sábado, 3 de novembro de 2012

Fomento Industrial

O modelo de desenvolvimento descrito e denunciado, com razão, pelo João Mendes neste texto relembra-me algumas propostas que se ouvem por cá com mais frequência desde que FMI, troika e austeridade passaram a fazer parte do nosso léxico diário. Estas propostas passam em muitos caso por desenvolver em Portugal uma política industrial de fomento que apoie as empresas exportadores e incentive a poupança que irá posteriormente alimentar o crédito para investimento. O Estado Novo, com sucesso moderado, implementou políticas semelhantes que durante os anos 60 serviram para trazer boa parte da população rural para as cidades para trabalhar nos pólos industriais recém criados, praticamente todos eles localizados no litoral. Inicialmente procurou-se criar industrias locais de substituição de importações que mais tarde, com a redução de barreiras à entrada no mercado português e especialmente a entrada na EFTA, se tornariam mais competitivas e prontas a concorrer nos mercados internacionais. No nosso caso, o processo foi completamente interrompido com o 25 de Abril sem que as indústrias em questão pudessem maturar completamente. A nacionalização e posterior privatização sob regras e critérios duvidosos só serviu para beneficiar grupos específicos que nominalmente privados estão ainda perigosamente próximos do poder político.

No caso de outros países, especificamente o da Coreia, este tipo de medidas tiveram resultados diferentes. Aquele país pobre e devastado pela guerra entrou nos anos cinquenta com uma economia equivalente a alguns países africanos recém-descolonizados. Mais uma vez uma política de substituição foi seguida de uma promoção de exportações. A partir dos anos sessenta contudo o país enfrentava uma concorrência severa de países mais baratos nos produtos que produzia e na década seguinte optou pelo proteccionismo de indústrias químicas e pesadas. No fim dos anos 80, quando a Coreia deu início às reformas que desmantelaram a ditadura no poder desde a independência, aquele país já possuía multinacionais muito competitivas para além de ter logo a seguir enveredado pela exportação de capital, já que a acumulação doméstica começou a esbarrar contra retornos cada vez mais baixos. É de salientar que estas décadas foram acompanhadas por um enorme (às vezes doentio) esforço de educação da população.

Este programa, inspirado no japonês e emulado noutros países da região, conseguiu de facto enriquecer um país outrora profundamente atrasado mas a que custo? Todo o processo ocorreu em ditadura com os cidadãos obrigados a depositar poupanças no bancos nacionais tanto porque não tinham escolha como havendo pouca coisa que consumir não havia muito mais a fazer com os rendimentos. Foi preciso que os sucessivos governos estivessem em concordância sobre política fiscal e económica durante quatro décadas, algo que é difícil mesmo sem pressão eleitoral. Portugal hoje não tem autonomia para impor barreiras semelhantes nem acredito que a população esteja disposta a deferir consumo hoje para obter uma potencial prosperidade daqui a um número indeterminado de décadas. Podíamos claro beneficiar de alguma consistência no nosso panorama fiscal que para além de complexo muda com bastante frequência. Tal como o João diz, devíamos baixar os impostos às empresas em geral e evitar isenções e programas que só complicam e representam questões morais significativas. "Porque é que os meus impostos financiam aquela e não a outra?" entre outras questões. Infelizmente continuamos a ver as empresas como o inimigo e aliado daquele maléfico demiurgo de nome "capital" sem percebemos que só devemos incentivar o sucesso das empresas (e não as rendas), com apenas a concorrência a beneficiar de "protecção".

3 comentários:

  1. No Economist deta semana há um artigo interessante sobre o Bangladeche, no qual se refere que nesse país democrático, apesar da politiquice fortemente implantada, os governos conseguiram, ao longo de décadas, manter consistentemente algumas políticas sociais coerentes.

    O que pretendo dizer é que não é impossível que num país democrático os diversos governos consigam manter uma certa linha política consistentemente. Não é forçosamente necessária uma ditadura como a coreana.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Não é forçosamente apenas em ditadura, de facto. O Japão conseguiu o mesmo em democracia (pondo de parte as discussões sobre a "democraticidade" do Sistema de 1955) mas isto sucedeu-se num contexto que era o reverso do de Westminster, com governos essencialmente de fachada e o aparelho burocrático a ditar as políticas a implementar. Não conheço o caso do Bangladexe mas não acredito que Portugal tenha uma configuração institucional que permita consensos de longo prazo, excluindo eventualmente os habituais consensos sobre deitar dinheiro público à rua.

      Eliminar
  2. Mancur Olson explica isso bem, infelizmente ter um déspota esclarecido como por exemplo teve Singapura é inexiste ou muito raro.
    Aliás politicas de fomento serão muito mal aceites pela União Europeia e duvido que com um Comissário na Concorrência duro como por exemplo foi Mario Monti as deixe passar.
    Abraço

    ResponderEliminar