sábado, 20 de outubro de 2012

The man's got a point


Só para fazer um bocadinho de oposição ao João e aliviar a má "vibe" de que o governante mais querido das feiras deste país tem sido alvo aqui no CL.

Ora disse Paulo Popular Partido Portas PP em resposta às profundas análises em resposta ao seu democrático comunicado em resposta à polémica sobre a aprovação do OE que “[e]m 22 países da [UE] há coligações. Em todas, o momento da negociação dos orçamentos é um momento complexo e difícil. Isso não é diferente numa coligação em Portugal.”

Se é verdade que houve vozes de figuras importantes no CDS a alvitrar barbaridades várias, inclusivamente a pedir, preto no branco, para que se desencadeasse uma «crise política», não o é menos que a suposta ou aparente crise da coligação governamental foi em grande medida alimentada e construída pela «CS». Tem sido, aliás, essa a tónica da larga maioria da imprensa que a coligação, nessa qualidade, tem recebido – desde 5 de Junho do ano passado que os ouvimos ver, prever, antever, profetizar, talvez sonhar com os problemas da coligação, desde diferenças ideológicas «irredutíveis» até estratégias escabrosas de vote-maximizing já a pensar nas eleições do porvir.

Aposto que se procurasse bem encontrava um artigo de 5 páginas de um qualquer jornal sobre as tensões na coligação com origem numa diferença irreparável quanto à cor a encomendar para as cápsulas do café para as reuniões de trabalho…

Se vos parece demasiado ridícula esta ideia atentem bem no que publicou o «i» no seu site com honras de comunicado oficial da direcção:

“O jornal i foi confrontado com o desmentido [via direito de resposta] do primeiro-ministro à manchete da edição de ontem, na qual se afirmava que, numa conversa a dois, Pedro Passos Coelho se dirigiu a Paulo Portas afirmando que «se o governo cair, o senhor será responsável por um segundo resgate». (…) [A]lém do descalabro das contas públicas, a austeridade sobre austeridade, o napalm fiscal, a incapacidade de conter a despesa, a desconjunção social, não levaram, portanto, a que o primeiro-ministro e o seu número três tenham tido o desaguisado que citámos. Muito bem. Folgamos com isso e tomamos boa nota como mensageiros habituados que estamos a ser os primeiros a sofrer por transportar a má notícia. Entramos em penitência que não em abstinência noticiosa. (…) Saudemos assim a harmonia que reina entre Pedro e Paulo. A bem da Nação!”

Outro exemplo, na notícia de onde se retira a citação de Portas supra: “«Se quisesse dizer que não concordo com o Orçamento dizia-lhe». Não disse, embora também não tenha dito o contrário.”

Parece quase existir uma verdadeira vontade de que a coligação se partisse já em mil e um bocadinhos, para que pudessem escrever reportagens award-winning sobre os pobres que levassem com eles na cabeça quando o orçamento fosse chumbado e chegassem novas eleições e um programa de ajuda financeira até 2078.

Claro que é fácil bater no «mensageiro» como diz o senhor do «i». No entanto, tenho para mim que esta sua tendência tem mais a ver com o importante ponto que refere Portas. Em Portugal não estamos habituados a ter coligações no governo – não é só a pobre da CS. Mesmo ignorando, claro, o período pós-revolucionário, as experiências de coligação que existiram não colheram durante muito tempo.

É natural que uma coligação governamental tenha muitos momentos de desacordo entre os dois partidos, é natural até mesmo que se parta uma ou outra peça de mobiliário de escritório, alguns dentes, eventualmente um baço perfurado, se não fosse assim seriam um só, mas porque tem isso de ser apenas mau? Tal como uma oposição forte é um factor positivo para a performance de um governo, também o equilíbrio entre dois ou mais partidos componentes pode acarretar importantes vantagens desse ponto de vista, não só, desde logo, pelo controlo mútuo que podem exercer, mas também para ajudar a que intervenientes com diferentes backgrounds, ideológicos, profissionais, etc., enriqueçam o debate interno no governo, bem como para que a sua legitimidade saia fortalecida por merecer o apoio de grupos de pessoas com preferências e necessidades diferentes e não só mais numerosos.

Não será, pois, por mero acaso que a norma na Europa democrática tenha vindo a ser a formação de governos de coligação – nem que o termo «coligação» seja uma das novas entradas do ελληνικό Λεξικό 2012.


Tempo no governo de partidos únicos
vs. coligações governamentais (%)
1945–99

 
Fonte: British Politics and Policy at LSE com dados Müller and Strøm, 2000

Já nós por cá reagimos assim ao seu aparecimento. Intriga, «feridas de morte», «paz podre», no fundo uma atitude de «este já foi, quem é o próximo?», ainda mal o touro foi largado na arena. Oxalá desta vez seja diferente e a coligação possa perdurar um pouco mais. Com todas as implicações que isso possa ter para a despesa na saúde.

Este tema foi bastante discutido na Europa aquando das últimas legislativas no Reino Unido, talvez Mr. Portas o queira reintroduzir no nosso espaço de debate público e dar qualquer coisa de mais interessante aos cronistas para comentar do que as declarações do José Manuel Fernandes ou o seu pomposo comunicado. Digo eu…

- Da banlieue parisienne

5 comentários:

  1. Muito Bom Luis:) Gosto da tua perspectiva e é bom acicatar a alma de quem vai cousando por aqui.
    Colocas bem o dedo na ferida, sobre se a "crise" foi real ou uma empolação dos média.
    O silêncio do João é comprometedor...
    Ele farta-de de falar na manipulação e de média acriticos.
    Obrigado pela referência do Muller e Strem.

    PS: Fico feliz que tires tempo da devassidão de Paris, para escrevinhares umas linhas para a malts aqui do rectângulo:)
    Aliás, dado os imagino agora cada vez mais raros e curtos momentos de sobreiedade de que desfrutas no teu "estudo" textos mais pequenos feitos quiçá no vai-vém e nos intervalos da actuação de coristas são muito bem-vindos!

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    1. A forma como o senhor Portas conduziu todo este processo, e tem conduzido todo este processo, foi ridícula - tal como foram os tweets e as mensagens de Facebook do Adolfo Mesquita Nunes e do João Almeida (já para não falar do José Manuel Fernandes). Mas, claro, o Luís também tem razão no que diz aqui.

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    2. Obrigado pelo comentário Nélson! Atenção que o mote para o artigo como disse o João foi apenas tongue-in-cheek, não é suposto ser nenhum desafio até porque partilho largamente da sua opinião relativamente à parvoíce que tem sido a forma como o PP tem lidado com a questão da coligação, no seio da qual acredito claro que tenha havido "festa grossa" (e que isso é normal) mas que em algum momento se pôs realmente a hipótese de crise política, para mal dos pecados de muitos.

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    3. E João o twitter e o facebook não interessariam nem se o Presidente da República...oh wait

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    4. Concordo com este post. A "crise" da coligação é antes de tudo, e sobretudo, uma crise que existe na cabeça dos comentadores mediáticos.

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