Este post é uma resposta ao seguinte artigo, escrito por João Cardiga no seguimento de uma discussão no Facebook sobre o tema.
Agradeço desde já o post do João Cardiga sobre esta temática, já que considero que a mesma será um dos desafios e escolhas que teremos de analisar perante o Estado de crise no qual se encontram as moedas fiduciárias, nomeadamente o Euro e o Dólar. Decidi-me por este nome para a resposta em honra dos autores do livro, que desde já recomendo, “The Case for Gold”, Ron Paul e Lewis Lehrman. Muito me elucidaram em relação à questão, e é com prazer que analiso as problemáticas aqui apresentadas. (Ver aqui.)
A minha firme oposição ao “papel dinheiro” per se tem dois fundamentos, o económico e o moral, questão que já aderecei, do ponto de vista dos ciclos económicos, no post referido no fim do texto. Neste vou simplesmente apresentar os pontos nos quais penso que o texto do João não faz uma análise apropriada do problema.
As duas razões enumeradas como justificação para a menor eficiência económica do padrão ouro estão expostas sinteticamente nos dois pontos enunciados, após os quais o João concluí que o sistema europeu conjuga os benefícios e elimina os malefícios de tal sistema. Não considero que sejam válidas qualquer uma das premissas, concordo no entanto que o nosso sistema monetário, centrando-se na inflação, é menos perigoso que o Krugmanismo militante da Reserva Federal Americana, apesar disso, nos últimos tempos o BCE deixando a inflação passar (e muito) dos 2% dá-nos motivos para preocupações.
Responderei, agora, ponto por ponto, quer às duas enumerações, quer à conclusão:
1) Neste ponto penso que há um engano em relação à questão da preferência temporal e aos seus efeitos. O consumo futuro tem de ver com os bens presentes transformados em bens de capital, e não em bens de consumo presentes (simplesmente usados… em consumo). A primeira opção permite mais investimento, o que aumentará a capacidade productiva futura. A segunda opção, o consumo, proporcionará maior consumo presente, mas impede o crescimento dos meios futuros.
Pensem, por exemplo, que uma pessoa, em vez de usar uma reserva alimentar para ir passear pelo parque, a usa para poder construir uma rede de pesca e conseguir apanhar peixes no futuro. É disso que se trata.
O facto do consumo presente ser menor é o que possibilita o acrescento na quantidade de bens de capital, e consequentemente um output X futuro maior que o presente. Este output, por sua vez, será subdividido em bens de capital e bens de consumo através da quantidade de poupança acumulada voluntariamente pela comunidade. Isto significa mais bens de capital, e mais bens de consumo.
Dizer que mais consumo presente significa mais bens de capital futuros é simplesmente um oxímero, já que o consumo de bens impossibilita o seu uso como bem de capital. E o uso como bem de capital impossibilita o seu consumo.
Como se pode constatar pelos seguinte gráficos, é a poupança (abstenção de consumir) , e não o consumo, que está profundamente vinculada à produção de bens de capital.
Esta relação profunda é uma das grandes responsáveis pelo chamado “Milagre Japonês”, no qual uma economia em profunda carência manteve taxas de poupança a rondar os 30%, 40% e assim conseguiu um aumento exponencial do seu PIB potencial, enquanto que os países ocidentais, por várias razões, apresentavam poupanças mais baixas e consequentemente acrescentos de capital menores.
2) Dizer que não há intermediários num sistema creditício baseado na poupança não tem, a meu ver, razão de ser. Existem vários mecanismos de controlo do risco, que passam por seguros sobre divida, depósito de fundos em instituições bancárias, associações mutualistas etc. Não vejo o porquê deste ponto no texto do João. Quanto à “poupança não utilizada” igual, não vejo o porquê, numa economia mais sólida e com menos risco devido à estabilidade monetária, dos bancos e cidadãos quererem sentar-se sobre pilhas de dinheiro. A mesma lógica é válida para qualquer outro recurso, se por alguma razão arbitrária os senhores dos cafés deixarem de servir café isso levará “a um desperdício tremendo de recursos existentes”.
