"Deve haver um dia em que a sociedade, como os indivíduos, chegue à maioridade." - Alexandre Herculano
sábado, 30 de junho de 2012
EMPREGO OU TRABALHO?
Hoje há uma manifestação do movimento dos sem emprego.
Se encontrarem um emprego avisem para eu enviar o cv!
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sexta-feira, 29 de junho de 2012
Força da Finlândia através de Beirute!
QUANDO JÁ NÃO SE TEM FORÇAS!
quando já não se tem forças para escrever,
há que recordar.
quando já não se tem forças para fotografar,
há que ver com os olhos da alma.
quando já não se tem forças para ler,
tem que se estar pleno de narrações.
quando já não se tem forças para falar,
há que ressonar.
quando já não se tem forças para andar,
há que voar.
e quando chegar a hora,
alguém tem de se ver livre das recordações,
dos olhos da alma, deixar de sonhar,
calar-se e dobrar as asas.
mas aconteça o que acontecer,
segue a narração, segue.
Eeva Kilpi
tradução de Pedro Calouste
Surripiado daqui. Sylvia Beirute é fantástica!
Um poema de da Finlandesa Eeva Kilpi, para encorajar os líderes europeus neste fim-de-semana!
PS: o Blogger é execrável! Desformata todo o texto...
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quinta-feira, 28 de junho de 2012
Cousas, Angola e Alentejo
O Cousas tem uma ligação, no "Crónicas de Além Tejo" de André Miguel.
Um alentejano, que está por Angola.Costumo passar por lá de vez em quando e nem tinha reparado...
Gosto de passar por lá, tem boas análises da actualidade, boas recomendações de bom vinho e onde comer por terras do Alentejo e algumas noticías da agora "sua" Angola.
Um Obrigado e um Abraço
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terça-feira, 26 de junho de 2012
Reforma do Sistema Fiscal
O sistema fiscal português tem duas características: é complexo e muda constantemente. Acrescente-se a estas duas características o facto de, quando se coloca uma dúvida à Administração Tributária, esta demorar vários anos a responder, e temos problemas para os cidadãos e para as empresas.
A complexidade do sistema fiscal cria vários problemas. Um deles é o incentivo à evasão fiscal. O outro é que a existência de várias isenções e outros benefícios causa erosão na base tributária, o que leva tendencialmente a que o valor das taxas aumente.
Cria ainda um problema de aplicação, na medida em que a aplicação de um sistema complexo de impostos a milhões de pessoas gera mais erros e questões do que a aplicação de um sistema mais simples. O resultado são processos em tribunal que demoram anos (a ver se a arbitragem fiscal ajuda alguma coisa neste contexto), bem como dúvidas dos contribuintes que demoram anos a ser respondidas.
O facto do sistema mudar constantemente apenas ajuda a aumentar o nível de incerteza, o que o torna até potencialmente mais problemático que a complexidade do sistema. É que se um sistema complexo permanece estável, a sua aplicação vai-se tornando rotineira, as interpretações estabilizam, e o sistema, apesar de provavelmente poder ser depurado, começa a funcionar.
As constantes alterações significam que se está constantemente a ter de rever procedimentos. Significam também mais dúvidas dos contribuintes, que por sua vez vão demorar anos a ser respondidas - ao mesmo tempo que novas mudanças entram em vigor, o que serve para aumentar sobremaneira a confusão.
Tudo isto gera custos, quer para as entidades privadas, quer para o próprio Estado, que servem para tornar a nossa economia menos competitiva.
Em 2009, surgiu um relatório de mais de 800 páginas sobre reforma do sistema fiscal. Não sei até que ponto as propostas do relatório saíram do papel. Tendo em conta tudo o que se passou desde 2009 até hoje, incluindo alterações ao sistema fiscal, além do exacerbar da crise económica e financeira, não sei até que ponto as propostas que não foram implementadas se mantêm actuais.
E isto leva-me ao meu ponto final: mais importante do que fazer relatórios de mais de 800 páginas que depois são difíceis de ler e de debater, é preciso pensar como simplificar o nosso sistema fiscal, tornando-se de mais fácil aplicação para Estado e para privados. Depois, é preciso fazer uma grande reforma que implemente as alterações decididas. Finalmente, é preciso deixar a reforma assentar, não voltando à habitual sucessão de reformas a cada Orçamento do Estado.
Isto significa um debate alargado sobre o sistema fiscal português, mas também um debate alargado sobre o sistema fiscal europeu. As reformas ao nosso sistema fiscal não podem ignorar o contexto europeu, nem o próprio contexto global. E têm, reitere-se, de ser feitas para durar. Para que possamos ter um sistema fiscal simples e estável, que atraia investimento e ajude a promover o desenvolvimento do país.
Votai "Portugal não deve dar o calote"!
Como o nosso João costuma dizer há que tomar posição!
Só agora tomei conhecimento que está a decorrer um frente-a-frente, entre Ricardo Cabral e Pedro Rodrigues, dois académicos emergentes no blogue massamonetária do Jornal de Negócios.
À pergunta é "Deve Portugal Reestruturar a sua Divida Pública"
Sim ou Não!
A minha resposta é Não!
Porquê?
Seria tornar inglório todo o esforço que já fizémos e porque no Póker há que esperar para fazer call ao bluff dos outros.
Tem sido um bom debate, elevado embora por vezes um pouco técnico.
Uma palavra de apreço para os dois intervenientes, por num País cinzento, tomarem o caminho mais pisado e assumirem posições, que quer a um quer a outro lhes poderão trazer desgostos no futuro.
Agora puxando a brasa á minha sardinha.
O Professor Pedro Rodrigues, tem um draft aqui em que fundamenta a sua análise, com cabeça tronco e membros.
Vamos a Votar!
E claro que sem qualquer pressão que coarte as liberdade dos leitores, digo:
Votai Não!
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segunda-feira, 25 de junho de 2012
Ecce gladiatorem libertatem!
OH, Gladiadores da Liberdade!
Sobre os ombros de gigantes,
Pequenos ou Grandes, mas todos Importantes!
É uma Honra caminhar, em Fraternidade!
sábado, 23 de junho de 2012
Reforma Institucional e União Europeia
Enquanto nós andamos a discutir planos para gastar 120 ou 130 mil milhões de euros em infraestruturas a nível europeu para combater o desemprego no curto prazo, não estamos a discutir um documento que surgiu recentemente e que merece discussão séria e aprofundada, devido às implicações que tem.
(Aqui vai um «link» para o documento - está em inglês.)
Neste documento estão destilados os resultados de discussões entre dez Ministros dos Negócios Estrangeiros (Áustria, Bélgica, Dinamarca, Itália, Alemanha, Luxemburgo, Países Baixos, Polónia, Portugal e Espanha) e fala de integração financeira, de estabilidade orçamental e de reforma institucional na União Europeia. Sendo que, relativamente à reforma institucional, se coloca a hipótese de forças armadas europeias, um Presidente da Comissão eleito, conferir ao Parlamento Europeu um poder de iniciativa legislativa, bem como a criação de uma secunda câmara parlamentar para representação estadual (imagino que em substituição dos Conselhos Europeu e da União Europeia).
As implicações das reformas mesmo de médio prazo que são levantadas como hipótese no documento são muito relevantes. Fala-se mesmo em integração relativa a legislação laboral ou de segurança social, por exemplo. Fala-se em união económica para acompanhar a união monetária e fala-se, como já referi, em propostas que são, essencialmente, a criação de uma federação política europeia. E todas estas reformas teriam, se implementadas, um impacto bem mais relevante para o futuro da União Europeia do que os programas de investimentos públicos que se andam a discutir. Isto porque lidariam com problemas institucionais sistémicos que têm sido importantes na crise que vivemos.
Outro tema a discutir, como forma de promover o crescimento económico, é a criação de um verdadeiro mercado livre europeu de serviços. Neste momento, a directiva que trata desse tema tem demasiadas excepções e demasiados «buracos». Apesar de garantida pelos tratados, a liberdade de circulação de serviços ainda não é a realidade que devia ser. E isso ajudaria a criar crescimento económica na União Europeia, além de promover interacção entre os cidadãos europeus, o que significa também a promoção do estabelecimento de relações transnacionais - e são as relações que se vão estabelecendo, numa situação de interdependência, que fortalecem a cidadania europeia (que deveria ser também reforçada em termos políticos).
O futuro da União Europeia passa, também ele, por um debate sobre reforma estruturais. Os programas de investimento público para combater a crise não resolvem os problemas estruturais que a União Europeia de um ponto de vista institucional e mesmo económico. E são esses problemas que, mais do que tudo, nos afectam. Os estímulos públicos não os resolvem (não vou entrar aqui na questão de se resolvem ou não o que quer que seja). Mas é na resolução desses problemas que se joga, verdadeiramente, o futuro da União Europeia. É preciso, portanto, começar a discuti-los de forma aberta e alargada.
(Aqui vai um «link» para o documento - está em inglês.)
Neste documento estão destilados os resultados de discussões entre dez Ministros dos Negócios Estrangeiros (Áustria, Bélgica, Dinamarca, Itália, Alemanha, Luxemburgo, Países Baixos, Polónia, Portugal e Espanha) e fala de integração financeira, de estabilidade orçamental e de reforma institucional na União Europeia. Sendo que, relativamente à reforma institucional, se coloca a hipótese de forças armadas europeias, um Presidente da Comissão eleito, conferir ao Parlamento Europeu um poder de iniciativa legislativa, bem como a criação de uma secunda câmara parlamentar para representação estadual (imagino que em substituição dos Conselhos Europeu e da União Europeia).
As implicações das reformas mesmo de médio prazo que são levantadas como hipótese no documento são muito relevantes. Fala-se mesmo em integração relativa a legislação laboral ou de segurança social, por exemplo. Fala-se em união económica para acompanhar a união monetária e fala-se, como já referi, em propostas que são, essencialmente, a criação de uma federação política europeia. E todas estas reformas teriam, se implementadas, um impacto bem mais relevante para o futuro da União Europeia do que os programas de investimentos públicos que se andam a discutir. Isto porque lidariam com problemas institucionais sistémicos que têm sido importantes na crise que vivemos.
Outro tema a discutir, como forma de promover o crescimento económico, é a criação de um verdadeiro mercado livre europeu de serviços. Neste momento, a directiva que trata desse tema tem demasiadas excepções e demasiados «buracos». Apesar de garantida pelos tratados, a liberdade de circulação de serviços ainda não é a realidade que devia ser. E isso ajudaria a criar crescimento económica na União Europeia, além de promover interacção entre os cidadãos europeus, o que significa também a promoção do estabelecimento de relações transnacionais - e são as relações que se vão estabelecendo, numa situação de interdependência, que fortalecem a cidadania europeia (que deveria ser também reforçada em termos políticos).
O futuro da União Europeia passa, também ele, por um debate sobre reforma estruturais. Os programas de investimento público para combater a crise não resolvem os problemas estruturais que a União Europeia de um ponto de vista institucional e mesmo económico. E são esses problemas que, mais do que tudo, nos afectam. Os estímulos públicos não os resolvem (não vou entrar aqui na questão de se resolvem ou não o que quer que seja). Mas é na resolução desses problemas que se joga, verdadeiramente, o futuro da União Europeia. É preciso, portanto, começar a discuti-los de forma aberta e alargada.
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sexta-feira, 22 de junho de 2012
PoliticsUK
O PoliticsUK é uma simulação de política britânica jogado num fórum. A simulação está a simular o seu décimo aniversário e está agora a lançar um blogue, para o qual eu vou escrever, na medida do que conseguir.
O blogue está aqui, para quem tenha interesse.
O blogue está aqui, para quem tenha interesse.
quarta-feira, 20 de junho de 2012
Arrogância, Humildade e Respeitinho
O João Vasco, no Esquerda Republicana, escreveu um artigo a que chamou «Individualismo não é Egoísmo». Filipe Moura, autor do mesmo blogue, acusou nos comentários o João Vasco de «arrogância» por dizer que as pessoas cometiam «erros» e apontar aquilo que, na opinião dele, são os seus erros.
A minha experiência com o João Vasco, com quem já tive o prazer de debater em pessoa, é o de que o João Vasco não é arrogante. Seria arrogante se não partisse da posição de abertura com a qual me parece partir sempre para os debates: tem as suas convicções mas está aberto a revê-las com base em argumentação contrária que considere convincente. Ora, é desta posição de abertura intelectual que o João Vasco parte, o que me parece o oposto da arrogância.
Identificar aquilo que se considera ser erros no pensamento dos outros não significa que nos consideramos acima do erro. Não significa também que consideremos as outras pessoas estúpidas, imbecis, ignorantes ou idiotas. Significa simplesmente que não concordamos com essas pessoas de uma forma em que as posições são mutuamente exclusivas, ou consideramos que a posição em causa tem consequências nefastas que urge combater.
Eu não concordo com tudo o que o João Vasco diz e pensa. Penso que comete erros de diversa índole. Duvido que o João Vasco fique muito ofendido comigo por lhe dizer isto. Aliás, penso que o considerará uma afirmação trivial: ele sabe que é tão capaz de errar como qualquer outro ser humano. Sabe também que não é omnisciente e que as suas opiniões são tão subjectivas como as dos outros. Mas isso não lhe retira o direito de as defender de forma convicta e, quando identifica erros em pensamento alheio, apontá-los e explicar porque os considera erros.
Defender uma posição de forma convicta não é uma forma de arrogância. Dizer que as posições contrárias estão erradas e explicar porquê é a base do mais normal e banal dos debates. Uma cultura de debate implica desenvolver uma capacidade para lidar com a crítica, mesmo com a crítica mais agressiva, mesmo com a crítica mais directa, respondendo-lhe com contra-argumentos. Não é uma forma de arrogância achar que os outros estão errados e nós estamos certos na medida em que essa convicção seja fundada em argumentos válidos e sólidos e, principalmente, seja fundamentalmente transitória. Ou seja, a convicção poderá alterar-se em face de novos argumentos.
