Lembro-me que na minha primeira participação aqui no Cousas Liberaes preconizava o ano de 2011 como um ano de mudanças, desejadas e indesejadas. Entre as primeiras destacam-se obviamente as revoluções da chamada Primavera Árabe (que se prolongou pelas restantes estações) e, quanto às do segundo grupo, é inevitável não se pensar na Europa - que ou opta (e bem) por uma integração económica e política mais profunda ou se desagrega (a escolha do verbo não foi propositada).
Depois dos últimos acontecimentos na Rússia, questionamo-nos se poderemos também incluir uma eventual mudança no rumo político deste país no actual lote das mudanças desejadas.
Apesar de o capitalismo na Rússia estar mais do que enraizado e a população viver razoavelmente melhor do que há vinte anos atrás, a verdade é que não podemos adjectivar o maior país do mundo de democrático. Os actos de contestação nas grandes cidades de Moscovo e São Petersburgo, denunciando múltiplas ilegalidades no último acto eleitoral, não nos chamam à atenção por denunciarem alguma irregularidade escandalosa até então desconhecida, mas porque são a prova de que o povo russo quer mudar.
Os jovens russos de hoje pouco ou nada se lembram dos tempos de Gorbatchev ou Yeltsin e têm como termo de comparação não a história, mas o espaço. A penetração e massificação da internet na Rússia, assim como o crescimento das universidades permitiram a criação de uma geração jovem mais educada, crítica e de espírito livre que certamente sonha com modelos de democracia mais próximos do ideal europeu e/ou norte-americano.
A concretização desta possível Primavera Russa está agora muito dependente do grau de ambição dos seus cidadãos: pretendem eles uma verdadeira revolução ou apenas melhorar o sistema, tornando-o mais democrático? Outro aspecto importante resume-se ao facto de a real Rússia ser muito diferente dos seus grandes centros – Moscovo e São Petersburgo. Na Rússia rural não há acesso a fontes de informação independentes e a resistência a novas correntes pró-democráticas é imensa. A popularidade da Rússia Unida e de Putin nestas regiões é mantida pela compra de votos, a subsidiação e um sistema de controlo de informação que quase pode ser apelidado de censura. A figura de Putin é mesmo associada à restauração do antigo poderio soviético. A resposta mais ou menos repressiva das autoridades russas será também determinante no desenrolar dos acontecimentos.
Os duros invernos russos foram determinantes ao longo de toda a história deste país. Esperamos, assim, que também este em particular marque o começo da construção de algo novo e, sobretudo, melhor.
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