Os portugueses vêem-se em crise. Com isto, poupam. Não surpreende. Uma crise leva a que as pessoas se retraiam e joguem pelo seguro. E, portanto, refreiam o consumo e começam a poupar. Por muito custoso que seja, arranjam forma de deixar de lado uns trocos ao fim do mês, num local que considerem seguro, para acautelar o seu futuro. Normalmente, isso significa um banco, que poderá canalizar este dinheiro para financiamento da economia. O desenvolvimento de hábitos de poupança significaria assim uma maior quantidade de dinheiro disponível nos bancos para fazerem, por exemplo, empréstimos a empresas. Agora estamos em recessão, mas parte de sair da recessão é criar condições para o investimento tornar a florescer, e hábitos de poupança é um começo.
Isto não é suficiente para o Ministro da Economia e Emprego. Dado que um banco de fomento não se cria de um dia para o outro, anda agora a estudar criar «títulos de dívida para a reindustrialização». Aliás, vai mais longe, e já decretou que a indústria tem de ter um peso mínimo de 20% na economia portuguesa. O dinheiro que vem da UE vai, portanto, ser canalizado através do QREN para «reindustrializar o país». O Ministro não diz, mas adivinha-se que hão-de ser definidos pelo seu Ministério os sectores prioritários para receber esse dinheiro, de forma a melhor promover as exportações, que é um dos grandes objectivos deste Governo. Esse e, pelos vistos, «ajudar as PME» - um dos grandes objectivos de vários Governos ao longo dos últimos anos em Portugal.
O Ministro da Economia e Emprego não deve ter reparado que, mesmo sem os seus títulos de dívida para reindustrialização, os portugueses já começaram a poupar, e não deve considerar relevante que as decisões sobre onde aplicar esse dinheiro não sejam feitas com base em decisões políticas arbitrárias assentes em decisões retiradas de um chapéu sobre qual o peso mínimo dos sectores na economia portuguesa, mas sim com base na viabilidade e rentabilidade futura dos projectos. Não deve considerar também importante promover as condições para que o capital de risco privado surja em força em Portugal, dando prioridade ao capital de risco público, como não podia deixar de ser.
Álvaro Santos Pereira julga que, como Ministro da Economia e Emprego, o seu papel é dirigir e controlar a economia portuguesa, de acordo com as suas preferências pessoais e as dos seus conselheiros. Age, então, em conformidade com aquilo que pensa. E aquilo que pensa não se distingue muito daquilo que o principal partido da Oposição, o PS, tem vindo a defender. Também o PS carpe mágoas pelas pequenas e médias empresas, prometendo todo o tipo de auxílios públicos. Também o PS quer um banco de fomento. Também o PS quer controlar a economia portuguesa a partir de cima.
Não bastando os títulos de dívida para a reindustrialização, temos também as propostas relativas a gasolina «low cost», de que Pedro Pita Barros aqui fala. Como ele diz, a prioridade devia estar em retirar barreiras à entrada. Em vez disso, criam-se obrigações vindas de cima, com a ideia de que isto fará, milagrosamente, baixar o preço dos combustíveis. E se forem tabelados preços para o combustível, ainda pior. Mas, de novo, o Governo demonstra que o seu instinto nestas matérias não é pensar como sair da frente de quem queira vender combustíveis a preços mais baixos (note-se que eu considero que há aqui externalidades negativas relevantes a ter em causa, e não acho que o Governo deva ignorá-los ao tomar as suas decisões a este respeito), o Governo toma as decisões directamente.
Quem andava infeliz por o Ministro da Economia e Emprego não vir a terreiro com uma medida nova todos os dias, aqui as vamos tendo todas, em todo o seu esplendor, demonstrando que também este Governo quer dirigir e fomentar a economia portuguesa com recursos públicos. Só que agora mudaram os destinatários das benesses. Agora queremos estimular as exportações, subsidiar o empreendedorismo e fomentar a indústria nacional. Porque o Ministro da Economia e Emprego assim decretou. Tal como decretaria um qualquer Ministro da Economia do PS.
O problema, porém, é que o dinheiro que os portugueses poupam e depositam nos bancos não é canalizado para a economia (para o investimento). Isto acontece porque os próprios bancos também estão a desalavancar, isto é, também eles estão em crise, têm que absorver as perdas que estão a sofrer com os empréstimos disparatados que fizeram ao mercado imobiliário. Portanto os bancos poupam todo o dinheiro que recebem das famílias - não o emprestam, ou então só o emprestam ao Estado, que é uma aplicação segura desse dinheiro já que podem depois ir ao BCE recuperá-lo e já que o dinheiro gasto em obrigações estatais não conta, por lei, para a determinação dos rácios de capital.
ResponderEliminarPortanto, há um problema real a resolver.
http://www.cousasliberaes.com/2012/11/ainda-os-certificados-de-desenvolvimento.html
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