Impera em Portugal a cultura do «respeitinho». Por toda a gente, mas especialmente por autoridades. Ai de quem ouse pôr em causa o que diz uma autoridade qualquer sem ser ele próprio reconhecido como autoridade. Ao mesmo tempo, ai de quem ouse ter posições e defendê-las de forma convicta, não assumindo sempre que o resultado do debate tem de ser, no final, «concordamos em discordar». Aliás, já vi as coisas chegarem ao ponto em que basta argumentar em prol de uma posição contrária àquela que a outra pessoa defende para se ser acusado de «censura» e de querer mandar no que os outros pensam.
Há debates em que a posição no final vai ser «concordamos em discordar», e vão variar de pessoa para pessoa. Mas há outros em que não, e também vão variar de pessoa para pessoa. Há debates que a pessoa considera ser importantes. Há questões que a pessoa considera ser urgentes. Há erros que a pessoa considera levarem a consequências nefastas: no caso da confusão do individualismo com o egoísmo (tema do artigo do João Vasco), a possibilidade do aproveitamento dessa confusão para uma promoção da homogeneização da sociedade e submissão perante uma qualquer autoridade.
Uma cultura de debate é uma cultura de choque de ideias. É uma cultura em que se vai ler e ouvir coisas de que não se gosta. Mas é desse choque que emergem novas ideias e que as ideias se vão seleccionando. É nesse choque que consistem os debates vigorosos e dinâmicos que é importante ter. E eu prefiro que me digam que eu estou errado e me expliquem porquê, mesmo que eu não concorde, no âmbito de um debate em que a outra pessoa parte da posição de abertura intelectual que descrevi acima, do que uma cultura de «respeitinho», em que todos «concordamos em discordar» e não se chega a lado nenhum.
A minha experiência com o João Vasco, com quem já tive o prazer de debater em pessoa, é o de que o João Vasco não é arrogante. Seria arrogante se não partisse da posição de abertura com a qual me parece partir sempre para os debates: tem as suas convicções mas está aberto a revê-las com base em argumentação contrária que considere convincente. Ora, é desta posição de abertura intelectual que o João Vasco parte, o que me parece o oposto da arrogância.
Identificar aquilo que se considera ser erros no pensamento dos outros não significa que nos consideramos acima do erro. Não significa também que consideremos as outras pessoas estúpidas, imbecis, ignorantes ou idiotas. Significa simplesmente que não concordamos com essas pessoas de uma forma em que as posições são mutuamente exclusivas, ou consideramos que a posição em causa tem consequências nefastas que urge combater.
Eu não concordo com tudo o que o João Vasco diz e pensa. Penso que comete erros de diversa índole. Duvido que o João Vasco fique muito ofendido comigo por lhe dizer isto. Aliás, penso que o considerará uma afirmação trivial: ele sabe que é tão capaz de errar como qualquer outro ser humano. Sabe também que não é omnisciente e que as suas opiniões são tão subjectivas como as dos outros. Mas isso não lhe retira o direito de as defender de forma convicta e, quando identifica erros em pensamento alheio, apontá-los e explicar porque os considera erros.
Defender uma posição de forma convicta não é uma forma de arrogância. Dizer que as posições contrárias estão erradas e explicar porquê é a base do mais normal e banal dos debates. Uma cultura de debate implica desenvolver uma capacidade para lidar com a crítica, mesmo com a crítica mais agressiva, mesmo com a crítica mais directa, respondendo-lhe com contra-argumentos. Não é uma forma de arrogância achar que os outros estão errados e nós estamos certos na medida em que essa convicção seja fundada em argumentos válidos e sólidos e, principalmente, seja fundamentalmente transitória. Ou seja, a convicção poderá alterar-se em face de novos argumentos.
Impera em Portugal a cultura do «respeitinho». Por toda a gente, mas especialmente por autoridades. Ai de quem ouse pôr em causa o que diz uma autoridade qualquer sem ser ele próprio reconhecido como autoridade. Ao mesmo tempo, ai de quem ouse ter posições e defendê-las de forma convicta, não assumindo sempre que o resultado do debate tem de ser, no final, «concordamos em discordar». Aliás, já vi as coisas chegarem ao ponto em que basta argumentar em prol de uma posição contrária àquela que a outra pessoa defende para se ser acusado de «censura» e de querer mandar no que os outros pensam.
Há debates em que a posição no final vai ser «concordamos em discordar», e vão variar de pessoa para pessoa. Mas há outros em que não, e também vão variar de pessoa para pessoa. Há debates que a pessoa considera ser importantes. Há questões que a pessoa considera ser urgentes. Há erros que a pessoa considera levarem a consequências nefastas: no caso da confusão do individualismo com o egoísmo (tema do artigo do João Vasco), a possibilidade do aproveitamento dessa confusão para uma promoção da homogeneização da sociedade e submissão perante uma qualquer autoridade.
Uma cultura de debate é uma cultura de choque de ideias. É uma cultura em que se vai ler e ouvir coisas de que não se gosta. Mas é desse choque que emergem novas ideias e que as ideias se vão seleccionando. É nesse choque que consistem os debates vigorosos e dinâmicos que é importante ter. E eu prefiro que me digam que eu estou errado e me expliquem porquê, mesmo que eu não concorde, no âmbito de um debate em que a outra pessoa parte da posição de abertura intelectual que descrevi acima, do que uma cultura de «respeitinho», em que todos «concordamos em discordar» e não se chega a lado nenhum.
Não há Tertúlia Federal, que tal o IT Future 2012?
Com muita pena nossa, haverá alteração de Programação,
Não haverá tertúlia amanhã na Lx Factory à noitinha.
Que tal, para todos aqueles, que puderem pela fresquinha.
Para quem fôr audaz, um grande Cartaz, próximo da Estação.
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terça-feira, 19 de junho de 2012
FFMS: Liberdade de Escolha no Ensino para Todos: Sim ou Não?
A Fundação Francisco Manuel dos Santos promove novo debate «online», sobre o tema referido no título.
Deixo a intervenção inicial de Vasco Barreto e «link» para o debate!
«Se a Educação é o melhor passaporte para a mobilidade social e a liberdade um valor que prezamos, não é evidente que todos pais devem ter liberdade de escolher como e onde querem educar os seus filhos, independentemente do seu nível económico? Esta discussão tornou-se sazonal com a divulgação das classificações dos estabelecimentos de ensino secundário e tem subido de tom, primeiro a propósito dos cortes estatais nos contratos de associação que financiam as escolas privadas e, mais recentemente, com a anunciada intenção do actual Governo de que terminará a obrigação de escolher a escola por área de residência.
Até que ponto a visão de cada um não reflecte os seus interesses concretos no assunto (no caso de ser pai, nomeadamente), que podem não ser os da sociedade? E será que, mesmo sem um interesse concreto e imediato como pai, aluno ou professor, temos discutido o problema de um modo descomprometido, isto é, sem papaguear a cartilha da defesa intransigente do modelo vigente da escola pública, tão caro à esquerda, e também sem um alinhamento às cegas com a direita e os movimentos cívicos de inspiração liberal que defendem a liberdade de escolha? Até que ponto este acantonamento ideológico nos impede de lidar com um problema que, pondo em conflito os valores da igualdade e da liberdade, talvez só admita uma solução de compromisso? Qual seria então a melhor alternativa para tornar obsoleto o expediente das moradas fictícias, mas evitando a segregação social que muitos temem ser inevitável num sistema absolutamente liberalizado, em que aos pais é dada a ilusão de escolha e as escolas, na prática, seleccionam? Podemos aprender com as experiências de outros países?
Ao longo desta semana, iremos abordar estas e outras questões com o painel de convidados e todos os interessados no tema. Alexandre Homem Cristo, Paulo Guinote, David Justino e Hugo Mendes têm percursos diversos mas um denominador comum: são académicos que pensam, escrevem e discutem o sistema de ensino com a preocupação de encontrar evidência empírica que sustente as suas posições. O que peço a cada um, no arranque deste debate, é um exercício de imaginação, para que quem nunca vos leu conheça a vossa posição mais inconfessável sobre o assunto: que descrevam sucintamente o sistema de ensino ideal para Portugal, sem receio de parecerem utópicos.»
Deixo a intervenção inicial de Vasco Barreto e «link» para o debate!
«Se a Educação é o melhor passaporte para a mobilidade social e a liberdade um valor que prezamos, não é evidente que todos pais devem ter liberdade de escolher como e onde querem educar os seus filhos, independentemente do seu nível económico? Esta discussão tornou-se sazonal com a divulgação das classificações dos estabelecimentos de ensino secundário e tem subido de tom, primeiro a propósito dos cortes estatais nos contratos de associação que financiam as escolas privadas e, mais recentemente, com a anunciada intenção do actual Governo de que terminará a obrigação de escolher a escola por área de residência.
Até que ponto a visão de cada um não reflecte os seus interesses concretos no assunto (no caso de ser pai, nomeadamente), que podem não ser os da sociedade? E será que, mesmo sem um interesse concreto e imediato como pai, aluno ou professor, temos discutido o problema de um modo descomprometido, isto é, sem papaguear a cartilha da defesa intransigente do modelo vigente da escola pública, tão caro à esquerda, e também sem um alinhamento às cegas com a direita e os movimentos cívicos de inspiração liberal que defendem a liberdade de escolha? Até que ponto este acantonamento ideológico nos impede de lidar com um problema que, pondo em conflito os valores da igualdade e da liberdade, talvez só admita uma solução de compromisso? Qual seria então a melhor alternativa para tornar obsoleto o expediente das moradas fictícias, mas evitando a segregação social que muitos temem ser inevitável num sistema absolutamente liberalizado, em que aos pais é dada a ilusão de escolha e as escolas, na prática, seleccionam? Podemos aprender com as experiências de outros países?
Ao longo desta semana, iremos abordar estas e outras questões com o painel de convidados e todos os interessados no tema. Alexandre Homem Cristo, Paulo Guinote, David Justino e Hugo Mendes têm percursos diversos mas um denominador comum: são académicos que pensam, escrevem e discutem o sistema de ensino com a preocupação de encontrar evidência empírica que sustente as suas posições. O que peço a cada um, no arranque deste debate, é um exercício de imaginação, para que quem nunca vos leu conheça a vossa posição mais inconfessável sobre o assunto: que descrevam sucintamente o sistema de ensino ideal para Portugal, sem receio de parecerem utópicos.»
segunda-feira, 18 de junho de 2012
Tertúlia: Como podemos chegar a uma Europa federal
Jantares/Tertúlia na Ler Devagar (Lx Factory)
Tertúlias da Primavera (2012)
Este ciclo reúne um conjunto de pessoas que, em diversas áreas, se têm debruçado, em livros, estudos ou na imprensa, sobre alguns problemas estruturais da sociedade portuguesa. Partilham alguns valores essenciais: Portugal necessita de mais liberdade, mais transparência, mais responsabilidade, mais ética individual, mais deliberação pública, mais cidadania. Ler mais aqui…
A próxima tertúlia da Primavera do Ciclo Dobrando o Tempo, Dobrando uma Esquina será a seguinte:
JULHO 6 ÁS 21 Horas (NOVA DATA)
Como podemos chegar a uma Europa Federal?
Apresentação: Viriato Soromenho Marques
Professor da Faculdade de Letras. Filósofo. O seu último livro pela Esfera do Caos em 2011 intitula-se Tópicos de Filosofia e Ciência Política. Federalismo. Das Raízes Americanas aos Dilemas Europeus. Saiba mais aqui...
Discussão: Rui Tavares e
Paulo Trigo Pereira
Como de costume após as intervenções iniciais inicia-se o debate aberto. A sessão termina às 23h30.
Por razões logísticas se pretender vir à tertúlia inscreva-se (opcional mas ajuda e fica na mailing list) inscreva-se aqui…
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Esperamos por si na Ler Devagar, com espírito aberto, crítico e dialogante. Para localização ver aqui…
Organização:
Paulo Trigo Pereira e João Wengorovius Meneses
E Apoios de : Ler Devagar. Luis Teles Morais, Paulo Pereira e João Pedro Castro Mendes
domingo, 17 de junho de 2012
Moção de censura, eleições na França e na Grécia
1. A moção de censura do PCP não serve para deitar abaixo o Governo, que dispõe de maioria sólida no Parlamento. A moção de censura é uma forma de conseguir cobertura mediática e surgir na comunicação social num contexto em que a CDU e o BE aparecem com 9% nas sondagens e o PS não "dispara" nas sondagens. A moção de censura do PCP serve para marcar posição à esquerda. O BE poderá ou não aderir, e o PS será «colado» à austeridade «de direita» por não votar a favor.
2. A maioria absoluta do Partido Socialista em França vem acompanhada de uma proposta de um enorme programa de investimento público infra-estrutural (120 mil milhões de euros) a nível europeu da parte de François Hollande. Porque, como se sabe, a União Europeia tem falta de infra-estruturas. E os problemas do desemprego jovem a nível europeu são de alguma forma resolvidos criando empregos de curto prazo em projectos provavelmente financiados com «project bonds» (leia-se, «dívida mutualizada para aqueles projectos»). O investimento público em biotecnologia - despejar dinheiro público num sector não é o mesmo que ter um sector sustentável, inovador e competitivo. Mais importantes seriam propostas de criação de uma verdadeira democracia transnacional, federal, a nível europeu - isso sim, seria uma verdadeira pedrada no charco.
