O João Vasco, no Esquerda Republicana, escreveu um artigo a que chamou «Individualismo não é Egoísmo». Filipe Moura, autor do mesmo blogue, acusou nos comentários o João Vasco de «arrogância» por dizer que as pessoas cometiam «erros» e apontar aquilo que, na opinião dele, são os seus erros.
A minha experiência com o João Vasco, com quem já tive o prazer de debater em pessoa, é o de que o João Vasco não é arrogante. Seria arrogante se não partisse da posição de abertura com a qual me parece partir sempre para os debates: tem as suas convicções mas está aberto a revê-las com base em argumentação contrária que considere convincente. Ora, é desta posição de abertura intelectual que o João Vasco parte, o que me parece o oposto da arrogância.
Identificar aquilo que se considera ser erros no pensamento dos outros não significa que nos consideramos acima do erro. Não significa também que consideremos as outras pessoas estúpidas, imbecis, ignorantes ou idiotas. Significa simplesmente que não concordamos com essas pessoas de uma forma em que as posições são mutuamente exclusivas, ou consideramos que a posição em causa tem consequências nefastas que urge combater.
Eu não concordo com tudo o que o João Vasco diz e pensa. Penso que comete erros de diversa índole. Duvido que o João Vasco fique muito ofendido comigo por lhe dizer isto. Aliás, penso que o considerará uma afirmação trivial: ele sabe que é tão capaz de errar como qualquer outro ser humano. Sabe também que não é omnisciente e que as suas opiniões são tão subjectivas como as dos outros. Mas isso não lhe retira o direito de as defender de forma convicta e, quando identifica erros em pensamento alheio, apontá-los e explicar porque os considera erros.
Defender uma posição de forma convicta não é uma forma de arrogância. Dizer que as posições contrárias estão erradas e explicar porquê é a base do mais normal e banal dos debates. Uma cultura de debate implica desenvolver uma capacidade para lidar com a crítica, mesmo com a crítica mais agressiva, mesmo com a crítica mais directa, respondendo-lhe com contra-argumentos. Não é uma forma de arrogância achar que os outros estão errados e nós estamos certos na medida em que essa convicção seja fundada em argumentos válidos e sólidos e, principalmente, seja fundamentalmente transitória. Ou seja, a convicção poderá alterar-se em face de novos argumentos.
Impera em Portugal a cultura do «respeitinho». Por toda a gente, mas especialmente por autoridades. Ai de quem ouse pôr em causa o que diz uma autoridade qualquer sem ser ele próprio reconhecido como autoridade. Ao mesmo tempo, ai de quem ouse ter posições e defendê-las de forma convicta, não assumindo sempre que o resultado do debate tem de ser, no final, «concordamos em discordar». Aliás, já vi as coisas chegarem ao ponto em que basta argumentar em prol de uma posição contrária àquela que a outra pessoa defende para se ser acusado de «censura» e de querer mandar no que os outros pensam.
Há debates em que a posição no final vai ser «concordamos em discordar», e vão variar de pessoa para pessoa. Mas há outros em que não, e também vão variar de pessoa para pessoa. Há debates que a pessoa considera ser importantes. Há questões que a pessoa considera ser urgentes. Há erros que a pessoa considera levarem a consequências nefastas: no caso da confusão do individualismo com o egoísmo (tema do artigo do João Vasco), a possibilidade do aproveitamento dessa confusão para uma promoção da homogeneização da sociedade e submissão perante uma qualquer autoridade.
Uma cultura de debate é uma cultura de choque de ideias. É uma cultura em que se vai ler e ouvir coisas de que não se gosta. Mas é desse choque que emergem novas ideias e que as ideias se vão seleccionando. É nesse choque que consistem os debates vigorosos e dinâmicos que é importante ter. E eu prefiro que me digam que eu estou errado e me expliquem porquê, mesmo que eu não concorde, no âmbito de um debate em que a outra pessoa parte da posição de abertura intelectual que descrevi acima, do que uma cultura de «respeitinho», em que todos «concordamos em discordar» e não se chega a lado nenhum.