Se bem que no caso da moeda não é tão grave pois não é um bem de consumo, devo lembrar que a escassez leva a maior oferta, logo fundos não aplicados na economia levariam à valorização da poupança ainda mais, o que produziria mais fundos para empréstimo pressionando assim os “poupadores sentados em cima de uma pilha de dinheiro” a usá-lo ou então a sofrer com o aumento do crédito disponível. Penso que neste ponto esquece-se do sistema de incentivos.
Chego então a uma conclusão diferente da do João, menos risco, pelo sistema monetário, e mais recursos para investir derivados da poupança significam mais bens de capital e consequentemente a exploração de novas possibilidades económicas. Facilmente, com mais recursos para investir, ainda por cima mais baratos, poderíamos arriscar em telefones sem fios ou Internet.
Além deste argumento, puramente económico, há o argumento histórico. O fim do século XIX, a idade no qual o padrão ouro era o sistema monetário internacional, foi o período no qual a inventividade humana pôs aviões no ar, carros na estrada, e criou os navios a carvão; foi o período no qual o bem estar humano mais subiu comparativamente. Como podemos ver, o argumento económico é acompanhado pelo histórico.
Poupança é riqueza, é investimento, é crescimento e inventividade; tudo isto potenciado e possibilitado por um sistema monetário previsível o qual estabelece as bases para a acumulação das mesmas, evitando a expropriação governamental perseguida com persistência por governos e bancos, de forma a financiarem-se retirando valor aos recursos monetários dos agentes produtivos.
Notas:
1- Quem estiver interessado na análise da relação entre o crédito artificial e os ciclos expansão-recessão pode ler o meu post sobre o tema clicando aqui.
Agradeço desde já o post do João Cardiga sobre esta temática, já que considero que a mesma será um dos desafios e escolhas que teremos de analisar perante o Estado de crise no qual se encontram as moedas fiduciárias, nomeadamente o Euro e o Dólar. Decidi-me por este nome para a resposta em honra dos autores do livro, que desde já recomendo, “The Case for Gold”, Ron Paul e Lewis Lehrman. Muito me elucidaram em relação à questão, e é com prazer que analiso as problemáticas aqui apresentadas. (Ver aqui.)
A minha firme oposição ao “papel dinheiro” per se tem dois fundamentos, o económico e o moral, questão que já aderecei, do ponto de vista dos ciclos económicos, no post referido no fim do texto. Neste vou simplesmente apresentar os pontos nos quais penso que o texto do João não faz uma análise apropriada do problema.
As duas razões enumeradas como justificação para a menor eficiência económica do padrão ouro estão expostas sinteticamente nos dois pontos enunciados, após os quais o João concluí que o sistema europeu conjuga os benefícios e elimina os malefícios de tal sistema. Não considero que sejam válidas qualquer uma das premissas, concordo no entanto que o nosso sistema monetário, centrando-se na inflação, é menos perigoso que o Krugmanismo militante da Reserva Federal Americana, apesar disso, nos últimos tempos o BCE deixando a inflação passar (e muito) dos 2% dá-nos motivos para preocupações.
Responderei, agora, ponto por ponto, quer às duas enumerações, quer à conclusão:
1) Neste ponto penso que há um engano em relação à questão da preferência temporal e aos seus efeitos. O consumo futuro tem de ver com os bens presentes transformados em bens de capital, e não em bens de consumo presentes (simplesmente usados… em consumo). A primeira opção permite mais investimento, o que aumentará a capacidade productiva futura. A segunda opção, o consumo, proporcionará maior consumo presente, mas impede o crescimento dos meios futuros.
Pensem, por exemplo, que uma pessoa, em vez de usar uma reserva alimentar para ir passear pelo parque, a usa para poder construir uma rede de pesca e conseguir apanhar peixes no futuro. É disso que se trata.
O facto do consumo presente ser menor é o que possibilita o acrescento na quantidade de bens de capital, e consequentemente um output X futuro maior que o presente. Este output, por sua vez, será subdividido em bens de capital e bens de consumo através da quantidade de poupança acumulada voluntariamente pela comunidade. Isto significa mais bens de capital, e mais bens de consumo.
Dizer que mais consumo presente significa mais bens de capital futuros é simplesmente um oxímero, já que o consumo de bens impossibilita o seu uso como bem de capital. E o uso como bem de capital impossibilita o seu consumo.