3. A vitória da Nova Democracia na Grécia não me deixa felicíssimo (já aqui deixei a minha opinião sobre a Nova Democracia), mas apesar de tudo é preferível a uma vitória do Syriza. Infelizmente, já temos teatro: o PASOK quer um governo de unidade nacional que inclua Syriza (que já disse que iria ser Oposição) e o Esquerda Democrática (Dimar). Ou o PASOK deixa cair a ideia de que o Syriza tem de estar no Governo e aceita uma coligação ND-PASOK-Dimar, ou então ainda acabamos com um Governo de minoria do Nova Democracia na Grécia. Com todas as consequências negativas, e riscos, que um Governo de minoria num contexto de crise poderá ter. Mas agora, é preciso esperar por novos desenvolvimentos. Amanhã é um novo dia. Amanhã saberemos mais.
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Cinco curtas num início de tarde
1. A infantilização e a vitimização ajudam tanto como nada. Mas parecem ser a forma como alguns políticos gostam de tratar pessoas (infantilização) e a si próprios (vitimização). A culpa é sempre dos outros, quando não morra pura e simplesmente solteira, e o que importa é encontrar os "bons" e os "maus" para que no fim os "bons" possam "ganhar". Tipo filme de Hollywood do mais açucarado possível.
2. Não há só treinadores de bancada no futebol. Há também em política. Basta ver a quantidade de gente que parece achar que resolveria todos os problemas de Portugal, da Europa e do Mundo em três tempos, com um conjunto de ideias simples e milagrosas. Na realidade, é tudo muito simples: basta que toda a gente no mundo veja como essas pessoas têm (obviamente) razão, e o mundo seria, naturalmente, muito melhor.
3. A Economia não se resume a questões de produção e ao PIB. A Felicidade Interna Bruta não transcende a forma «económica» de ver o progresso e o bem-estar. Não há uma separação estanque entre «custos sociais», «custos ambientais» e «custos económicos». O PIB sempre foi uma aproximação àquilo que se considera "bem-estar", na medida em que é algo que é mensurável. Agora, estamos a tentar arranjar forma de medir outras coisas (há quem considere que é impossível) e inclui-las na análise, o que não torna a análise menos económica.
4. Eu gosto de filmes. Gosto de poesia e de prosa. Gosto de artes plásticas. Gosto de música. Sou, até, bastante ecléctico nos meus gostos. Penso também que todos os tipos de filmes, de literatura e de música são manifestações culturais. Mas também o são o futebol, o andebol ou o hóquei em patins. Também o são as touradas (que eu, pessoalmente, abomino) ou cerimónias de matança do porco (que também considero horríveis). Também o são um sem número de cerimónias religiosas e de festas populares. Nada disso significa que estas actividades devam ser subsidiadas. E principalmente, nada disto significa que as actividades que um conjunto de auto-proclamadas elites considerem como a melhor "cultura" devam ser subsidiadas.
5. Nem todas as formas de integração europeia são federalistas. Uma UE federal não significa o puro e simples fim dos Estados Membros, subsumidos num mega-Estado unitário europeu. Uma UE federal não significa também menos democracia; aliás, antes pelo contrário. Uma UE federal significa criar uma democracia transnacional, de forma a que existam instituições formais com maior legitimidade democrática que permitam lidar com questões com as quais não é possível lidar apenas ao nível dos Estados Membros. Tem de existir uma clara divisão de competências e tem de ser garantido um nível razoável de autonomia aos Estados-Membros. Tem de ser reforçada a cidadania europeia. E é neste sentido que eu gostava de ver a UE evoluir - daí considerar-me federalista europeu.
2. Não há só treinadores de bancada no futebol. Há também em política. Basta ver a quantidade de gente que parece achar que resolveria todos os problemas de Portugal, da Europa e do Mundo em três tempos, com um conjunto de ideias simples e milagrosas. Na realidade, é tudo muito simples: basta que toda a gente no mundo veja como essas pessoas têm (obviamente) razão, e o mundo seria, naturalmente, muito melhor.
3. A Economia não se resume a questões de produção e ao PIB. A Felicidade Interna Bruta não transcende a forma «económica» de ver o progresso e o bem-estar. Não há uma separação estanque entre «custos sociais», «custos ambientais» e «custos económicos». O PIB sempre foi uma aproximação àquilo que se considera "bem-estar", na medida em que é algo que é mensurável. Agora, estamos a tentar arranjar forma de medir outras coisas (há quem considere que é impossível) e inclui-las na análise, o que não torna a análise menos económica.
4. Eu gosto de filmes. Gosto de poesia e de prosa. Gosto de artes plásticas. Gosto de música. Sou, até, bastante ecléctico nos meus gostos. Penso também que todos os tipos de filmes, de literatura e de música são manifestações culturais. Mas também o são o futebol, o andebol ou o hóquei em patins. Também o são as touradas (que eu, pessoalmente, abomino) ou cerimónias de matança do porco (que também considero horríveis). Também o são um sem número de cerimónias religiosas e de festas populares. Nada disso significa que estas actividades devam ser subsidiadas. E principalmente, nada disto significa que as actividades que um conjunto de auto-proclamadas elites considerem como a melhor "cultura" devam ser subsidiadas.
5. Nem todas as formas de integração europeia são federalistas. Uma UE federal não significa o puro e simples fim dos Estados Membros, subsumidos num mega-Estado unitário europeu. Uma UE federal não significa também menos democracia; aliás, antes pelo contrário. Uma UE federal significa criar uma democracia transnacional, de forma a que existam instituições formais com maior legitimidade democrática que permitam lidar com questões com as quais não é possível lidar apenas ao nível dos Estados Membros. Tem de existir uma clara divisão de competências e tem de ser garantido um nível razoável de autonomia aos Estados-Membros. Tem de ser reforçada a cidadania europeia. E é neste sentido que eu gostava de ver a UE evoluir - daí considerar-me federalista europeu.
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sexta-feira, 15 de junho de 2012
Ideologia, Legitimidade e o Regime
Uma das
questões que mais se ouve aquando de qualquer discussão sobre a
China contemporânea é a da natureza do regime. Será comunismo ou
capitalismo, capitalismo de estado, socialismo, socialismo com
características chinesas e por aí fora. Os rótulos são
incontáveis e provavelmente irrelevantes. A questão essencial a meu
ver está ligada aos mecanismos de sustentação e reforço da
legitimidade do regime.
Segundo os
ditames do Marxismo-Leninismo, a prática Marxista na Rússia às
mãos de Lenine e uma das bases ideológicas do Partido Comunista
Chinês (PCC), a revolução é liderada por um partido de vanguarda
num regime de ditadura do proletariado. O estado recorre a
instrumentos como a abolição da propriedade privada dos meios de
produção e uma economia planificada. Estes elementos estão ainda,
de uma forma ou de outra, presentes no ordenamento político chinês.
O partido de vanguarda é o PCC, cuja legitimidade na liderança da
revolução ainda em curso não está sujeita a qualquer espécie de
escrutínio. A abolição da propriedade privada dos meios de
produção, não sendo total, expressa-se nos vários conglomerados
nas mãos do estado, especialmente em sectores considerados
estratégicos. As julgar pelos valores nesta peça, as dez maiores
empresas chinesas em termos de receita são todas estatais ou estão sob
controlo maioritário estatal e as 20 maiores empresas estatais
corresponderão a cerca de 50% do PIB chinês. Por último, os planos
quinquenais são a principal expressão da economia planificada, que
apesar de não estar sujeita a uma microgestão soviética, mantém
um fio condutor, como as já mencionadas empresas estatais e por
exemplo os enormes programas de obras públicas e o estabelecimento
de estalões tecnológicos para a computação ou telecomunicações.
Para além
desta apreciação superficial convém analisar também qual a
moldura ideológica a que o partido recorre para justificar a sua
acção. Aqui teremos de distinguir entre dois tipo de ideologia, a
prática e a fundamental, essencialmente os meios e os fins. Um dos
desafios aos quais os estados do antigo bloco de leste não
conseguiram responder foi o da modernização, com todos os seus
efeitos secundários indesejados. Isto porque aqueles regimes foram
incapazes de compatibilizar os seus objectivos finais, a utopia
comunista, com a realidade concreta da modernização. Pelo
contrário, a elite Chinesa, sem nunca abdicar do seu objectivo
final, estabeleceu a modernização e o seu corolário, o
desenvolvimento económico, como apenas um passo no caminho para o
comunismo. Assim, aquilo que ditou pelo menos em parte o fim do
comunismo no leste europeu, tornou-se agora um enorme reforço da
aceitação por parte da população chinesa da permanência no poder
por parte do PCC. Só o partido pode liderar este processo de
modernização e desenvolvimento que a manter-se aos ritmos actuais
manterá os líderes chineses firmemente no poder. Trata-se contudo
de uma espada de dois gumes, pois no dia em que a economia crescer
menos e não forem criadas as dezenas de milhões de postos de
trabalho anuais necessários para absorver uma enorme população
rural em migração para os centros urbanos, a posição do partido
tornar-se-à extremamente precária. De facto a economia chinesa nos
últimos anos não tem crescido a ritmos tão altos (mas ainda
fantásticos para os nossos miseráveis padrões) e é possível que
a estratégia de simples acumulação de capital já não esteja a
funcionar, mas isso é uma história para outra altura.
As Ciências Sociais e Comportamentais como resposta à crise
Em 2012 a grande maioria dos artigos publicados em blogs começam por referir os tempos de crise que vivemos. São também muitos os artigos, e opiniões expressas verbalmente, que apelam a uma maior produção tecnológica, tanto em termos de investigação e desenvolvimento como em termos produtivos.
Neste artigo, tal como todos os outros, apelo aos tempos de crise que vivemos para iniciar a linha de pensamento que pretendo apresentar. No entanto, ao contrário de outros, defendo que a saída da crise não passa pela inovação tecnológica mas antes pela inovação económica, social e política. A crise que atravessamos é caracterizada não por uma escassez tecnológica mas antes pela urgência de uma transformação social, política e económica que responda aos desafios que se colocam. É neste sentido de estranhar a noticia avançada recentemente pela comunicação social que dá conta da enfâse colocada pelo Governo na formação de licenciados em áreas tipicamente tecnológicas (ex. engenharia, matemática, etc.).
Esta atuação por parte do Governo só espanta os menos atentos. Na verdade, também no que diz respeito à investigação e desenvolvimento, as atenções têm estado viradas para o desenvolvimento tecnológico sendo que tem existido um desinvestimento no que diz respeito às Ciências Sociais e Comportamentais. Ora, a crise que atravessamos não se prende com a falta de tecnologia, mas sim, como já foi afirmado neste artigo com a falta de soluções sociais, politicas e económicas. No fundo o que precisamos é que as sociedades desenvolvam novas formas de funcionar e isto só se consegue com o investimento em investigação e desenvolvimento de inovação social.
Neste sentido, e perante crises como a atual, os nossos esforços deviam estar concentrados, entre outras, nas seguintes áreas:
- Economia, com o objetivo de se desenvolverem novos modelos económicos e ajustar os modelos já existentes. A este nível, têm sido feitos, noutras partes do globo, alguns esforços nomeadamente ao nível da Economia comportamental, Economia Comportamental e Economia da Felicidade e Bem Estar.
- Sociologia, com o objetivo de se desenvolverem novos modelos de desenvolvimento social, estimulando a investigação em áreas como a inovação social.
- Ciência Política, no sentido de se ajustarem os sistemas políticos a novas realidades e aos novos desafios. Por exemplo, seria interessante aprofundar o estudo em torno sistemas eleitorais nacionais e europeus alternativos.
- Psicologia, no sentido do aprofundamento de áreas emergentes da psicologia, nomeadamente da psicologia social. A psicologia e ciências comportamentais podem dar um contributo nomeadamente no que diz respeito à compreensão dos processos psicológicos e comportamentais que deram origem à crise atual, assim como podem avançar com possíveis soluções ao propor novos modelo de desenvolvimento (por exemplo através da psicologia positiva e estudos da Felicidade).
Só compreendendo a atual situação social, politica e económica é que conseguimos avançar para soluções de médio e longo prazo.
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A personalização dos mercados
Num seu artigo no dia 11, o João Cardiga falou, entre outras coisas, sobre a personalização/antropomorfização dos mercados. Uma das primeiras afirmações do João é de que, na opinião dele, um grande motivo para o apelo das medidas populistas é a simplificação do funcionamento de um mercado, e que essa simplificação é aproveitada por certas forças políticas para transformar «os mercados» no mau da fita e com isso «justificar» as suas políticas.
Os mercados envolvem um conjunto muito alargado de pessoas a interagir umas com as outras. Envolvem uma vasta rede de relações que se estabelecem entre pessoas que tomam decisões que têm influência umas nas outras, em tempo real. Os «mercados» não são uma entidade tipo Estado, conforme pretendem alguns, no que são precisamente ajudados pela forma com personalizam os referidos mercados. São espaços em que existem trocas de bens e serviços.
Ao transformar os «mercados» numa entidade personalizada, com uma «voz» e «vontade» próprias, as forças políticas referidas acima podem usar a tão apetecível retórica do «nós contra eles», que tão bem tende a funcionar em momentos de crise. Neste caso, «nós contra os mercados». Os mercados que nos maltratam, que são puramente irracionais, que não querem saber «das pessoas» e que são dominados por poderes ocultos (ou não tão ocultos: agora o alvo habitual parece ser a Goldman Sachs).
Ao mesmo tempo que acusam outros de embarcarem na «política do medo», fomentam o medo dos «mercados». Culpam os «mercados» de todos os nossos males, incluindo aqueles que claramente resultaram de escolhas políticas. Afirmam a total desregulação dos mercados mesmo quando esta não existe. E acabam por atirar farpas e fomentar o descrédito da própria democracia e instituições democráticas ao essencialmente desresponsabilizar os cidadãos das escolhas que fizeram nas urnas e fora delas.
