terça-feira, 16 de agosto de 2011

Literatura, Cultura e Cosmopolitismo

Imaginemos um sistema em que havia mais autonomia curricular ao nível das escolas, e mais autonomia na escolha das escolas.

Num sistema como este, eu escolheria escolas em que as pessoas aprendessem literatura (além de textos não-literários) como parte do estudo da língua. Não porque os programas definissem o que é "boa" literatura ou "má" literatura, ou que definissem que se tem de gostar de certos livros ou não gostar de outros (isso é com cada um), mas porque a língua não é apenas um conjunto de regras de gramática. É uma emanação cultural, sendo a literatura uma aplicação da língua cujo estudo ajuda a aprender a cultura da qual a língua é uma emanação, e que portanto ajuda a compreendê-la melhor.

Em casa, exporia também os meus filhos a outros livros, a outras ideias, e quereria contar com a escola como um aliado na minha tentativa de lhes expandir os horizontes para além, se possível, daqueles que eu próprio tenha conseguido atingir. Mas claro, eu tenho os meus gostos e as minhas preferências, o que tenderia a toldar aquilo a que os meus filhos estariam expostos. E eu considero que os meus filhos têm direito a ter acesso a conhecimento que eu não tenha, não sendo limitados pelos meus gostos e pelas minhas preferências.

Em suma, quereria que a escola fosse minha aliada no meu propósito de que os meus filhos adquirissem a capacidade de compreender e criticar obras literárias e não-literárias, além da capacidade de escrever textos de ficção e de não-ficção, expandindo-lhes os horizontes, se possível, até para além dos meus.

Quereria isso por dois motivos principais:
1) Considero que o conhecimento e a capacidade de processar conhecimento são importantes por si só;
2) Nos tempos que correm, as pessoas precisam cada vez mais de se diferenciar das outras para conseguirem um emprego e a vida que desejarem, e para isso precisam de vantagens comparativas; esta capacidade de raciocínio é uma vantagem comparativa importante.

Mesmo que os meus filhos fossem para algo que pouco tivesse a ver com literatura, a capacidade de interpretação e de elaboração de textos de qualidade continuaria sempre a jogar a seu favor. Da mesma forma que a lógica matemática me ajudou, e me tem ajudado, enquanto jurista.

(Nota: tudo o que eu disse está pensado para toda e qualquer língua, e eu quereria que os meus filhos aprendessem mais do que português, claro está.)

De um ponto de vista da comunidade como um todo, considero que maximizar o nível de literacia da população tem impactos relevantes ao nível da qualidade de vida e dos empregos que se criam e aos quais se tem acesso. Tem ainda impacto relevante na capacidade que a comunidade tem de se reinventar. E tem, finalmente, impacto ao nível da capacidade que os filhos têm de se emancipar, enquanto indivíduos, das restrições colocadas pelo «background» dos pais.

Isto, combinado com a aprendizagem de diversas línguas, o que significa exposição a várias culturas diferentes, promove o diálogo cultural e a abertura de espírito. Promove um certo cosmopolitismo que eu considero desejável, e que tem faltado nos dias que correm.

Entre os mil e um projectos que me correm pela cabeça, e que um dia gostaria de implementar, um deles é precisamente fundar, ou auxiliar, uma associação vocacionada para este tipo de fins. Mas o tempo, infelizmente, não dá para tudo.

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