domingo, 21 de outubro de 2012

A ausência de debate

Os temas surgem e desaparecem. Esfumam-se em dias. Figuras dedicam-se a mediaticamente dizer as mesmas coisas sobre esses temas. Não há dois lados da questão. Há um lado. O lado a que adere uma quantidade imensa de comentadores na comunicação social. E esse lado é passado à opinião pública, para absorção, como se de uma verdade absoluta se tratasse. Ou de sabedoria convencional. E o tema desaparece como tema relevante, podendo ser mais tarde ressuscitado se der jeito para a opinião mediática quase unânime seguinte.

Isto não é um debate, mas é o que temos. Além de explicados muito superficialmente e, muitas vezes, com erros, os temas não são abordados como se existissem diversas visões. Antes pelo contrário, alinham-se supostos especialistas e comentadores que, na prática, dizem todos o mesmo, com raras excepções. O tema não é debatido, os méritos ou falta deles de uma proposta não são discutidos. Um ponto de vista, tendencialmente histérico e de crítica destrutiva, é apresentado não como opinião, mas sim quase como facto - dado que como factos são tratadas as opiniões das «autoridades» e comentadores.

O pouco tempo dedicado a cada tema na praça pública, a sua simplificação e muitas vezes descaracterização e transmissão de uma narrativa única à opinião pública sobre o tema significam que não temos debates públicos de qualidade em Portugal. A não ser que uma pessoa esteja mesmo interessada e invista em investigar o tema para aprender sobre ele, aquilo a que tem direito é uma espécie de opinião pré-formatada de plástico, que pouco serve para desenvolver uma opinião pública informada e crítica.

Claro que nunca teremos debates perfeitos. Mas podíamos, pelo menos, ter verdadeiros debates. O unanimismo e a subserviência com que são tratadas as opiniões de «autoridades» são um problema grave e enfraquecem a democracia.

A democracia saudável faz-se de vigorosas trocas de ideias, de debates que têm de durar mais tempo que um ou dois dias na praça pública. Os vários lados não podem ser ouvidos num plano inclinado, em que uma opinião, quase unânime, é colocada sobre o pedestal das ideias feitas incontestáveis.

A democracia saudável cria os mecanismos necessários para lidar com diversas correntes de opinião de forma pacífica. Mecanismos esses que promovem a saudável troca de ideias e a emergência de verdadeiros debates públicos sobre os temas, e que incluem uma comunicação social capaz de trazer valor acrescentado a esses debates, mostrando os vários argumentos dos vários lados.

O unanimismo das ideias feitas gera bloqueios, especialmente em tempos de crise, e é facilmente utilizado para impedir mudanças - quaisquer que elas sejam - e considerar toda e qualquer mudança como impensável e/ou intolerável. O resultado é rigidez, muita rigidez e, no limite, uma pura e simples quebra. Porque a realidade não se compadece com unanimismos, e as soluções sem custos são ilusões.

5 comentários:

  1. Porquê este post? Por causa da compra da controloinveste por parte dos angolanos?
    Diz isso claramente, tu é que foste o homem do falar claro.
    PS: O Luis merece uma resposta pá, baza pôr o blogue de ferro-em-brasa:)
    Grande Abraço

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    1. Este post não tem rigorosamente nada a ver com a Controlinvest (aliás, não vejo sequer a relação entre uma coisa e outra)... Tem simplesmente a ver com a forma como eu vejo a maior parte dos debates a decorrer em Portugal.

      Quanto ao Luís, apesar do mote que ele deu ao artigo, eu concordo com o que ele diz.

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  2. Okappa! A relação por acaso até me parece evidente. Ao ter meios de comunicação que não se sabe quem os detém ou detidos por entidades de paises em que não existe liberdade de imprensa de facto, existe um empobrecimento do debate.
    PS: Sei bem que a malta é pacifica e pode esgrimir argumentos sem mal estar, estava sá a meter o veneno abraço:)

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  3. Eu acho que sendo claro que quem "financia" a imprensa pode ter influência sobre a sua (in)dependência editorial, também não embarco nas teorias catastrofistas à la Daniel Oliveira que têm implícito ou até mesmo explícito (já o li) um "atestado de estupidez" aos jornalistas em geral.

    PS: J'en sais Nélson :P Grande abraço.

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  4. Mas curiosamente o Daniel Oliveira e malta da sua área ideológica não se cansam de fazer precisamente as mesmas queixas que o João faz neste post.

    E têm todos razão...

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