Essas forças políticas não são apenas de Esquerda. Também na Direita existe quem tenha por hábito diabolizar os «mercados». Escudam-se, à Esquerda e Direita, no manto de serem os únicos e verdadeiros representantes do «povo», da «pessoa comum», do «trabalhador», e seus defensores contra esse tenebroso e pouco definido papão que são «os mercados».
Concordo também com o João que a resposta não pode ser transformar os mercados nos «bons da fita». Também não me parece que tenha sido isso o que o Duarte fez (não estou a dizer que o João acusou o Duarte de o fazer, já agora). O problema é que lutar contra quem se limita a apresentar bodes espiatórios e promessas de ambrósia e néctar é complicado. Muito complicado. Porque se cairmos nesse jogo, será o outro lado a jogar em casa e quase que começamos a perder. E se não cairmos, a resposta vai ter de conseguir tornar simples algo de complexo sem que desvirtue aquilo que se defende.
De qualquer forma, é possível fazê-lo. E é preciso fazê-lo.
Os mercados envolvem um conjunto muito alargado de pessoas a interagir umas com as outras. Envolvem uma vasta rede de relações que se estabelecem entre pessoas que tomam decisões que têm influência umas nas outras, em tempo real. Os «mercados» não são uma entidade tipo Estado, conforme pretendem alguns, no que são precisamente ajudados pela forma com personalizam os referidos mercados. São espaços em que existem trocas de bens e serviços.
Ao transformar os «mercados» numa entidade personalizada, com uma «voz» e «vontade» próprias, as forças políticas referidas acima podem usar a tão apetecível retórica do «nós contra eles», que tão bem tende a funcionar em momentos de crise. Neste caso, «nós contra os mercados». Os mercados que nos maltratam, que são puramente irracionais, que não querem saber «das pessoas» e que são dominados por poderes ocultos (ou não tão ocultos: agora o alvo habitual parece ser a Goldman Sachs).
Ao mesmo tempo que acusam outros de embarcarem na «política do medo», fomentam o medo dos «mercados». Culpam os «mercados» de todos os nossos males, incluindo aqueles que claramente resultaram de escolhas políticas. Afirmam a total desregulação dos mercados mesmo quando esta não existe. E acabam por atirar farpas e fomentar o descrédito da própria democracia e instituições democráticas ao essencialmente desresponsabilizar os cidadãos das escolhas que fizeram nas urnas e fora delas.
Essas forças políticas não são apenas de Esquerda. Também na Direita existe quem tenha por hábito diabolizar os «mercados». Escudam-se, à Esquerda e Direita, no manto de serem os únicos e verdadeiros representantes do «povo», da «pessoa comum», do «trabalhador», e seus defensores contra esse tenebroso e pouco definido papão que são «os mercados».
Concordo também com o João que a resposta não pode ser transformar os mercados nos «bons da fita». Também não me parece que tenha sido isso o que o Duarte fez (não estou a dizer que o João acusou o Duarte de o fazer, já agora). O problema é que lutar contra quem se limita a apresentar bodes espiatórios e promessas de ambrósia e néctar é complicado. Muito complicado. Porque se cairmos nesse jogo, será o outro lado a jogar em casa e quase que começamos a perder. E se não cairmos, a resposta vai ter de conseguir tornar simples algo de complexo sem que desvirtue aquilo que se defende.
De qualquer forma, é possível fazê-lo. E é preciso fazê-lo.
quinta-feira, 14 de junho de 2012
Kizomba,Deus e Liberdade
Um leitor amigo, admirou-se da partilha da música do lucenzo, feita por mim ontem.
Passo a transcrever ao melhor que me lembro o diálogo:
Leitor Anónimo-Epá! Kizomba?Isso não se enquadra.
Moi Meme- Porquê?
Leitor Anónimo- Voçês falam da Actualidade,Direito, Economia, Política, mas Kizomba?
Moi Meme- Liberdade meu Caro.Os moços estão encafuados no escritório o dia todo.Um pouco de surrealismo não faz mal nenhum. Queres Porno Hoje?
Leitor Anónimo-Porno não,! Que tal Religião? Como sou ateu...
Moi Meme- Feito. Hoje à noite farei o link para o blogue de Deus Nosso Senhor. Mas tens que ler tudo.
Leitor Anónimo- EHEH. Boa sorte, mas olha que estou a ler " A Biblia para Ateus", por isso não prometo nada.
Como o prometido é devido, vide o blogue de Deus...
PS: Deus tem conseguido neste blogue converter muitos não-crentes e recuperar os descrentes.
Para os que não partilham desta fé, saudações piedosas.
Passo a transcrever ao melhor que me lembro o diálogo:
Leitor Anónimo-Epá! Kizomba?Isso não se enquadra.
Moi Meme- Porquê?
Leitor Anónimo- Voçês falam da Actualidade,Direito, Economia, Política, mas Kizomba?
Moi Meme- Liberdade meu Caro.Os moços estão encafuados no escritório o dia todo.Um pouco de surrealismo não faz mal nenhum. Queres Porno Hoje?
Leitor Anónimo-Porno não,! Que tal Religião? Como sou ateu...
Moi Meme- Feito. Hoje à noite farei o link para o blogue de Deus Nosso Senhor. Mas tens que ler tudo.
Leitor Anónimo- EHEH. Boa sorte, mas olha que estou a ler " A Biblia para Ateus", por isso não prometo nada.
Como o prometido é devido, vide o blogue de Deus...
PS: Deus tem conseguido neste blogue converter muitos não-crentes e recuperar os descrentes.
Para os que não partilham desta fé, saudações piedosas.
quarta-feira, 13 de junho de 2012
Uma música que nunca dançei!
Noite de loucura, é o que costuma ser esta véspera de feriado de Santo António em Lisboa.
Tenho que ir trabalhar pela fresca, por isso não há passeio para mim. Bem feita trabalhar numa multinacional.
Que a todos que o possam fazer, desejo um Bom Arraial!
Ficai com Lucenzo, um Português de Vila Real e que as morenas Bailem!
Tenho que ir trabalhar pela fresca, por isso não há passeio para mim. Bem feita trabalhar numa multinacional.
Que a todos que o possam fazer, desejo um Bom Arraial!
Ficai com Lucenzo, um Português de Vila Real e que as morenas Bailem!
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segunda-feira, 11 de junho de 2012
Resposta a Duarte Halbritter de Sousa (...ou como o mercado não é uma pessoa ou uma máquina)
Viva
Este artigo aparece como resposta ao
“debate” que se iniciou com o artigo do Duarte (e que recomendo a
leitura) cujo o propósito era o de fazer uma “reflexão simples
sobre as duas crises económicas que se abatem sobre o país” em
dois artigos. O meu comentário (que o Duarte respondeu de forma
excelente aqui) apareceu nesse contexto e prendia-se mais com a forma
como é encarado o mercado e a leitura das soluções actuais
possíveis.
Agradeço a paciência e trabalho do
Duarte em me responder e me “aturar” neste debate.
Antes de começar, gostava de
esclarecer que a minha maior divergência se prende com a forma como
o mercado ou a austeridade foram tratados, do que com o conteudo em
si. Na minha opinião, um dos grande motivos pelo qual medidas
populistas têm tido tanto aumento é precisamente porque se
simplificou em demasia o funcionamento de um mercado.
Hoje temos uma conjunto de analistas e
comentadores (e estou a excluir deste grupo o Duarte) que tece
opinião sobre as quais não tem base. Nesse sentido é que a minha
critica da “voz” do mercado aparece. O mercado não é uma pessoa
para ter “voz”. Se olharmos para a retórica do Bloco de
Esquerda, por exemplo, eles cometem esse erro, ao transformar os
mercados como “bad guy”. Ora eu acho que apenas transformar o
mercado em “good guy” (ou simplesmente “guy”) não apaga o
erro, apenas o reforça.
Por outro lado - e parece que as
pessoas continuam a esquecer - o mercado é, em ultima análise, um
espaço de pessoas. E essas não funcionam de forma mecânica. Quando
falamos de mercado (ou em economia) estamos sempre a falar em algo
comportamental e não em algo mecânico. Ou seja, apesar de podermos
tentar prever, tal previsão tem sempre um grau de imprevisibilidade
relacionado com o factor humano.
Dito isto, passo a responder aos vários
pontos levantados (um por cada comentário meu respondido):
1 – Gostava de esclarecer que não
acho que “as taxas de juro
que nos cobram dependem apenas da mente irracional dos mercado”.
O primeiro motivo é obvio: eu não sou da opinião que o mercado
tenha uma “mente”. E apesar de considerar que por vezes os
actores do mercado podem agir de forma irracional e outras de forma
irrefletida, a maioria das decisões são ponderadas e racionais
(apesar de poderem ser incorretas).
Por
outro lado - e aqui julgo que temos opiniões divergentes - não
considero que a taxa de juro seja a voz do mercado. A taxa de juro é
o preço daquele mercado e como tal é o ponto de equilibrio entre o
lado da oferta e da procura, nada mais que isso (claro com tudo o que
“isso” significa). Se quisermos simplificar eu iria apenas ao
ponto de dizer que a “vontade do mercado” é fazer um bom
negócio. Mas temos de ter atenção que a noção de “bom negócio”
é variável de agente para agente.
Com
o exagero da Maya queria dizer que para sabermos a “opinião” do
mercado teriamos de falar com todos os agentes no mercado e saber
qual a sua noção de bom negócio e quais os motivos que os levam a
agir dessa forma. Isso é impossível. O que se pode fazer é tentar
compreender quais serão os motivos principais de determinado
movimento em determinado mercado.
Ou
seja, considero que existe uma relação forte entre o comportamento
da economia e a acessibilidade a financiamento externo. Mas tal não
significa que garantidamente teremos financiamento caso controlemos
o deficit. É que nesta temática as coisas não funcionam como no
mundo da física ou como se de uma máquina se tratasse. Não
carregamos num botão e o output vai ser o calculado. Julgo que a
análise actual entre o desempenho do deficit e o acesso ao
financiamento está a ser sobrevalorizada. Existem outros motivos –
como a estrutura institucional do euro e desempenho da economia
mundial – que explicam este aumento de risco, e que não estão a
ser valorizados.
Gostaria de pedir desculpa por não ter
sido claro quando mencionei a “escassez de capital”. Deveria ter
escrito “escassez de capital no mercado de divida publica
portuguesa para determinado preço”. Simplesmente os agentes
deixaram de comprar divida publica portuguesa a determinado nível de
preço. O motivo pelo qual isso aconteceu é diverso.
Concordo que um motivo é maiores
dúvidas que Portugal possa pagar (sendo que o motivo passa pelo
desempenho do Estado Português e também pelo desempenho da economia
mundial). Mas não é o único. Por exemplo - desde o momento em que
o rating foi diminuido - muitas casas de investimento ficaram
proibidas de investir no mercado de divida pública portuguesa (mesmo
que na opinião desses agentes o nível de risco não tenha
aumentado).
Numa situação limite, esta acção
poderia ser motivo para o aumento de taxa de juro em Portugal e a
diminuição da taxa de juro na Alemanha (o que não parece ser de
todo o caso).
Se este motivo que apresentei é ou não
negligenciável é algo que não sei. A minha opinião é mais
simples. Eu considero que apresentar apenas um motivo para explicar
uma realidade complexa (como o comportamento do mercado de divida
pública) é um erro. Um que tem tido como consequência o aumento da
aceitação de uma retórica populista.
2 – A troika não é o mercado. Ou
melhor, passou a ser um caso especial de mercado. Neste caso passámos
a ter apenas um interveniente. Não me referia a essa situação. No
entanto julgo que foi um erro o acordo tal como foi feito. Se é
legítimo que o credor possa exigir que não haja desperdício de
dinheiro antes da sua dívida ser paga, já não considero legitimo a
existência de decisões politicas no acordo.
Digo isto concordando politicamente com
muitas das medidas que estão naquele acordo. No entanto deveriam ter
sido defendidas per si e não com o acordo. Aquelas medidas são boas
independente de estarmos em falência ou da necessidade de acordo.
Infelizmente há décadas que não temos politicos fortes - e os
fracos precisam sempre de uma desculpa externa para justificar
medidas fortes (antes da troika era o Pacto de Estabilidade, União
Europeia, etc...). No caso do acordo da Troika, isto é a minha
leitura daquele documento. Ele existe daquela forma mais por
interesse do devedor, do que do interesse do credor.
E para mim, esse acordo nem é a
solução para o problema da dívida portuguesa. Na minha opinião,
mesmo com o cumprimento da Troika iremos estar fora do mercado. Tenho
sérias dúvidas que enquanto a Instituição do Euro não mudar,
exista uma redução considerável do nível de juro.
Aliás, o cenário de incumprimento do
acordo (nas metas estabelecidas e não nas politicas) e o encontrar
de soluções alternativas começa a ser o cenário mais previsível.
3 – Quando mencionei “personificação”
referia-me à figura de estilo. Quando se diz que o mercado tem uma
voz ou que diz algo estamos a personificar. Da mesma forma,
afirmar-se que a austeridade nos prepara, julgo que também é uma
personificação (está a dar-se uma imagem de professor ou
preparador psicológico). Julgo que “falar,
sem mais, de aumento de competitividade”
não seja a figura de estilo personificação. Será apenas uma frase
sem fundamento. O motivo pelo qual não dei nenhum exemplo de medidas
concretas é porque me estava a referir às medidas que estão no
acordo da Troika e que considero que são medidas que irão aumentar
a competitividade.
