"Deve haver um dia em que a sociedade, como os indivíduos, chegue à maioridade." - Alexandre Herculano
domingo, 5 de agosto de 2012
Sayonara do Último Nan Ban Jin!
Um dos blogues que acompanhei com avidez nos últimos anos acabou.
Estou triste, por razões egoístas.
Sentirei falta das venturas e desventuras, estados-de-alma e outros apontamentos de um Português no Japão.
Aqui fica transcrição do seu último texto.
"Tomando de ensejo o assinalar do centenário da morte de Sua Majestade o Ten'Ō Meiji (明治天皇 , 3.11.1852 – 30.7.1912), este TLNBJ segue hoje a enterrar, desta feita de vez, e sem direito a mais exumações.
Tempo houve em que valeu a pena andar por aqui, pela escrita em formato blogue, dava gozo e a escrita revestia-se de uma pertinência que nem sempre se queria demasiado pertinente.
Uma janela para o Mundo, como alguém dele disse, com vista sobre um seu onírico e quasi-obscuro canto, ilha remota, Kyūshū essa, tão prenha de histórias ainda e sempre por contar...
Há muito que já não sou daqui.
Deste formato, digo.
Lamento dizê-lo, mas salvo uma mão-cheia de mui nobres e honrosas excepções, aquilo a que uns convencionaram chamar blogosfera portuguesa, seja lá o que isso for, há muito que descambou num deplorável muro de lamentações, mais um, natural extensão online de um certo ruminar permanente e vicioso de pessimismos de mesa de café, e onde as lamúrias de sempre se entre-atropelam, e, sinceramente, nunca dei, quiz dar ou darei um chavo que seja para esse peditório.
Acresce que, de regresso a Portugal, e ainda que haja de voltar tão breve quanto possível ao país que tão bem me acolheu estes últimos quatro anos, hoje mais que nunca, e mesmo com tanto mal a afligir os que mais remédio não têm senão por cá ficar lutando pelas suas vidas, com tanto, dizia eu, que haja de maldizer, hoje, mais que nunca, sei o quão bom é ter Portugal por Pátria, por minha terra, nossa terra, lugar a amar mais que qualquer outro, e a trazer no peito, hoje e sempre, como se traz todo quanto nos é querido de verdade.
Escolho esta data para fechar este espaço, também pelo carácter simbólico, invocativo, que a data encerra e no que ao Japão e à História do nosso tempo se refere: o Japão que Mutsuhito, o jovem Imperador que envergaria o nome póstumo de Meiji (明治, literalmente o 'Governo da Luz'), herdou de seus antepassados mais não era que um pobre e atrasado arquipélago no encosto mais extremo do Extremo Oriente, longa cordilheira de penhascos flutuantes à porta da Ásia, que outros, na sua curteza de vistas, só poderiam conceber como entreposto conveniente para naves forasteiras que cruzassem o vasto oceano em busca de paragens mais prósperas logo ali ao passar doutros estreitos.
O Japão que Meiji deixou a 30 de Julho de 1912, escassos quarenta e poucos anos após a sua ascensão ao Trono do Crisântemo, era uma potência entre as primeiras de entre as grandes nações da Terra.
O Japão de Meiji, sem nunca abdicar da sua mais cara essência identitária, e em nome da mais urgente das tarefas — o da sobrevivência da sua soberania nacional — obrigou-se a uma transformação cultural, social, económica e política sem precedentes na história da Humanidade, uma metamorfose tão profunda quão dramática e não poucas vezes dada a um preço demasiado alto a pagar. Mas fê-lo para que o Japão de hoje seja a referência cimeira que ainda é, para tantos de nós, enquanto paradigma de uma sociedade solidamente desenvolvida, estável, segura, justa e digna do nosso mais reverencial louvor — ainda e sempre entre as mais dignas de nota das nações do nosso Mundo.
Face às mazelas do destino, o Japão nunca se perdeu em lamentos estéreis à boca escancarada. A este respeito recordamos, uma vez mais, a tragédia de Kanto de 1923, os dias dos tenebrosos daikūshū de '45, Kobe e Tōhoku que vimos com os nossos olhos, cair e reerguer, inabaláveis, do ardor das cinzas.
A cada crise, o Japão respondeu sempre com um redobrar das suas forças, o mais das vezes indo-las buscar onde não sobrava a mais mísera réstia de esperança.
E levantar-se, sempre! Sim! sem pedir contas a outrem que não a si mesmo e à sua castigada gente.
Observar, aprender, fixar, é isso, a nós outros, que nos resta...
E quanto ao mais, é tempo de partir e deixar de vez estas paragens.
A todos quantos se interessaram, inspiraram, daqui colheram inspiração e a tantos quantos fizeram questão de ler este quase-diário de bordo, pouco regular mas feito, o mais das vezes, com muita boa vontade e alegria, enquanto foi tempo de navegar, um sentido agradecimento do mais fundo do meu coração — a todos vós um emocionado 'Arigato gozaimasu' — não citarei nomes: vós sabeis quem sois."
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