Passos Coelho vai convidar o PS a juntar-se ao PSD e ao CDS-PP naquilo a que eu chamaria um Pacto de Regime. Ao fim de mais de um ano de Governo, parece que vai começar, a sério, a ser discutida uma revisão de alto a baixo do Estado e das suas funções, incluindo uma possível revisão constitucional. A meu ver, se quisermos mesmo fazer uma revisão, então a Constituição vai necessariamente ter de ser alterada.
Para a Constituição ser alterada, 2/3 da Assembleia da República vai ter de acordar nas alterações. Como de BE, PCP e PEV não podemos esperar senão uma vontade de regressar ao PREC, restam PSD, CDS-PP e PS a forçosamente terem de entender-se relativamente a uma revisão de fundo da Constituição, no sentido de «refundar», não o Memorando da Troika, mas a própria República, repensando os poderes do Estado tendo em conta o novo contexto europeu e global em que Portugal se insere.
O Pacto de Regime tendente à criação de um programa de reestruturação do Estado é fundamental para uma consolidação orçamental bem feita. Apenas sabendo o que se quer e o que não se quer se podem fazer escolhas claras relativamente ao que cortar, ao que manter e ao que aumentar. Apenas assim poderemos reformular o nosso Estado e dar-lhe uma maior capacidade de se gerir a si próprio - e quem diz Estado, diz também o Poder Local, sendo a discussão sobre a reforma do Estado a altura perfeita para fazer também uma verdadeira reforma do Poder Local, no sentido de uma maior descentralização do poder político em Portugal.
Portugal, tal como a UE, encontra-se numa encruzilhada. Não é apenas o seu modelo de desenvolvimento económico que se encontra em crise. As suas instituições políticas também se encontram em crise, confrontadas com enorme desconfiança dos cidadãos. Temos um sistema político fechado e uma classe política também fechada sobre si mesma. A sociedade civil tem ainda pouca força, e devia ter muito mais. Os partidos políticos têm poucos incentivos a verdadeiramente ouvir quem está fora dos partidos. E os cidadãos sentem-se afastados da política e dos debates públicos que vamos tendo.
Ao mesmo tempo, a Constituição contém ainda um vasto conjunto de normas programáticas e económicas que, nunca tendo sido adequadas à realidade, ainda menos o são hoje em dia. Temos artigos sobre artigos que prevêem que o Estado seja responsável por tudo e mais alguma coisa, desde a garantia de casas com um conjunto alargado de características bem definido até ao desenvolvimento (por parte do Estado, note-se) de uma rede de centros de repouso e de férias. A sustentabilidade financeira do Estado, a justiça entre gerações, nada disto é particularmente relevado a nível constitucional, ao lado de temas tratados com a minúcia das abstracções.
Mais do que refundar um memorando de entendimento com credores internacionais, é fundamental debater a refundação da nossa República, do nosso Estado de Direito e da nossa Democracia em moldes mais razoáveis e adequados. É preciso repensar o Estado e ter um debate público alargado e sério sobre estes temas, que envolva a sociedade civil em geral, além dos partidos políticos. Um debate público que nunca se teve, verdadeiramente, em Portugal, tal como nunca se discutiu em Portugal, verdadeiramente, que «tendencialmente gratuito» não significa que os serviços públicos não sejam pagos com os nossos impostos (ou com dívida pública).
O debate terá lugar, sem dúvida, num plano inclinado. Quem defenda maior força para a sociedade civil e uma Constituição menos programática não vai ter vida fácil. No entanto, do novo consenso pode, apesar de tudo, surgir uma Constituição mais racional, mais preocupada em definir as bases do sistema e em deixar espaço para diferentes propostas de modelo de desenvolvimento que em definir tudo à mais absoluta minudência. Isso será possível se PSD, CDS-PP e PS conseguirem, em conjunto, decidir que está na altura de, de facto, mudarmos a nossa Constituição. Em particular, se o PS decidir que quer ser um partido responsável da Esquerda moderna ou se quer abraçar, demagogicamente, aos amanhãs que cantam de 1976.
Esta crise é o momento de discutirmos seriamente que Estado queremos. O Estado que temos está essencialmente insolvente, e é o momento de definir qual o seu futuro. Chegou o momento de abrir a nossa Economia e o nosso Sistema Político. De reforçar o poder do Parlamento. De descentralizar e reforçar a autonomia e a responsabilidade perante os eleitores do Poder Local.
Não, o resultado das discussões entre o PSD, o CDS-PP e o PS, se existirem, não vai ser a minha Constituição ideal. Mas eu não espero uma Constituição ideal. Espero uma Constituição melhor que temos, mais desempoeirada, e mais adequada aos novos tempos. E isso sim, é possível. Assim os três principais partidos, pressionados pela sociedade civil, decidam aproveitar a oportunidade e agir de forma responsável.
Tenho muito medo destes neologismos, no final a montanha parirá um rato.
ResponderEliminarchegou o momento de afundar, de vez, este nosso país. acabemos com a constituição, entregue-mos aos mercados o direito de escolher o que será o melhor para este país. liberalize-se tudo, acabe-se com o estado social!
ResponderEliminarviva o mercado!
Há uns tempos iria rebater o que dizes, agora acho que estás acerto apesar da ironia.
EliminarEstá-se a destruir a classe média suposta base de apoio da coligação e em poucos anos teremos uma conjuntura soscial parecida a um pais sul-americano.
Depois por cá não há liberalização, mas sim privatização de monopólios e conúbios pouco claros.
Abraço
Onde é que assino?
ResponderEliminarNão é uma panaceia mas é um momento importante para se fazer o tal debate importante, e caramba, se ela precisa de uma dieta!