Por outro lado eu não disse que “o
mercado não aloca a distribuição de riqueza”
mas sim que não o faz com base no mérito ou talento. Para ser mais
correto diria que não o faz “apenas” com essa base e que muitas
vezes (senão mesmo a maioria) as decisões não são feitas “porque
são os [produtos] com melhor relação qualidade/preço”.
O placement do produto é
talvez tão ou mais importante que essa relação. A “capa” do
produto é outro factor com muito peso. Por vezes o maior “talento”
ou “mérito” que determinado produto tem é o de ter dinheiro
para apresentar uma cara bonita, ou uma cara popular nos seus
anúncios.
“Se
não se achar que o mérito existe e que o mercado o recompensa então
porque é que vale a pena, por exemplo, uma pessoa ser bom aluno ou
ser bom na sua profissão?”
Pois,
muitas pessoas acabam por fazer essa pergunta quando, apesar de serem
bons alunos ou bons na sua profissão, não conseguem ter o sucesso
de, por exemplo, Paulo de Azevedo (um dos nomes no link). É um
exemplo perfeito para o que referia. É que não coloco de parte que
oele seja bom. No entanto, o que questiono é se ele estaria naquela
posição se tivesse nascido numa familia pobre. Mais, se fizer uma
análise do background das pessoas referidas, tenho sérias dúvidas
que a maioria (se não todos) não tenham vindo de pelo menos a
classe média alta. Aliás, um dos maiores “méritos” para se
chegar a conselho de administração de uma grande empresa em
Portugal é o percurso politico. Outro é o das familias. A qualidade
é também um elemento, mas não é o diferenciador.
3 – Neste ponto gostaria de referir
que concordo com a visão de Estado que também é a minha (talvez
apenas com a diferença da Segurança Social, mas este ponto seria
uma discussão totalmente diferente e longa).
4 – Neste ponto expressei-me mal e
concordo.
5 – Nada a referir.
6 - Pois. Também concordo que não é
a melhor. No entanto julgo que a nossa situação está longe de
justificar por exemplo a diminuição dos feriados, a alteração das
regras do subsidio de desemprego ou o aumento das taxas moderadoras,
etc... E longíssimo de justificar o fim do Estado Social.
domingo, 10 de junho de 2012
Amor a Portugal a Pensar no Avô!
É um trabalho sujo mas alguém tinha que o fazer.
Num dia em que muitos lambem as feridas, pela derrota futeboleira de ontem, com a Alemanha.
Leio este texto no Combustões e penso no meu Avô. Ele ganhou à Alemanha!
Uma vida melhor, para ele e para a Família e também para o País.
Ainda sou daquele tempo em que a familia se juntava para ver a nossa canção da Eurovisão, sabendo que não havia hipótese, mas com aquele sofrer português, misto de esperança e resignação.
Portugal é mais do que Futebol, passaram oito séculos desde que aqui estamos, venham mais oito!
Hoje é Dia de Portugal!
Dá-lhe Dulce!
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sábado, 9 de junho de 2012
Zé, o Imperialista
O Zé é imperialista. Vários intelectuais afirmaram que o Zé é imperialista. Que todas as suas acções apontam para isso. Que o facto de nunca beber uma imperial é irrelevante. Porque o Zé é um imperialista.
Quando o Zé boceja, é sinal de que quer uma imperial. Quando pede sumo de laranja, é código para uma imperial. Quando vem mesmo um sumo de laranja, ou foi engano, ou estamos todos a ser enganados - na verdade, é uma imperial. E quando o Zé bebe sumo de laranja, deve interpretar-se que, simbolicamente, está a beber imperial.
Todos os que contradigam que o Zé é imperialista estão comprados pelo Zé. Ou então, são ingénuos, incapazes de interpretar todas as provas claríssimas do imperialismo do Zé. E claro, são incapazes de resistir a toda a propaganda que lhes é posta à frente pelos "media".
Mas há quem saiba a verdade e a partilhe com o mundo: o Zé é imperialista. Há livros e "sites" que se interligam num virtuoso círculo imparável de citações que colocam ao dispor de todos a verdade que o Zé não quer desvendada - que o Zé é imperialista.
O Zé tudo controla. Explora homens e mulheres através dos "mercados" e do Estado. O Zé é mais poderoso que todos os outros poderosos. É o mais misterioso dos mistérios. É conhecido apenas daqueles que quer que o conheçam. E é mau. Porque é imperialista - não pode viver sem uma imperial.
Quando o Zé boceja, é sinal de que quer uma imperial. Quando pede sumo de laranja, é código para uma imperial. Quando vem mesmo um sumo de laranja, ou foi engano, ou estamos todos a ser enganados - na verdade, é uma imperial. E quando o Zé bebe sumo de laranja, deve interpretar-se que, simbolicamente, está a beber imperial.
Todos os que contradigam que o Zé é imperialista estão comprados pelo Zé. Ou então, são ingénuos, incapazes de interpretar todas as provas claríssimas do imperialismo do Zé. E claro, são incapazes de resistir a toda a propaganda que lhes é posta à frente pelos "media".
Mas há quem saiba a verdade e a partilhe com o mundo: o Zé é imperialista. Há livros e "sites" que se interligam num virtuoso círculo imparável de citações que colocam ao dispor de todos a verdade que o Zé não quer desvendada - que o Zé é imperialista.
O Zé tudo controla. Explora homens e mulheres através dos "mercados" e do Estado. O Zé é mais poderoso que todos os outros poderosos. É o mais misterioso dos mistérios. É conhecido apenas daqueles que quer que o conheçam. E é mau. Porque é imperialista - não pode viver sem uma imperial.
quinta-feira, 7 de junho de 2012
A decisão de Portalegre - Resposta a Ricardo Reis
[Aviso: artigo longo.]
Só hoje reparei que Ricardo Reis tinha mencionado o blogue num seu artigo sobre a decisão do Tribunal de Portalegre (ver aqui o artigo original e aqui o artigo com a referência).
Gostaria de esclarecer que no meu artigo tentei explicar a decisão do tribunal e critiquei a forma como tinha sido apresentada na imprensa. Ou seja, explicar a interpretação jurídica do tribunal sobre o que estava em causa, porque me pareceu que estava a haver uma simplificação do que se tinha decidido por parte da imprensa (dava a ideia que bastava ir ao banco entregar a casa e já estava, sem dar conta de todo o contexto subjacente).*
Tive a oportunidade de entretanto estudar de forma ligeiramente mais aprofundada a decisão e gostaria então de dar a minha opinião sobre a mesma, bem como sobre uma decisão espanhola que vai no mesmo sentido.
Começo pela decisão do Tribunal de Portalegre. O tribunal invoca abuso de direito por parte do banco (na modalidade de desequilíbrio de exercício do direito), enriquecimento sem causa por ter sido realizada uma prestação sem se ter atingido o objectivo visado por causa superveniente e que existiria uma descaracterização da correspondência entre dever de prestar e direito à prestação.
Não me parece que tenha existido abuso de direito, embora compreenda porque é que o tribunal usou este instituto (na prática, permitiu-lhe chegar à decisão que pretendia obter no final). O banco pediu que lhe fosse imediatamente paga a dívida (direito que lhe assistia no âmbito do processo de inventário) após reconhecimento da mesma. Não existindo dinheiro suficiente, procedeu-se à venda de um bem da relação de bens, neste caso o imóvel. O imóvel foi colocado à venda por € 82.250 e apenas existiu uma proposta: a do banco. Por isso, o imóvel foi-lhe adjudicado.
O tribunal considerou que existiu abuso de direito por parte do banco. Embora este se tivesse limitado a exercer um direito que lhe assistia por lei, e embora esse exercício fosse, de uma perspectiva literal, sancionado por essa mesma lei, o tribunal considerou que o exercício contrariava a boa fé. Isto porque, segundo o tribunal (e esta parte é crucial para a decisão), o banco sempre tinha avaliado o imóvel por mais, pelo que deveria agora abater esse valor superior à dívida total.
O tribunal não avaliou a situação, no entanto, numa perspectiva de análise de por quem corre o risco numa situação de empréstimo como esta. Na prática, da decisão decorre que o risco correu por conta do banco, mas essa análise nunca é feita pelo tribunal - o que inquina desde logo a decisão, a meu ver. O tribunal, já que queria inovar, devia ter justificado qual a razão para o risco, na sua perspectiva, dever correr por conta do banco. Porque, segundo a lei como tem sido aplicada até hoje, não corre.
Há duas razões que têm sido apontadas para que o risco deve correr por conta do banco, ambas interligadas. A primeira é que o banco se encontra numa melhor posição para fazer uma análise de risco relativamente ao empréstimo. A segunda é que o crédito para habitação própria devia ter tratamento especial por, precisamente, permitir às pessoas adquirir casa para habitação própria.
Se o objectivo for facilitar a compra de casa própria através de crédito (daí o tratamento especial a conferir ao crédito à habitação), no entanto, uma regra como esta só serve para encarecer esse mesmo crédito (o Duarte escreveu um artigo sobre o tema da análise de risco por parte dos bancos aqui no blogue cuja leitura recomendo), o que não serve esse propósito. Não estou a dizer que este deva ser o objectivo (pessoalmente, penso que não deve ser incentivada com estímulos públicos a compra a crédito, e vi com bons olhos o fim dos benefícios fiscais que existiam nesse sentido), mas estou a dizer que se for, não é por aqui que os preços dos empréstimos ficam mais baixos. Antes pelo contrário - ficam mais elevados.
Quanto aos bancos estarem numa melhor posição para fazer a análise de risco de crédito, de facto estão. E correm o risco por esse mesmo crédito não ser pago por, por algum motivo, o devedor não o conseguir pagar. Mas daqui não retira pura e simplesmente que devem também correr o risco de desvalorização da garantia - especialmente quando esta regra sobre risco não tinha sido tida em consideração aquando do empréstimo, por pura e simplesmente não existe - e que portanto devam correr o risco da desvalorização do imóvel.
Quem comprou o imóvel não foi o banco - foi a pessoa. Foi essa pessoa que tomou a decisão de investir no imóvel e se tornou proprietária do mesmo. O banco emprestou-lhe fundos para o efeito, é verdade. Mas isso não significa que o risco do investimento da pessoa deva correr por conta do banco. O risco do investimento do banco deve correr por conta do banco - e esse risco foi de emprestar uma determinada quantia, a juros, àquela pessoa. O banco deve correr risco da pessoa não conseguir pagar o que lhe deve, mas não o risco da desvalorização do imóvel (por qualquer motivo, incluindo falta de compradores em caso de venda judicial).
Voltando à decisão, o tribunal considerou que decorria da boa fé que o único valor pelo qual o banco alguma vez poderia aceitar o imóvel tinha de ser €117.500,00, porque era esse o valor que estava na base da relação jurídica conforme determinada no seu início. Mas, de novo, não procedeu a uma análise sobre alocação de risco de desvalorização do imóvel e por conta de quem é que este devia correr, nem levou em devida consideração que tinha havido uma venda judicial e que o imóvel em questão apenas tinha conseguido obter uma proposta pelo 70% do valor de base quando colocado à venda.
Na prática, isto redundaria numa espécie de obrigação do banco sistematicamente proceder a reavaliações do imóvel e a informar o devedor de que o imóvel se tinha vindo a desvalorizar, ou caso contrário deveria considerar-se que o banco correria o risco da desvalorização do imóvel - o que não só aumentaria os custos dos empréstimos, como não faz grande sentido. Não tinha ficado no contrato que o valor do prédio ficaria fixado para todo o sempre em € 117.500,00 - esse era o valor do prédio no ano em que teve lugar o empréstimo.
Não vejo que tenha existido qualquer enriquecimento sem causa (em qualquer modalidade), nem que tenha sido quebrada a correspondência entre a prestação e a contra-prestação. A pessoa pediu um empréstimo ao banco e comprometeu-se a pagá-lo de volta com juros - é este o negócio jurídico que se encontra aqui em causa. E a pessoa recebeu o empréstimo e tornou-se proprietário da casa. Mais tarde, a casa passou para o banco por um valor inferior do que aquele pelo qual tinha sido avaliada originalmente. Mas isso, só por si, não transfere o risco do investimento na casa para o banco.
Simpatizo com o juiz de Portalegre e compreendo porque é que tomou a decisão que tomou. Mas por muito bem escrita, de um ponto de vista retórico, que esteja a decisão, ela não tomou em conta uma série de questões jurídicas e económicas relevantes. Sendo que, já agora, não considero por princípio errado que existam regras que facilitem o pagamento em casos especiais - tudo depende das regras concretas que sejam definidas.
Um breve apontamento ainda sobre a decisão espanhola. Nessa decisão, um tribunal de 2.ª instância de Navarra considerou que, mesmo não existindo abuso de direito (contrariamente ao juízo de execução espanhol em 1.ª instância, que considerou que esta tinha existido), porque o banco tinha exercido um direito que legalmente podia ter exercido, o valor do imóvel a considerar para abater à dívida deveria ser o valor aquando do empréstimo (por, tal como em Portugal, ser o único valor constante dos autos). Usou como argumento uma suposta interpretação das normas em causa tendo em atenção o contexto de crise económica e financeira existente em Espanha (em Espanha rebentou uma bolha imobiliária, contrariamente a Portugal), muito causada pelos bancos - na prática, no entanto, não justificou a decisão juridicamente, apenas politicamente.
