Numa altura em que o Presidente da República enviou diversas normas do Orçamento do Estado para 2013 para serem analisadas pelo Tribunal Constitucional, não deixa de ter alguma piada ler notícias sobre a declaração de inconstitucionalidade de algumas medidas fiscais de François Hollande (e, indirectamente, sobre os níveis de inconstitucionalidade em França). (Uma versão da notícia em português pode ser lida aqui, e aqui fica também um artigo do Guardian sobre o tema.)
De notar que o Conselho Constitucional não declarou a inconstitucionalidade da taxa de 75% com base na taxa em si, mas sim na forma como era calculada a base de incidência do imposto. De notar ainda o impacto orçamental da medida, bem como os níveis a que chegam os impostos em França. Finalmente, é sempre engraçado ver a Esquerda defender o «patriotismo» de pagar impostos, enquanto reclama contra aqueles que «desistem do país» - que é a melhor forma das pessoas começarem a pensar que o país desistiu foi delas.
François Hollande lá vai continuando o seu passeio pela realidade, enquanto a França continua também em crise. Não bastou François Hollande ser eleito para o mundo mudar, o crescimento surgir, e a crise acabar, e não é por António José Seguro ir a França falar com François Hollande que podemos ficar descansados que a situação portuguesa iria melhorar - basta ver a posição do Governo francês relativamente à ideia de Portugal ver menos oneradas as condições para os seus empréstimos.
François Hollande ganhou as eleições contra Nicolas Sarkozy com uma mão cheia de medidas emblemáticas e grandes juras de amor ao investimento público. As medidas emblemáticas provaram ser o que eram. Os cortes na despesa mostraram-se incontornáveis. O Governo francês aplicou uma desvalorização fiscal. E, em parte, vários aumentos de impostos foram agora declarados inconstitucionais.
É evidente que não se podia esperar de François Hollande que resolvesse todos os problemas da França em tão pouco tempo. Mas a rapidez com a qual acabou «apanhado» pelos bitaites que mandou quando teve de governar foi a esperada - da mesma forma que pouco se ouve falar nas «gorduras do Estado» em Portugal por parte do PSD ou do CDS-PP (ou mesmo do PS). Governar é bem diferente de mandar bitaites, inventar «slogans» e ganhar eleições. Governar implica fazer escolhas e tomar medidas, algumas impopulares - e, em tempos de crise, muitas delas provavelmente impopulares.
As inconstitucionalidades em França vêm, de qualquer forma, lembrar que também aumentos de impostos podem ser declarados inconstitucionais - e que essas declarações de inconstitucionalidade têm impacto político, mesmo quando estão em causa apenas medidas emblemáticas (e mesmo que o cerne da questão não tenha sido o valor da taxa ser 75%).
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