenderá a ser feita, ainda por cima, no formato de «slogans» triviais sem qualquer substância.
Em vez de se aceitar o pluralismo ideológico e promover o diálogo entre diferentes concepções do mundo, acaba a promover-se, na melhor das hipóteses, gritarias entre actores políticos que arrogam para si a Verdade e a objectividade, obscurecendo as opções ideológicas subjacentes às suas escolhas. Na pior das hipóteses, a negação de validade a opções ideológicas contrárias tem tendência para resvalar para regimes de pensamento único.
Numa sociedade livre, aberta e plural, é importante aceitar que todos temos ideologia, e que essas ideologias influenciam e condicionam as nossas opções políticas, quer exerçamos cargos públicos quer apenas escolhamos exercer, ou não, o nosso direito de voto. Essa aceitação é fundamental para que haja um defesa clara da liberdade de expressão e de opinião, sendo ainda muito importante para promover a emergência de acordos políticos.
É urgente que combater o apelo populista do discurso que se diz «a-ideológico». É urgente preservar o pluralismo e a liberdade de pensamento, e promover o debate político substantivo.
Concordo, no entanto acontece que existem os governos (felizmente ou infelizmente) não tomam apenas decisões políticas, muitas vezes tratam-se de questões técnicas. A grande questão aqui é, qual a fronteira entre a componente técnica e a politica?
ResponderEliminarPor um exemplo, um aspecto relacionado com a avaliação de desempenho de funcionários públicos é claramente uma questão técnica da área da gestão de recursos humanos e comportamento organizacional, porque é que a decisão é politica? Outro exemplo é o plano curricular ou o modelo(s) educativo a adoptar nas escolas públicas, porque é que uma decisão politica quando se trata de uma matéria técnica?
Julgo que este tema é muito mais complexo do que possa parecer, sendo que as partes (tecnocratas vs defensores da decisão politica) simplificam um tema extremamente complexo.
Um abraço,
André.