Resta dizer que estão neste momento em discussão no Parlamento diversos projectos de lei sobre a questão do crédito à habitação e da dação em cumprimento, mas que, de acordo com a informação que tenho recolhido, a situação relativa à entrega de casas aos bancos não é tão dramática como possa parecer pela imprensa (os números habitualmente apresentados incluem entrega de casas nunca completadas, pelo que percebi). Esses projectos de lei têm em comum a ideia de que, existindo uma situação extrema, em que haja um súbito decréscimo do rendimento do agregado familiar, o que torne o pagamento do crédito à habitação mais difícil, existam procedimentos especiais para lidar com essa situação.
Na prática, segundo creio, trata-se de criar uma lei para fazer algo que os bancos já se têm visto forçados a fazer mesmo sem lei. Penso, no entanto, que serão estes projectos de lei que, quando se tornarem lei, terão impacto a longo prazo, mais do que a decisão do Tribunal de Portalegre. Importa, portanto, seguir os debates em torno destes projectos.
Neste sentido, conto ter novidades num futuro próximo. Por agora, agradeço a paciência e simpatia de quem leu este artigo até ao fim!
* Editado: Na versão anterior, dizia que Ricardo Reis me atribuía a interpretação do tribunal no artigo do «link», o que na realidade não fez. Fica a correcção feita.
Só hoje reparei que Ricardo Reis tinha mencionado o blogue num seu artigo sobre a decisão do Tribunal de Portalegre (ver aqui o artigo original e aqui o artigo com a referência).
Gostaria de esclarecer que no meu artigo tentei explicar a decisão do tribunal e critiquei a forma como tinha sido apresentada na imprensa. Ou seja, explicar a interpretação jurídica do tribunal sobre o que estava em causa, porque me pareceu que estava a haver uma simplificação do que se tinha decidido por parte da imprensa (dava a ideia que bastava ir ao banco entregar a casa e já estava, sem dar conta de todo o contexto subjacente).*
Tive a oportunidade de entretanto estudar de forma ligeiramente mais aprofundada a decisão e gostaria então de dar a minha opinião sobre a mesma, bem como sobre uma decisão espanhola que vai no mesmo sentido.
Começo pela decisão do Tribunal de Portalegre. O tribunal invoca abuso de direito por parte do banco (na modalidade de desequilíbrio de exercício do direito), enriquecimento sem causa por ter sido realizada uma prestação sem se ter atingido o objectivo visado por causa superveniente e que existiria uma descaracterização da correspondência entre dever de prestar e direito à prestação.
Não me parece que tenha existido abuso de direito, embora compreenda porque é que o tribunal usou este instituto (na prática, permitiu-lhe chegar à decisão que pretendia obter no final). O banco pediu que lhe fosse imediatamente paga a dívida (direito que lhe assistia no âmbito do processo de inventário) após reconhecimento da mesma. Não existindo dinheiro suficiente, procedeu-se à venda de um bem da relação de bens, neste caso o imóvel. O imóvel foi colocado à venda por € 82.250 e apenas existiu uma proposta: a do banco. Por isso, o imóvel foi-lhe adjudicado.
O tribunal considerou que existiu abuso de direito por parte do banco. Embora este se tivesse limitado a exercer um direito que lhe assistia por lei, e embora esse exercício fosse, de uma perspectiva literal, sancionado por essa mesma lei, o tribunal considerou que o exercício contrariava a boa fé. Isto porque, segundo o tribunal (e esta parte é crucial para a decisão), o banco sempre tinha avaliado o imóvel por mais, pelo que deveria agora abater esse valor superior à dívida total.
O tribunal não avaliou a situação, no entanto, numa perspectiva de análise de por quem corre o risco numa situação de empréstimo como esta. Na prática, da decisão decorre que o risco correu por conta do banco, mas essa análise nunca é feita pelo tribunal - o que inquina desde logo a decisão, a meu ver. O tribunal, já que queria inovar, devia ter justificado qual a razão para o risco, na sua perspectiva, dever correr por conta do banco. Porque, segundo a lei como tem sido aplicada até hoje, não corre.
Há duas razões que têm sido apontadas para que o risco deve correr por conta do banco, ambas interligadas. A primeira é que o banco se encontra numa melhor posição para fazer uma análise de risco relativamente ao empréstimo. A segunda é que o crédito para habitação própria devia ter tratamento especial por, precisamente, permitir às pessoas adquirir casa para habitação própria.
Se o objectivo for facilitar a compra de casa própria através de crédito (daí o tratamento especial a conferir ao crédito à habitação), no entanto, uma regra como esta só serve para encarecer esse mesmo crédito (o Duarte escreveu um artigo sobre o tema da análise de risco por parte dos bancos aqui no blogue cuja leitura recomendo), o que não serve esse propósito. Não estou a dizer que este deva ser o objectivo (pessoalmente, penso que não deve ser incentivada com estímulos públicos a compra a crédito, e vi com bons olhos o fim dos benefícios fiscais que existiam nesse sentido), mas estou a dizer que se for, não é por aqui que os preços dos empréstimos ficam mais baixos. Antes pelo contrário - ficam mais elevados.
Quanto aos bancos estarem numa melhor posição para fazer a análise de risco de crédito, de facto estão. E correm o risco por esse mesmo crédito não ser pago por, por algum motivo, o devedor não o conseguir pagar. Mas daqui não retira pura e simplesmente que devem também correr o risco de desvalorização da garantia - especialmente quando esta regra sobre risco não tinha sido tida em consideração aquando do empréstimo, por pura e simplesmente não existe - e que portanto devam correr o risco da desvalorização do imóvel.
Quem comprou o imóvel não foi o banco - foi a pessoa. Foi essa pessoa que tomou a decisão de investir no imóvel e se tornou proprietária do mesmo. O banco emprestou-lhe fundos para o efeito, é verdade. Mas isso não significa que o risco do investimento da pessoa deva correr por conta do banco. O risco do investimento do banco deve correr por conta do banco - e esse risco foi de emprestar uma determinada quantia, a juros, àquela pessoa. O banco deve correr risco da pessoa não conseguir pagar o que lhe deve, mas não o risco da desvalorização do imóvel (por qualquer motivo, incluindo falta de compradores em caso de venda judicial).
Voltando à decisão, o tribunal considerou que decorria da boa fé que o único valor pelo qual o banco alguma vez poderia aceitar o imóvel tinha de ser €117.500,00, porque era esse o valor que estava na base da relação jurídica conforme determinada no seu início. Mas, de novo, não procedeu a uma análise sobre alocação de risco de desvalorização do imóvel e por conta de quem é que este devia correr, nem levou em devida consideração que tinha havido uma venda judicial e que o imóvel em questão apenas tinha conseguido obter uma proposta pelo 70% do valor de base quando colocado à venda.
Na prática, isto redundaria numa espécie de obrigação do banco sistematicamente proceder a reavaliações do imóvel e a informar o devedor de que o imóvel se tinha vindo a desvalorizar, ou caso contrário deveria considerar-se que o banco correria o risco da desvalorização do imóvel - o que não só aumentaria os custos dos empréstimos, como não faz grande sentido. Não tinha ficado no contrato que o valor do prédio ficaria fixado para todo o sempre em € 117.500,00 - esse era o valor do prédio no ano em que teve lugar o empréstimo.
Não vejo que tenha existido qualquer enriquecimento sem causa (em qualquer modalidade), nem que tenha sido quebrada a correspondência entre a prestação e a contra-prestação. A pessoa pediu um empréstimo ao banco e comprometeu-se a pagá-lo de volta com juros - é este o negócio jurídico que se encontra aqui em causa. E a pessoa recebeu o empréstimo e tornou-se proprietário da casa. Mais tarde, a casa passou para o banco por um valor inferior do que aquele pelo qual tinha sido avaliada originalmente. Mas isso, só por si, não transfere o risco do investimento na casa para o banco.
Simpatizo com o juiz de Portalegre e compreendo porque é que tomou a decisão que tomou. Mas por muito bem escrita, de um ponto de vista retórico, que esteja a decisão, ela não tomou em conta uma série de questões jurídicas e económicas relevantes. Sendo que, já agora, não considero por princípio errado que existam regras que facilitem o pagamento em casos especiais - tudo depende das regras concretas que sejam definidas.
Um breve apontamento ainda sobre a decisão espanhola. Nessa decisão, um tribunal de 2.ª instância de Navarra considerou que, mesmo não existindo abuso de direito (contrariamente ao juízo de execução espanhol em 1.ª instância, que considerou que esta tinha existido), porque o banco tinha exercido um direito que legalmente podia ter exercido, o valor do imóvel a considerar para abater à dívida deveria ser o valor aquando do empréstimo (por, tal como em Portugal, ser o único valor constante dos autos). Usou como argumento uma suposta interpretação das normas em causa tendo em atenção o contexto de crise económica e financeira existente em Espanha (em Espanha rebentou uma bolha imobiliária, contrariamente a Portugal), muito causada pelos bancos - na prática, no entanto, não justificou a decisão juridicamente, apenas politicamente.
Resta dizer que estão neste momento em discussão no Parlamento diversos projectos de lei sobre a questão do crédito à habitação e da dação em cumprimento, mas que, de acordo com a informação que tenho recolhido, a situação relativa à entrega de casas aos bancos não é tão dramática como possa parecer pela imprensa (os números habitualmente apresentados incluem entrega de casas nunca completadas, pelo que percebi). Esses projectos de lei têm em comum a ideia de que, existindo uma situação extrema, em que haja um súbito decréscimo do rendimento do agregado familiar, o que torne o pagamento do crédito à habitação mais difícil, existam procedimentos especiais para lidar com essa situação.
Na prática, segundo creio, trata-se de criar uma lei para fazer algo que os bancos já se têm visto forçados a fazer mesmo sem lei. Penso, no entanto, que serão estes projectos de lei que, quando se tornarem lei, terão impacto a longo prazo, mais do que a decisão do Tribunal de Portalegre. Importa, portanto, seguir os debates em torno destes projectos.
Neste sentido, conto ter novidades num futuro próximo. Por agora, agradeço a paciência e simpatia de quem leu este artigo até ao fim!
* Editado: Na versão anterior, dizia que Ricardo Reis me atribuía a interpretação do tribunal no artigo do «link», o que na realidade não fez. Fica a correcção feita.
Portugal, And Now?
If Greece is where the West both begins and ends, then Portugal is where the Europe West ends and the gateway towards the Atlantic Ocean opens - the ancient Greeks used to say from the region that is now mostly occupied by Portugal, as the land beyond the Pillars of Hercules, i.e. the strait of Gibraltar, passing the Mediterranean, already in the big unknown Atlantic Ocean.
Portugal is arguably the oldest nation state of Europe, a land devised as the second attempt of a spin-off of the early Christian kingdom of León on the Northwestern Iberian Peninsula to fight the Arabs during the Reconquista, with the Vatican’s blessing. The Portuguese represent no clear ancestral civilization, they are though the result of the multiple settlers since prehistoric times: occupied by Celts like the Gallaeci and the Lusitanians, integrated into the Roman Republic and later settled by Germanic peoples such as the Suebi, Swabians, Vandals and the Visigoths, and later by Arabs and Sephardic Jews - until the 11th century there was no sense of Portuguese nationality when the country was created to give shape to a state with borders closely resembling to what was once the ancient roman province of Lusitania.
After the Reconquista, the Portuguese kings were set to keep an expansionist movement towards South, first against Northern African arabs and then securing the Atlantic routes towards the Southern hemisphere.
What initially moved the Portuguese ideals was a mix of crusaders ideals and the hope to find another distant civilization of Christian people in the Eastern side of Africa, that mix of religious fervor and need for new trading partners eventually led to the financing of the voyages of Vasco de Gama to India, and inspired a generation of great sailors like Magellan, and others that created for the two Iberian kingdoms the very first global commercial village.
On the western extremity of Europe, with few arable land, the sea and the then the richness of the colonies were Portugal’s few sources of revenue providing for sizeable profits from the trade of spices from the Indies and then from the precious metals from its South American colonies.
After the brutality of the Napoleonic invasions that the Portuguese fight against with its Atlantic historic ally, Great Britain – Portugal became a de facto British impoverished province – in David Ricardo’s famous example of comparative advantage, exchanging Port wine for British textiles, and not being able to industrialize, Portugal ended the 19th century with a very reduced elite that was not able nor wishing to sustain a fragile monarchy and make space for the republican movements to seize the power.
Until the mid-1970’s Portugal was governed by an authoritarian regime (led by conservative dictator Oliveira de Salazar and his "dauphin" for 40 years), which was put to an end by a military coup that effectively stopped a decade long Colonial war namely in Angola, Mozambique and Portuguese Guinea that seemed to have no political solution ahead of it – so during the initial stage of democracy, the fear of left-wing Soviet aligned parties taking control of the country persisted further impeding its economical developments towards a modern pro-market democracy.
About a half of the Portuguese economy is dependent on the central government budget and over-half of private business are family-owned and rely on cheap labor, making meritocratic promotion difficult. Although tax cheating is considered to be under control, the economy’s lack of competitiveness is due to same reasons then of Greece, being mainly a service-based economy, with a strong reliance on tourism, and with little added value exporting capacity with some still small pockets of innovative companies.
Most of the features have to do with deficient macro-economic policies, the result of decades of a lack of a coherent national industrial strategy and an over zeal on non-exporting parts of the economy like the real estate and construction sectors.
Portugal lacks enough productive land to be an agricultural power – but worst, after its entry in the CEE in 1986 the agricultural sector was kept under-developed, not fully exploited, while traditional fishing activities also suffered a big slash.
An almost political dual-party system is the norm after the 1980’s where the two biggest political parties, the socialist party (PS) divides the power with the social democrats (PSD) sometimes forced to team up with the right-wing Christian democrats (CDS).
