O Governo não tem um programa de reforma do Estado. Tem havido debates sobre o tema, organizado à última hora e em cima do joelho, mas, além de se saber que o Governo quer cortar mais quatro mil milhões de euros, não se sabe o que pretende fazer. O PS, por sua vez, faz bandeira de não querer cortar os tais quatro milhões de euros, mas, não tendo posto de parte debater a reforma do Estado, também o PS não tem um programa coerente e completo sobre esse tema.
Em 2013, continuamos a debater a reforma do Estado no plano da teoria. O Governo, desde que iniciou funções, tem levado a cabo algumas fusões e extinções, mas principalmente focadas em cargos dirigentes. O primeiro Governo de José Sócrates lançou uma reforma do Estado, mas que ficou longe de ser concluída (apesar das melhorias em termos de informatização dos serviços do Estado). No fundo, fala-se sobre o tema, diz-se que é necessária essa reforma, mas no fim não se é consequente.
Este Governo, em particular, tem de facto feito cortes na despesa, mas devia ter imediatamente, ao ter chegado ao poder, lançado as bases para a reforma do Estado estar já a ser implementada na prática. O PS, em vez de se ter escondido do debate, devia ter participado activamente, fazendo valer os seus pontos de vista, desde o primeiro momento. Do PCP-PEV e do BE é esperado que fiquem no seu canto a lançar insultos e acusações, mas do PS não. Do PS espera-se que apresente propostas.
Somos muito pouco exigentes com as nossas Oposições cá em Portugal. Do Governo espera-se que resolva todos os problemas em cinco minutos, de preferência até ontem, conseguindo tudo e o seu contrário. Da Oposição não se exige nada. Não se exigiu nada ao PSD de Passos Coelho enquanto Oposição ao Governo de José Sócrates e não se está a exigir nada ao PS de António José Seguro enquanto Oposição ao Governo de Passos Coelho. O resultado foi que o PSD de Passos Coelho não se preparou para chegar ao Governo e que o PS de Seguro está no mesmo caminho.
O Governo e o PS não têm programa de reforma do Estado, mas «slogans» têm. Também têm tácticas políticas. Também têm comentadores na televisão. Têm muita conversa, muito paleio, muita discussão sobre a política enquanto jogo e brincadeira, mas sobre a reforma do Estado, não há um programa coerente, integrado e completo, quer do Governo, quer do PS. Já há tempo que esse programa devia existir. Já há tempo que esse programa devia estar a ser implementado. Mas em vez disso, está a ser debatido, e de forma razoavelmente teórica.
É incrível como os meses passam e esta situação continua na mesma. Sucedem-se os escândalos e as histerias mediáticas em torno das coisas mais espantosas, mas onde está a pressão sobre os partidos para serem claros nas propostas que fazem, para garantirem que essas propostas estão custeadas, para explicarem de que forma é que essas propostas seriam exequíveis? Em lado nenhum. E isto aplica-se a Governo e à Oposição. O «debate» fica sempre pela rama. Discutem-se pessoas e rumores. Confundem-se temas complexos e mesmo temas simples - como quando se «confunde» o TGV com uma linha de mercadorias. Apela-se a supostas autoridades para dar opiniões sobre temas, por vezes sem esses temas terem sequer sido estudados previamente.
Não é por acaso que o Governo e o PS não têm um programa de reforma do Estado. Ninguém parece querer saber se têm ou deixam de ter. Ninguém parece querer saber exactamente que propostas são feitas e o que as fundamenta. O interesse está em brincar à política, com debates públicos ao nível do pior que se vê na blogosfera ou em fóruns na Internet, sem qualquer exigência de mais. A teoria do coitadinho e as vitimizações abundam. As posições prévias não são assumidas, são apenas subentendidas ou até passadas como não existindo. Há quem faça gala de não ter ideologia e de não ser político e depois da «transparência» - quando a transparência exigiria precisamente que se assumisse aquilo que se pensa, qual o ponto de partida para aquilo que se diz e qual a razão para esse ponto de partida.
O Governo e o PS não têm um programa de reforma do Estado num momento em que esse é um tema fundamental na resolução dos nossos problemas. É absurdo. Mas a verdade é que não são penalizados por isso. São penalizados por apresentarem ideias concretas. É que essas ideias concretas pressupõem escolhas, exigem que se tome partido, que se explique o que se vai fazer, e tudo isso vai afectar gente que se vai queixar. E nesse momento, o enfoque vai ser nas queixas, quaisquer que sejam os fundamentos, mais ou menos válidos. É bem mais fácil, portanto, manter ambiguidades - principalmente enquanto se está na Oposição, porque da Oposição não se exige nada. Do Governo, entretanto, tudo se exige, e o Governo, qualquer Governo, vai resvalando, há medida que é forçado a tomar decisões.
No fim do ciclo, principalmente em momento de crise, o Governo cai e a Oposição chega ao poder. Nenhum tem, o teve, programa de reforma do Estado. Os problemas continuam. O ciclo repete-se. E ninguém exige mais.
Sem comentários:
Enviar um comentário