Os blogs e as redes sociais eliminaram o respeitinho e a autoridade. Hoje toda a gente comenta e escreve sobre futebol, política, economia e religião, sem ter passado pela academia do sporting ou ter um curso de ciência política, economia ou teologia.
ResponderEliminarBom post, muito bem escrito. Parabéns.
Obrigado.
EliminarNa mouche João!
ResponderEliminarO João Vasco é um tipo com quem se pode debater e quem se pode chegar a entendimentos razoáveis:)
Aliás, não esquecer o entricheiramento e os louvaminheiros que pululam por aí.
Eu que cheguei aos blogues pelo comentário e que gosto de ler os outros fico perplexo.
Como alguns "camaradas" de blogue num post "atacam" cordialmente as posições uns dos outros, depois se alguém de fora do blogue comenta entrincheiram-se.
Vê o que fizeram aqui uns tipos do cachimbo:
http://cachimbodemagritte.com/3579744.html#comentarios
Um a dizer que usei mal "totalitarismo" o que duvido, visto que até tive que ler algumas coisas de ciência política, ou
a meter-me na ordem por os tratar pelos apelidos...
Resposta à minha crítica: ZERO!
Fiquei triste com os tipos do cachimbo,acho que podemos estar a enganar as pessoas com o link deles aqui ao lado.
Que tal retirá-lo e pôr o do corta-fitas?
Aliás, é pela nossa irreverência e por nós não seguirmos as regras da louvaminhice,proselitismo de facebook e twitter, de solidariedade e respeitinho da blogosfera não há mais links para a nossa casa, apesar de já muitos nos lerem.
Têm miáufa.
É isso que respeito no João, dá a a cara e reconhece que erra quando é preciso
Não Basta ter um Blogue, é preciso ter Homens!
Eerm, confesso que não vi o totalitarismo no artigo que tu consideraste "totalitário", embora também prefira sistemas mais proporcionais. E tu foste corrigido por que te enganaste no nome - e foi simplesmente uma forma irónica de dizer que o teu comentário pouca substância tinha para merecer comentário maior que esse. (Mas não vou entrar no debate desse artigo aqui.)
EliminarQuanto aos «links» que nós temos ou deixamos de ter noutros blogues, eu fico agradecido por quem nos "linka", mas não estou a ver a que seja o motivo que tu apontas para nós termos menos "links" noutros lados do que desejaríamos, sinceramente. :) (Embora, claro, me pareça que o CL é um blogue independente, em que cada autor vai colocando as suas ideias, e se debatem os vários temas sem problemas.)
Como é que me enganei no nome?
ResponderEliminarAquela era uma resposta de Pedro Picoito editada por Paulo Marcelo a um texto anterior de Pedro Pestana Barros.
O tipo que me respondeu assinou PPB...
Pior eu tinha-o apoiado no texto anerior e ele na lógica do entrincheiramento saiu a terreiro a defender os "camaradas" de blogue, que de facto discordam dele.
Que não o posso tratar pelos apelidos...
Parece-me que há uma lógica totalitária, simplificando no sentido orwelliano. Há eleições, o sistema democrático não é representativo quanto baste, mas como os prejudicados são os outros está tudo bem.Como no Animal Farm, todos iguais, mas uns mais iguais do que outros.
Como são os outros está tudo bem, mas e so fôssemos nós os prejudicados?
Estamos numa Assembleia Popular ou a defender valores?
Rebati os 2 principais pontos com links, um de opinião, outro mais factual e o/os autores até tiveram que corrigir o texto com o valor correcto do bónus parlamentar grego foi um comentador a corrigir...
Que se põe a escrever sem mais que um conhecimento superficial das coisa e baseado no "acho que" diz tudo sobre si.
Nós no CL, temos muito maior abertura, frontalidade e fair-play.
Sobre os links isto tem a ver com as audiências e tal como na rádio as play-lists. Nós não trabalhamos para isso, nem com essa lógica.
Não é uma questão de ser bom ou de ser mau é a nossa opção.
Antes uma minoria forte do que uma maioria fraca.