However, an over-politicized bureaucracy with the middle- and lower-echelon being controlled by the ruling party made state institutions from top to bottom were often overly politicized, allowing for little meritocracy in those institutions, add that to the constant regime changes that resulted that just in the last 10 years Portugal had five different governments, until 2002 with António Guterres - socialist (currently the UN High Commissioner for the Refugees), then Durão Barroso – social democrat (currently the President of the EU Commission), then Santana Lopes – social democrat (member of the Portuguese Parliament) followed by José Socrates – socialist with no current political activity, and whose expansionist budgetary policies are considered to blame for the country sovereign debt crisis.
The current government, led by Pedro Passos Coelho – social democrat, is managing the country while trying to implement the harsh reforms detailed on the so-called “Memorandum of Understanding” imposed by the troika of the IMF, EU, and ECB in exchange for a $100 billion loan, that allowed the country some financial relief when May last year it was forced to ask for international financial assistance.
Surprisingly, there seems to be no space in the political spectrum for neither left-wing extremists, with the historically important Portuguese Communist Party having had no capacity to strongly mobilize the syndicates into the streets, nor any representative hard-right movements have sprung as a result of the record high unemployment, now above 15%, with last years’ poll indicating a clear shift towards the central parties, allowing for coalition government to be formed between the PSD and the CDS, in fact a referendum of the troika terms, that seem to prove there is a national consensus among the Portuguese people to do the troika proposed reforms on the economy.
It’s exactly this dual nature of the Portuguese, at times exuberant and overly euphoric like the years preceding the International Expo of 1998, and then the European Football Championship of 2004, where 10 stadiums were built to little avail, so that now, half of them are empty year round, and one even being considered for demolishment.
When Portugal joined the European Union in 1986, in the same year of Spain, it’s economy was not ready; with little exporting capacity the Portuguese companies were lured to think the European markets could represent a big exporting market but Portugal did little to change its economic model and relied on low added value exports and on being Europe’s cheapest labor to attract foreign direct investment (that eventually moved East when Soviet Union collapsed); by accepting Portugal, the European Economic Community did a political concession as it had done with Greece in 1981, as a way to show a sign of hope to the newly establish, but weak democracies of the South.
Although Portugal did a serious deficit control work towards acceptance on the Eurozone in 2002, its economy was, as in 1986, not ready for the loss of a national currency, and most notably for access to almost “Germanic” level interest rates – caught with the possibility to access cheap money, in conditions as Portugal had never experienced in its recent economic history, and incentivized by the EU biggest exporters, the Portuguese government went on a shopping spree that seemed to see no end, with the latest shopping list including the construction of a high speed train project that was eventually put on a halt by the later government, already under the auspices of the troika.
Portugal might just stay in the Eurozone, and there is little doubt that it will remain strongly anchored in the European Union and NATO whatever the circumstances, because in Portugal, contrary to Greece, there is overwhelming popular support to remain in both institutions. Irrespective of that, Portugal will face years of economic hardship, although the necessary reforms, now in place are expected to release the hindered potential GDP of the country – that can only really show up when less fiscal pressure is applied, maybe by 2015.
Paradoxically, Portugal’s geographic location has given it few European options, only bordering Spain, the country has historically been forced to look elsewhere, and it was precisely when it was able to diverse its viewpoint that Portugal was able to create a World heritage. Early this year, China, that as recently as 1999 still had a piece of its territory under Portuguese rule, Macao, saw it’s company Three Gorges take a controlling position of Portuguese electrical utility. The Sultanate of Oman, that the Portuguese colonized in the 16th century, also acquired, through a joint venture with the Chinese State Grid a majority stake of the Portuguese electrical grid company – and further foreign investments are expected in privatizations programs on aerial and naval port infrastructures and in the national airline, that routes a significant part of the air traffic from Europe to Brazil.
Portugal is already showing signs that its reforms package are well under way, with debt markets now asking lower interest rates for 12 month maturity bonds than to its neighboring Spain. However, both countries are so much economic interdependent, with Spanish banks holding most of Portuguese national debt and Spain being the biggest destination of Portuguese exports that none of them can allow the other to fall – Portugal’s fate is now at the handa of Germany’s willingness to save the Eurozone as whole, probably conceding to some mechanism similar to the so-called euro bonds.
Portugal can end up taking the euro crisis as an opportunity to do the structural reforms it needs to do, if so then its geography can help payback its historic ties with the rest of the world, as Portuguese speaking countries like Brazil and Angola now claim a part of their respective regional power house status, they will naturally find opportunities in the ex-colonizer that is now selling most of its assets to manage its national sovereign debt.
Portugal might become the success story that Europe so hardly needs.
UEFA EURO e os mistérios do agenda setting
Nas últimas semanas, a agenda mediática e, em certa medida, o debate político foram dominados por uma série de "casos" que surgiram em torno da figura do ministro Miguel Relvas.
Sendo certo que nominalmente ou, pelo menos, pela ordem cronológica que nos foi sendo apresentada, a centelha que despoletou toda esta comoção foi a malfadada "queixa" da jornalista do Público, acaba por ser difícil, ainda assim, de compreender porque é que de repente, num primeiro plano, o perfil ético do ministro Relvas e num segundo, mas sobretudo porque associado ao primeiro, as "secretas", passaram a constituir a temática mais premente do debate público. Não é só um "tema quente" passageiro: envolveu debates específicos sobre o tema na televisão, explicações na AR, biliões de editoriais, artigos de opinião, entradas em blogs, comentários no Facebook, conversas de taxistas, virgens ofendidas, comadres zangadas, canções pythonescas, e por aí fora.
Como o João insistentemente, e bem, sustenta em muitos dos seus artigos aqui no Cousas, há muitas questões fundamentais que não têm sido, não estão a ser, nem parecem vir a ser tão cedo abordadas no debate público.
Uma parte da explicação para esse fenómeno estará com certeza associada aos mistérios do agenda setting. O que determina os temas debatidos no debate público? A agenda política, ou as intervenções públicas feitas no contexto de instituições políticas (num sentido lato - Governo, AR, partidos, TdC, Autoridade(s), etc.), são simplesmente veiculadas pelos media? Os media conferem pesos diferentes aos temas e introduzem outros novos, levando a agenda política num ou noutro sentido conforme lhes aprouver? Porquê? A procura das populi por determinadas temáticas é que conduz os media, que por sua vez conduzem o debate político? Ou ao contrário? Os clientes de publicidade têm influência na determinação dos temas abordados pela imprensa? Os temas veiculados pelos media são-no com os mesmos pesos relativos que são debatidos na prática política? Se não são, poderá implicar isso um efeito de feedback?
Vou resistir à tentação de atacar as teorias da conspiração do costume que, claro, também têm a sua solução holística e perfeita para este problema. Direi apenas que me parece que qualquer abordagem intelectualmente honesta dificilmente exclui qualquer pergunta deste tipo com um rotundo "Não, nada disso". A única coisa que parece certa é que a agenda é marcada por uma dinâmica altamente complexa, em que media, opinion makers, política e consumidores de informação se influenciam mutuamente.
O problema é que os equilíbrios que esta dinâmica produz parecem muitas vezes configurar situações altamente ineficientes do ponto de vista da sociedade. A questão "Relvas" é um exemplo, mas hoje deparei-me com um ainda mais espectacular.
Hoje pelas 21h30, isto é, no horário mais "prime" de que os canais noticiosos do "cabo" dispõem - a hora a seguir aos telejornais dos generalistas - os três principais canais de notícias transmitiam programas dedicados ao UEFA EURO. Sobre tudo e sobre nada - banalidades sobre jogadores das várias equipas, os mesmos comentários dos últimos dias pelos mesmos comentadores, status updates sobre a equipa técnica nacional, respostas a respostas a respostas a opiniões de figuras semi-públicas. Gosto muito de futebol e como tal, consumo regularmente jogos, análises e outras peças sobre futebol. Não acredito que ninguém que alguém que goste de futebol visse naquelas peças alguma coisa de pertinente sobre futebol. Ora, logicamente, alguém que não goste de futebol não veria nada de pertinente nas peças mesmo se fossem de facto sobre futebol. O que conduz a uma conclusão desanimadora: praticamente ninguém estava a ver aqueles canais com interesse. O que significa que os recursos gastos em directos para filmar o Ronaldo a sair da casa de banho ou para estabelecer ligação com o Carlos Queiroz algures no Médio Oriente não serviram, essencialmente, ninguém. Não questiono a capacidade e vontade dos produtores de televisão em conduzir operações rentáveis, pelo que certamente a audiência destes programas sendo bastante baixa não será nula, mas também acho que não exagero ao pensar que o custo que tendemos a associar ao tempo que despendemos a ver televisão é usualmente subestimado.
Ou seja: talvez, se nos colocássemos por detrás de uma espécie de "véu da ignorância", nos julgássemos colectivamente doidos pela esterilidade da nossa agenda de debate público. Sem tecer considerações normativas ou mesmo moralistas sobre os méritos das temáticas: se todos quiséssemos falar sobre as unhas do Ronaldo o dia todo, não haveria razão per se para não o fazermos. No entanto, não querendo, falamos, e como é impossível colocarmo-nos realmente por detrás do "véu", estamos à mercê de nós próprios, apanhados nesta estranha dinâmica.
Urge, pois, reconhecer a complexidade desta questão, bem como a sua dupla importância. É que para além de estarmos a perder tempo com questões que at the end of the day, não interessam a ninguém nem no curto prazo, devemos lembrar-nos que o agenda setting ao determinar a temática do debate público determina em grande medida aquilo que nos ocupa a mente num determinado momento.
(editado)
quarta-feira, 6 de junho de 2012
Isabel Oneto e a igualdade entre credores
PS quer que MAI explique operações PSP e Fisco - a propósito disto.
Acho bem que se façam perguntas sobre a base legal desta operação. Mas cumpre informar a senhora Vice-Presidente da Bancada do PS Isabel Oneto de algo que a deverá surpreender: o Fisco não se encontra em pé de igualdade com os demais credores.
Para começar, beneficia do privilégio creditório do Estado - ou seja, por exemplo em caso de insolvência, o Estado tem direito de ser pago em primeiro lugar, à frente dos demais credores (mesmo daqueles com garantias reais, como hipotecas), o que inclui dívidas fiscais. (Descobri recentemente que este privilégio creditório deixou de existir, também recentemente, no Reino Unido, e o Estado passou, curiosamente, a ser um credor comum!)
Em segundo lugar, beneficia da existência de um processo de execução fiscal, em que a pessoa ou paga e discute depois, ou tem de dar garantias para evitar pagar. Este processo de execução é também aproveitado para para cobrar outro tipo de dívidas, como por exemplo dívidas à Segurança Social. É um processo bastante agressivo, como se poderá ter notado, e que não está ao alcance do comum dos credores.
Finalmente, não cumprir o dever de pagar impostos é crime, o que não acontece quando não se cumpre o dever de pagar outras dívidas. O que significa que se pode acabar a pagar uma multa ou a ir para a cadeia por não pagar impostos, o que já não acontece para dívidas privadas. E aí, o Ministério Público tem competência para investigar, dirigindo uma investigação policial que pode dar origem à tal prisão - ora, o comum dos credores não pode, de facto, chamar a polícia para que um seu devedor seja preso.
A questão que se coloca é a seguinte: considera a Vice-Presidente da Bancada do PS que isto não deve ser assim? Que o Estado deve deixar de ter privilégio creditório, que não deve existir um processo de execução fiscal como existe, e que não cumprir o dever de pagar impostos não deve ser crime? Ou considera que o credor comum ou com garantia deve ter acesso ao processo de execução fiscal e que não pagar dívidas privadas também deve ser crime?
De novo - acho bem que se perceba a base legal para a actuação do Fisco e da PSP e que essa base legal seja explicada. Acho bem que se façam perguntas nesse sentido. Mas gostava de perceber o que é que a senhora deputada Isabel Oneto afinal pensa sobre a igualdade entre o Estado/Fisco e os demais credores.
terça-feira, 5 de junho de 2012
Ataques pessoais a António Borges
(A entrevista de António Borges pode ser lida aqui - basta seguir os vários «links».)
Acontece que acusar António Borges de defender uma política de baixos salários é distorcer o que ele disse. E eu, por acaso, parece-me mais útil discutir o que ele disse do que as distorções - concorde-se ou não com o que ele disse. E o que disse António Borges? Que cortar os salários era um «urgência» mas que não era uma «política». Ou seja, que na situação actual, cortar salários deve ser feito, mas não é o que deve acontecer no longo prazo - o que é precisamente o oposto de defender uma política de baixos salários.
Mas mais. Acontece que toda a gente que defende que devemos sair da crise com inflação também está a defender cortes no valor real dos salários (e de muito mais, incluindo da poupança, já agora) como forma de sair da crise. Mas, como é evidente, ninguém que defenda a inflação como política é confrontado com estes pequenos pormenores.
António Borges diz ainda outra coisa: que o que está em causa são dois modelos diferentes de crescimento, e não uma política de crescimento e uma política de não-crescimento. (Ver também artigos de José Manuel Fernandes sobre este tema aqui e aqui.) Diz ainda que a austeridade é necessária para que se possa crescer (de forma sustentada) no futuro - e até Paul Krugman, por muito que isso custe a certa Esquerda, disse que em Portugal não havia alternativa a haver austeridade (embora Krugman já não devesse concordar com o modelo de crescimento proposto por António Borges, imagino).
Nada disto interessa. O que interessa é retirar a citação sobre cortes nos salários do contexto, acusar António Borges de querer uma política de baixos salários, citar abundantemente o jornalista do Le Monde, e falar das ligações de António Borges à Goldman Sachs. Em vez de se discutir ideias e políticas, fazem-se ataques pessoais e tenta passar-se o nome de António Borges pela lama.