Como se pode constatar pelos seguinte gráficos, é a poupança (abstenção de consumir) , e não o consumo, que está profundamente vinculada à produção de bens de capital.
Esta relação profunda é uma das grandes responsáveis pelo chamado “Milagre Japonês”, no qual uma economia em profunda carência manteve taxas de poupança a rondar os 30%, 40% e assim conseguiu um aumento exponencial do seu PIB potencial, enquanto que os países ocidentais, por várias razões, apresentavam poupanças mais baixas e consequentemente acrescentos de capital menores.
2) Dizer que não há intermediários num sistema creditício baseado na poupança não tem, a meu ver, razão de ser. Existem vários mecanismos de controlo do risco, que passam por seguros sobre divida, depósito de fundos em instituições bancárias, associações mutualistas etc. Não vejo o porquê deste ponto no texto do João. Quanto à “poupança não utilizada” igual, não vejo o porquê, numa economia mais sólida e com menos risco devido à estabilidade monetária, dos bancos e cidadãos quererem sentar-se sobre pilhas de dinheiro. A mesma lógica é válida para qualquer outro recurso, se por alguma razão arbitrária os senhores dos cafés deixarem de servir café isso levará “a um desperdício tremendo de recursos existentes”.
Se bem que no caso da moeda não é tão grave pois não é um bem de consumo, devo lembrar que a escassez leva a maior oferta, logo fundos não aplicados na economia levariam à valorização da poupança ainda mais, o que produziria mais fundos para empréstimo pressionando assim os “poupadores sentados em cima de uma pilha de dinheiro” a usá-lo ou então a sofrer com o aumento do crédito disponível. Penso que neste ponto esquece-se do sistema de incentivos.
Chego então a uma conclusão diferente da do João, menos risco, pelo sistema monetário, e mais recursos para investir derivados da poupança significam mais bens de capital e consequentemente a exploração de novas possibilidades económicas. Facilmente, com mais recursos para investir, ainda por cima mais baratos, poderíamos arriscar em telefones sem fios ou Internet.
Além deste argumento, puramente económico, há o argumento histórico. O fim do século XIX, a idade no qual o padrão ouro era o sistema monetário internacional, foi o período no qual a inventividade humana pôs aviões no ar, carros na estrada, e criou os navios a carvão; foi o período no qual o bem estar humano mais subiu comparativamente. Como podemos ver, o argumento económico é acompanhado pelo histórico.
Poupança é riqueza, é investimento, é crescimento e inventividade; tudo isto potenciado e possibilitado por um sistema monetário previsível o qual estabelece as bases para a acumulação das mesmas, evitando a expropriação governamental perseguida com persistência por governos e bancos, de forma a financiarem-se retirando valor aos recursos monetários dos agentes produtivos.
Notas:
1- Quem estiver interessado na análise da relação entre o crédito artificial e os ciclos expansão-recessão pode ler o meu post sobre o tema clicando aqui.
Caro Diogo,
ResponderEliminarIndependentemente da posição que possamos ter em relação a este tema, gostaria de chamar a atenção para um problema que surge variadissimas vezes na discussão politica/económica.
Parece-me a mim, apesar deste ser apenas o meu entendimento, que utilizaste como argumento o facto de a época das "grandes invenções" ter sido a época em que o padrão ouro imperava. Quero chamar a atenção para a diferenciação entre uma correlação e uma relação de causa efeito. É comum no senso comum, e até em muitos debates televisivos estipular-se que existem relações de causa efeito quando na verdade apenas se podem inferir correlações dos dados apresentados.
Aqui fica um exemplo que uma vez me apresentaram para ilustrar esta incorrecção:
"No mês de Agosto existe um enorme aumento do número de estrangeiros no Algarve. No mesmo período existe um aumento do númer de "invasões" por parte das formigas. Logo os estrangeiros trazem as formigas"
Desta forma parece ridiculo, mas é isto que se faz muitas vezes. Para se identificar uma relação de causa efeito devem existir 3 condições essenciais:
1. A causa deve anteceder o efeito;
2. Deve existir uma relação entre a causa e o efeito (negativa ou positiva);
3. A relação entre a causa e efeito não deve ser espúria.
Grande abraço.