Cheguei ao Marquês às 14h30. Comigo trazia a ansiedade e a esperança. Ansiava pelo materializar de um momento único, esperava que a minha ansiedade se concretizasse. Ainda não estava muita gente. Já existiam ilhas de pessoas, mas não como em outras manifestações. Sem saber esta era já a primeira imagem da diferença. Uma manifestação que não é organizada centralmente não tem um ponto de encontro mas muitos. O nosso era o Tivoli e por isso começamos por descer a Avenida.
Cheguei também dividido. Parte de mim estava ali por ele próprio, outra parte estava pelo movimento a que pertence. Esta foi uma dúvida que carreguei até ao ultimo momento. Deveria ou não explicitar o movimento a que pertenço. Afinal era uma manifestação apartidária e não queria distorcer o âmbito da mesma. Por isso, um simples acto de vestir uma T-shirt foi um acto de reflexão profunda. Depois de muito pensar e me questionar decidi vestir. Para mim seria hipócrita não o fazer. Eu sou ambos, e entrei nesse movimento para participar na vida cívica. Tendo ou não a camisola vestida eu pertenço ao mesmo. A camisola tinha a vantagem de não sonegar essa informação aos outros. O que os outros pensariam do meu acto não é da minha competência.
Na mochila levamos a resposta a uma crítica feita na semana passada. Diziam que os “jovens” não tinham soluções, que nunca apresentavam soluções. Nós quisemos demonstrar o contrário e levávamos uma sugestão das mesmas. Era um simples gesto, no meio de outros tantos. E também apenas uma proposta de soluções, no meio de tantas outras.
Entretanto as ilhas já não o eram, tinham-se transformado num oceano de pessoas. Olhar para o mesmo era uma alegria dada a diversidade do mesmo. Lá fomos nós integrar também aquela multidão.
Estava nervoso. Seria um teste ao que estava a acontecer. Será que a realidade que tenho conhecido nas discussões internáuticas e facebookianas se tinha transferido para a rua? Ou será que a antiga realidade “separatista” era ainda dominante? Afinal pertenço a um movimento ultra minoritário por cá, uma corrente de pensamento incompreendida e muitas vezes distorcida. Mas não passou nem 5 minutos até ter o meu teste. Uma pessoa aborda-me para falar comigo. Pertencíamos a pólos profundamente afastados. Numa outra situação, numa outra realidade, nunca nos teríamos ouvido. Seria discussão certa e quem sabe o que mais. Mas não agora e não ali. Discutimos os nossos mundos, defendemos as nossas causas e principalmente respeitamo-nos mutuamente. E passado uns momentos de trocas de ideias seguimos os nossos destinos. Este foi o momento para mim em que a esperança se tornou real.
Não foi apenas a quantidade de pessoas, foi tudo que tornou esta manifestação única. As pessoas, pelas suas acções, fizeram calar todas as criticas e os receios que existiam antes. Ali estiveram milhares de pessoas que protestavam contra uma realidade. Pessoas interessadas, pessoas preocupadas. Pessoas que carregam o sonho de mudança, de fazer as coisas de maneira diferente. Até ao 12 de Março ter-se-ia dito que era impossível juntar mais de 200.000 pessoas numa manifestação sem ser de um dos grandes “organizadores” nacionais. Que o “grande” protesto é monopólio das estruturas comunistas ou bloquistas. Que, se algo não centralizado acontecesse, iria descambar em violência. Dir-se-ia que as pessoas não estavam interessadas em protestar. Sei lá mais o que se disse. Toda essa realidade “virtual”, que era dogma a 11 de Março, foi quebrado ontem.
E a mensagem foi clara: queremos mudanças!
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