É o grau zero da política. A política das insinuações, das motivações ocultas e do insulto fácil. A política da suposta superioridade moral de quem não sente qualquer problema ético em retirar afirmações do contexto ou em inventar motivações torpes em vez de apresentar argumentos para rebater o que António Borges disse defender.
E portanto, em vez de termos um debate sobre produtividade e sobre a reestruturação da economia (com algumas excepções), tivemos distorções e julgamentos morais. É pouco, muito pouco mesmo. Mas parece que é o que temos.
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Eu Construo Novos Paradigmas
As galinhas põem ovos, os cães ladram, eu construo novos paradigmas.
Ao pequeno-almoço, é logo dois de uma vez. Para começar bem a manhã. Depois, aproveito ainda sou capaz de construir um terceiro antes de almoço, só para ajudar a passar o tempo.
Ao almoço, desconstruo a realidade e analiso criticamente as relações humanos. Dedico-me à hermenêutica universal, de forma a poder cimentar as minhas posições apenas nos símbolos com melhor pedigree.
Tendo interpretado o universo, sinto-me cosmicamente impelido a libertar a Humanidade, anunciando-lhe um novo paradigma. Porque sou um fixe e não sou imperialista - tentem oferecer-me uma imperial e vão ver como eu a recuso.
As galinhas ladram, os cães põem ovos, eu construo novos paradigmas.
A meio da tarde, já devo ir em cinco ou seis, talvez cinco e meio. Convém não abusar, que depois não dá para construir novos paradigmas por causa do cansaço. Transcender o cientismo e tocar na metafísica espiritual da simbologia cósmica cansa - e abre o apetite.
Portanto, lá vou eu lanchar. Ao lanche, bebo a luz das estrelas e como pedacinhos do Sol. Não me deixo levar pelos rabanetes que me oferecem porque sei que é apenas uma manifestação do antigo paradigma. Do paradigma que existia antes dos sete paradigmas que eu já criei desde que me levantei.
As galinhas constroem novos paradigmas, os cães constroem novos paradigmas e eu, se calhar, ladro e ponho ovos. Ainda não decidi bem. Ainda não interpretei devidamente o Cosmos que me rodeia para descobrir qual a forma mais metafísica para comparar o pi a um chouriço.
Porque, como é evidente, o pi é uma lula, não um chouriço, mas também ao mesmo tempo uma salada. E na libertação do pi encontra-se a fusão dos princípios naturais que nos levará ao próximo paradigma.
De onde se retira o paradigma do meu almoço de amanhã: lulas com salada (se houver). Porque o Cosmos assim mo ditou - e quem sou eu para discutir com a melhor interpretação simbólica da Física Quântica?
(Nota: Este texto apenas deve ser levado a sério às Quartas-Feiras de cada mês. No resto da semana, nem por isso.)
segunda-feira, 4 de junho de 2012
O problema subjacente - austeridade (1 de 2) - Resposta a comentário
Caros todos,
O último
post que fiz ("O problema subjacente - austeridade (1 de 2)") foi alvo de um interessante comentário de João Cardiga, que também escreve neste blog, a que achei que devia
responder.
Ao
escrever a resposta, reparei que o Blogger não aceitava respostas acima de um
determinado número de caracteres.
Como
penso que a discussão é interessante (e pelos motivos de falta de espaço acima
referidos) decidi fazer um post autónomo com a resposta.
Peço
desculpa por qualquer incómodo.
DHS
Respondo-lhe da seguinte maneira (a itálico execertos do comentário de João Cardiga ao meu post):
Um
dos erros mais comuns nestas discussões tem sido o tentar dar uma
"voz" ao mercado. Ora um mercado não tem voz e saber o que o mercado
"diz" é um processo de adivinhação própria para pessoas como a Maya.
O mercado não é um ser, não tem vontade. É constituido por milhares (ou
milhões) de pessoas cada uma com a sua voz e com as suas intenções. A subida da
taxa de juro só tem um motivo: escassez de capitais. Já essa escassez pode ter
vários motivos (por exemplo a diminuição do capital motivado pela crise, maior
percepção de risco, perda de confiança, etc...) mas esses são tão diversos como
as pessoas/instituições que constituem o mercados
A vontade do
mercado, neste caso, tem voz e chama-se taxa de juro. É esse o valor a que o conjunto dos
agentes de mercado (sim, são milhares) considera como adequado para nos
financiar.
Achar que as
taxas de juro que nos cobram dependem apenas da mente irracional dos mercado (e
que só poderiam ser previstos pela Maya) não só está errado, como é perigoso.
Significa, no
fundo, que não há relação causa efeito entre o comportamento das economias (e por
exemplo o nosso défice) e a acessibilidade a financiamento externo.
Será que é por
acaso que os quatro países que foram intervencionados têm todos os maiores
défices da zona Euro em 2010 (último ano antes do Portugal ter assinado o
acordo com a troika)? Vide, sobre este tema o seguinte link.
A razão é
simples: Os milhares de investidores em que consistem os mercado não emprestam
dinheiro a Portugal, pois duvidam que lhes consigamos pagar. Como compensação
pelo risco, aumentam a taxa de juro.Se, como diz, existisse falta de dinheiro para comprar dívida pública todas as dívidas públicas subiriam (maior procura dos países para se financiarem do que oferta dos investidores, aumentaria a taxa de juro).
O que não acontece. Muito pelo contrário: A Alemanha já não paga a quem lhe queira emprestar dinheiro (a 2 anos)! Os investidores compram dívida pública Alemã apenas para terem o seu dinheiro seguro. Sobre este tema vide link aqui.
Não falta, por isso, dinheiro para investir em dívida pública portuguesa (até porque são montantes irrisórios a nível mundial). O que existe, isso sim, é medo de que nós não honremos as nossas dívidas.
O credor não decide como
vamos gastar o dinheiro que nos empresta. Ele decide qual o dinheiro que tem
disponível para nos emprestar consoante os nossos projectos. No caso da divida
publica é surreal que ele decida isso. Estamos falar de instituições
democráticas e organização da sociedade. Quem decide isso são os seus cidadãos
e não os credores. Daí estarmos a falar de uma democracia e não de uma
credocracia. E num mercado funcional também é surreal, pois temos milhares de
credores
Se acha surreal
que o credor decida como devemos gastar o dinheiro, digo-lhe o seguinte. A troika
achou que se nos emprestasse o dinheiro sem contrapartidas estaríamos em 2013
outra vez de mão estendida a pedir mais dinheiro. Sou da mesma opinião.Não costumo emprestar dinheiro a quem me parece que não vai pagar? Os Alemães e os Europeus também não.
Além de que é exactamente porque os países que nos emprestam dinheiro serem democracias que torna a situação mais complexa. É que nas democracias (e muito bem!) tem de se de prestar contas ao eleitorado.
Não me parece
que os eleitores da Alemanha, França etc.. gostem de nos emprestar dinheiro. Duvido
que a maioria dos portugueses gostavasse que o nosso governo emprestasse
dinheiro a países em dificuldades, como a Grécia, sobretudo quando eles têm
mais regalias sociais do que os próprios portugueses.
A
partir do momento em que pedimos ajuda e subscrevemos o programa da troika
perdemos, de facto, grande parte da nossa independência, penso que isso é claro.Não havia, no entanto, qualquer outra via a não ser a do incumprimento e consequente saída do Euro e falência do país.
Podemos, no
entanto, optar por não cumprir o programa. A Grécia prepara-se para o fazer.
Aliás, o caso
mais próximo talvez seja o da Argentina. Vide aqui a breve cronologia da
Wikipedia sobre o assunto Este cenário deve, na minha opinião, ser evitado, custe o que custar, sob pena de cairmos num estado económico e social de absoluto caos, semelhante ao que aconteceu na Argentina e se prepara para acontecer na Grécia, e onde seriam muitíssimo agravadas as dificuldade por que passam os portugueses...
Parece-me
é que falar, sem mais, de aumento de
competitividade é que é uma "personificação
sem sentido". Diga-se, aliás, que não vi ninguém em Portugal ou no
estrangeiro referir, em concreto, que medidas serão essas, quem as paga e a quem
aproveitam.
Por outro lado, se acha que o mercado não
aloca a distribuição de riqueza então deduzo que quando vai ao supermercado se
esforce por comprar os piores produtos. É que os melhores produtos, os que toda
a gente procura comprar (porque são os com melhor relação qualidade/preço, por
exemplo), criam riqueza para esta ou aquela empresa que os desenvolveu e para
quem lá trabalha.
Se não se achar
que o mérito existe e que o mercado o recompensa então porque é que vale a
pena, por exemplo, uma pessoa ser bom aluno ou ser bom na sua profissão?
Respondo-lhe com
este link
Não me parece que algumas dessas pessoas, que não vieram todas, com certeza, de famílias abastadas, concordem com a sua afirmação, sendo que muitas ou todas estudaram, em alguma altura da sua vida em Portugal.
Por outro lado,
quer no estrangeiro, quer em Portugal existem bolsas de estudo para bons alunos.
Sobre nascer em
famílias “certas” concordo, mas e não é assim em qualquer país do mundo?
Bem eu diria que num estado fraco é que existe corrupção e que as
pessoas não são livres. Confunde-se muitas vezes "estado poderoso"
com "estado grande". Eu quero um estado com poderes, e que seja
poderoso nesses poderes. É vital para a liberdade do individuo. E não é preciso
ir muito longe: imagine o que seria um estado sem poderes efectivos judiciais.
Concordo com o que diz, não me
expliquei, de facto, bem.
Eu quero um
estado que não intervenha em todos os passos da minha vida. Que não me cobre
impostos sobre tudo o que faça (impostos que se multiplicam: IVA, IRS, IRC, IMT,
selo, ISP, IA, mais milhentas taxas municipais, etc…) e que não regulamente
todos os aspectos da vida
Sobretudo no
caso das empresas chegou-se a um ponto absurdo (muito também por culpa de
imensa legislação europeia).
É hoje
impossível a uma empresa cumprir todos os requisitos a que a lei obriga. Uns
porque nem sabe que existem, outros porque são demasiado onerosos.
Por outro lado,
quanto mais regulação mais arbitrariedade existe na aplicação dessa regulação. Por
exemplo, quem decide quem é multado e quem não é?
Em suma,
o estado que defendo é um estado minimalista e sustentável, com muito menos
regulação, que que assegure a segurança, justiça, saúde e educação
para todos e pouco mais, excepto em situações excepcionais, cobrando impostos que nos tornem competitivos a nível europeu.
A culpa não serve para
nada (e tem o hábito de morrer solteira). Importante é apurar os responsáveis,
e é isso que tem estado ausente deste debate e desta crise. Por outro lado, não
estamos numa situação de deixar ver de quem é a responsabilidade
É
importante apurar quem foi responsável pela situação do país. E espero que o
Ministério Público esteja a tratar disso.
No
entanto discordo que estejamos numa posição em que não vejamos de quem é a
responsabilidade: Foi da responsabilidade de Sócrates (e seu governo) e de
Alberto João Jardim (em escala menor). Foi o próprio Sócrates que o disse aqui.
Socrates
acha que foi dinheiro bem gasto, mas a mim parece-me que não (entre o BPN: Parque
Escolar, PPP´s e outros de que vamos tomando conhecimento todos os dias).
Não vejo como sejam investimentos que produzam riqueza para o país, mas tal
juízo deve ser feitos nos tribunais.
É que
atirar dinheiro descoordenadamente para a economia num momento de crise não
acaba com a crise, mas acaba com o dinheiro…
Não é
que outros governos não tenham aumentado continuamente a dívida pública. Todos
aumentaram, mas parece-me que nenhum a aumentou tanto,
em tão pouco tempo, e com tão pouca reprecussão na economia como Sócrates.
Considero,
no entanto que mais importante, é sair da situação em que estamos e recuperar a
nossa independência, tendo aprendido a lição de que se gastarmos mais do que
temos estaremos seguramente na mesma situação daqui a 5-10 anos.
e)
"Parece-me, com alguma segurança, poder adiantar o seguinte: Não há
[alternativa à austeridade]."
Bem isto é uma brutal
limitação da liberdade do individuo e da imaginação humana. Parto do
pressuposto que "austeridade" está a ser utilizado como o conjunto de
medidas que estão a ser aplicadas. E como é obvio existem diversas alternativas
à mesma. O importante não é excluir soluções da mesa mas sim verificar os
pontos fortes e fracos de cada uma delas.
Referia-me
apenas ao facto de que não há alternativa ao programa da troika. Ressalvados os
objectivos do programa cabe ao governo e oposição negociarem como bem entenderem, e
legislar da forma que lhes aprouver.
Aliás
nem podia ser de outro modo. O plano da troika não tem força de lei, nem
acautela com minúcia uma série de pontos que cabe ao legislador interno
densificar.
f)
"Queríamos ter o que os países desenvolvidos têm (saúde, educação,
justiça, segurança) mas com uma economia frágil, dependente do estado, assente
em excessivos direitos sociais e totalmente distanciada do mundo competitivo
que existe além fronteiras."
mmmm parece-me que esses
"excessivos direitos sociais" são a base do mundo desenvolvido, no
qual, diga-se de passagem, Portugal pertence dado os nossos indicadores.
Se é verdade
que são os direitos sociais que são a base do mundo desenvolvido, também é
verdade que são as economias sólidas as únicas onde é possível existirem os
direitos sociais a que estamos habituados.
Ora,
nós não somos uma economia sólida.
De facto,
nós “ainda” somos um país desenvolvido. Segundo o índice de IDH publicado pela
ONU em 2011 (vide link aqui
), Portugal consta em 41
lugar. Fomos ultrapassados pela Hungria, Polónia e Lituânia. Logo atrás de nós constam o Bharein, a
Letónia e o Chile.
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