De facto, eu sou liberal. Precisamente por ser liberal, defendo uma União Europeia federal. Isto porque defendo a liberdade individual e o mercado, e considero a soberania nacional como uma forma (não muito velada) de proteccionismo, e de atentado contra a liberdade individual e a igualdade de oportunidades (e, genericamente, da igualdade perante a lei). O meu europeísmo assenta na defesa de um mercado único, e esse mercado vai ter de se pautar por regras comuns. Caso contrário, haverá distorções.
Ser federalista não significa querer afastar o poder político dos cidadãos. Significa querer defender a liberdade desses mesmos cidadãos perante barreiras arbitrárias impostas pelos Estados. Significa querer aproximar a União Europeia dos cidadãos, criando uma verdadeira cidadania europeia, e um verdadeiro espaço público europeu. Significa respeitar à risca o princípio da subsidiaridade, e não a soberania nacional (que, como eu já referi, encaro como um apelo proteccionista), como garante de que os problemas são resolvidos ao nível mais próximo possível das pessoas.
Eu prefiro a União Europeia actual à inexistência de União Europeia, mas isso não significa que defenda a União Europeia tal qual existe hoje. E não significa que, apesar de preferir o Euro à inexistência do Euro, defenda que devamos parar por aqui. Longe disso. Defendo, isso sim, um Ministério das Finanças Europeu. Defendo a criação de impostos europeus, de forma a que os cidadãos europeus financiassem directamente a União Europeia, em vez de o fazerem através dos Estados. Defendo que as relações externas e a defesa deviam ser federalizadas. E, finalmente, defendo a independência do Banco Central Europeu como garantia da credibilidade do Euro.
É esta independência que tem sido posta em causa devido aos empréstimos que o BCE fez, e que o Filipe Faria menciona no seu artigo, e que serviram para financiar indirectamente os Estados. Acontece que esses empréstimos foram sempre anunciados como provisórios, foram claramente feitos a contragosto, e acabaram. O programa de resgate, por seu turno, não é uma dádiva, é um contrato mediante o qual o Estado português se compromete a reestruturar a sua economia no sentido de a liberalizar, e por isso recebe um empréstimo para o manter à tona enquanto essas reformas, cruciais para o desenvolvimento económico do país, sejam feitas.
Preferia que não houvesse resgate. Mas o resgate não foi causado pelo BCE ou pelo Euro. E a nossa situação económica também não foi causada pelo BCE ou pelo Euro. A nossa situação económica foi causada pelo nosso baixo nível de produtividade e pela rigidez da nossa economia. Estamos agora em crise, numa altura em que outros países já saem da crise, e essa crise é um sinal claro das reformas de que precisamos. Essas reformas são reformas liberais. Se queremos competir, aproveitando verdadeiramente o Euro, então temos de as fazer.
O argumento de que a desvalorização é um estímulo às exportações não leva em linha de conta a razão pela qual as nossas empresas não exportam, ou não são competitivas, e essa razão não é a moeda. Nós já temos sectores competitivos na nossa economia, que aproveitam e potenciam o Euro. São os sectores em que há concorrência, e que não dependem de subsídios para subsistir. E acontece que temos andado a garantir a subsistência de empresas que prestam serviços/produzem bens não-transaccionáveis através de constantes subsídios. Parece-me que em vez de sairmos do Euro, devíamos acabar com esses subsídios, e garantir a concorrência, deixando os consumidores escolherem o que é produzido, e não o Estado. Isso sim, ia incentivar aumentos de produtividade, coisa que sair do Euro não ia fazer.
Estar no Euro significa que sentimos na pele as más decisões do nosso Governo, porque não podemos recorrer ao expediente da «desvalorização competitiva» para fingir que tudo está bem, mascarando o empobrecimento generalizado que realmente acontece. Estar no Euro significa dar uma maior capacidade às pessoas para perceber o impacto que a rigidez da nossa economia tem no seu nível de riqueza. Sair do Euro significa voltar ao tempo dos remendos fáceis, e da política centrada na produção por escolha do Estado, e não na escolha das pessoas.
Sair do Euro seria uma forma de contornar o problema da falta de produtividade, sem o resolver, que geraria todos os problemas que eu mencionei, sucintamente, no meu artigo anterior. Estar no Euro é um incentivo à liberalização e dinamização da economia. Portanto, devemos continuar no Euro. E devemos, finalmente, mudar de vida.
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